PROCESSUAL CIVIL. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. FRAUDE. RESPONSABILIDADE DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. ÔNUS SUBSIDIÁRIO DO INSS. DANO MATERIAL COMPROVADO. DANO MORAL PRESUMIDO
Ementa:
PROCESSUAL CIVIL. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. FRAUDE. RESPONSABILIDADE DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. ÔNUS SUBSIDIÁRIO DO INSS. DANO MATERIAL COMPROVADO. DANO MORAL PRESUMIDO.
- Por força do art. 6º, § 2º, da Lei nº 10.820/2003, o INSS não tem responsabilidade civil pelos danos patrimoniais ou extrapatrimoniais decorrentes de “empréstimo consignado”, concedido mediante fraude, se a instituição financeira credora é a mesma responsável pelo pagamento do benefício previdenciário, mas a autarquia é parte legítima para responder (subsidiariamente) por lesões se o empréstimo tiver sido concedido, mediante fraude, por instituição financeira distinta daquela responsável pelo pagamento ordinário da benesse. Tema 183/TNU e precedentes do E. STJ.
- A questão afeta à contratação de empréstimo consignado de forma fraudulenta restou equacionada de maneira administrativa pelo banco, destacando-se que a avença foi suspensa poucos dias após sua contratação, encontrando-se, desta forma, “excluída” do sistema, não tendo havido qualquer débito de prestação a ser objeto de ressarcimento nesta senda. Assim, mostra-se escorreita a não condenação da instituição financeira ao pagamento de indenização a título de danos materiais.
- No que se refere ao pleito de condenação do ente previdenciário ao pagamento de indenização pelos danos materiais sofridos, nota-se que a parte-autora não percebeu sua aposentadoria por tempo de serviço nas competências compreendidas entre dezembro/2017 e outubro/2018, em decorrência, a princípio, do fraudulento empréstimo consignado tomado por terceira pessoa, cabendo considerar que o ente previdenciário não se desincumbiu do ônus de provar o efetivo adimplemento de tais parcelas (na forma do art. 373, II, do Código de Processo Civil), sendo, assim, de rigor a manutenção da r. sentença no ponto em que o condenou ao pagamento da respectiva indenização.
- A parte-autora, em razão de falha imputável reciproca e concomitantemente aos corréus, viu-se privada de verba de natureza alimentar por longos meses (sem prejuízo de toda a dificuldade enfrentada na tentativa de solucionar a questão de maneira administrativa), culminando na necessidade de acionamento do Poder Judiciário para ver-se ressarcida no tocante aos valores não pagos de prestação previdenciária. Tais aspectos, devidamente concatenados, têm o condão de configurar dano moral presumido.
- Especificamente no tocante ao valor da indenização financeira por dano moral, a importância deve traduzir montante que sirva para a reparação da lesão (considerada a intensidade para o ofendido e a eventual caracterização de dolo ou do grau de culpa do responsável) e também ônus ao responsável para submetê-lo aos deveres fundamentais do Estado de Direito, incluindo o desestímulo de condutas lesivas ao consumidor, devendo ser objeto de ponderação para não ensejar enriquecimento sem causa do lesado ao mesmo tempo em que também não pode ser insignificante ou excessiva para o infrator. Esse dúplice escopo deve ser aferido por comedida avaliação judicial à luz do caso concreto, dialogando ainda com diversas outras matérias que reclamam indenização por dano moral, denotando coerência interdisciplinar na apreciação do magistrado. Importe fixado em 1º grau de jurisdição reduzido para R$ 10.000,00 tendo como base situações semelhantes enfrentadas pelo órgão julgador.
- Apelo da autarquia previdenciária desprovido. Apelo da instituição financeira parcialmente provido.
(TRF 3ª Região, 2ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5005205-23.2020.4.03.6104, Rel. JOSE CARLOS FRANCISCO, julgado em 05/10/2023, DJEN DATA: 09/10/2023)
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PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5005205-23.2020.4.03.6104
RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, BANCO BRADESCO SA
Advogado do(a) APELANTE: GLAUCIO HENRIQUE TADEU CAPELLO - SP206793-A
APELADO: MARGARETH LOPES BARTOLOTTO MARQUES VELLOSO
Advogado do(a) APELADO: JOSE RICARDO BRITO DO NASCIMENTO - SP205450-A
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região2ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5005205-23.2020.4.03.6104
RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, BANCO BRADESCO SA
Advogado do(a) APELANTE: GLAUCIO HENRIQUE TADEU CAPELLO - SP206793-A
APELADO: MARGARETH LOPES BARTOLOTTO MARQUES VELLOSO
Advogado do(a) APELADO: JOSE RICARDO BRITO DO NASCIMENTO - SP205450-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O Exmo. Sr. Desembargador Federal Carlos Francisco (Relator): Trata-se de recursos de apelação interpostos tanto pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS (ID 270111232) como pelo BANCO BRADESCO S. A. (ID 270111233) em face da r. sentença (IDs 270111230 e 270111231) que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados neste feito, extinguindo a relação processual com resolução de mérito (nos termos do art. 487, I, do Código de Processo Civil), de molde a condenar a autarquia previdenciária ao pagamento de indenização por danos materiais (correspondente ao interregno em que deixou de depositar o benefício previdenciário titularizado pela parte-autora, no montante de R$ 23.391,48), devendo incidir correção monetária desde o evento danoso e juros desde a citação. Sem prejuízo, houve a condenação, tanto do ente público como da instituição financeira, ao pagamento de indenização por danos morais, no importe de R$ 15.000,00, a ser suportado em partes iguais pelos corréus, incidindo correção monetária a partir da r. sentença (Súm. 362/STJ) e juros a partir da data da suspensão do benefício previdenciário (qual seja, 01/12/2017). Estabeleceu, outrossim, que os valores arbitrados deverão ser corrigidos pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal (aprovado pela Resolução CJF nº 267/13 ou outra que vier a substituí-la). Ao cabo, no que tange à verba honorária, condenou os corréus ao adimplemento de honorários advocatícios sucumbenciais, no montante de 10% do valor da condenação, o que deve ser suportado, em partes iguais (50% em desfavor de cada um), quanto ao montante apurado sobre o valor do dano moral e suportados em 100% em desfavor do ente previdenciário quanto ao montante apurado em relação ao dano material, nos termos do art. 85, § 3º, I, c/c art. 86, parágrafo único, ambos do Código de Processo Civil; por sua vez, tendo a parte-autora sucumbido apenas em relação ao valor devido a título de danos materiais postulado em face do banco, o r. provimento judicial monocrático a condenou ao pagamento de honorários advocatícios de 10% sobre a pretensão de danos materiais (R$ 23.391,48).
Em síntese, a parte-apelante INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS sustenta preliminar de ilegitimidade passiva (pugnando pela consequente remessa do feito à Justiça Estadual) e, como prejudicial de mérito, prescrição (a abarcar as parcelas eventualmente devidas e vencidas antes do quinquênio que antecedeu o ajuizamento desta demanda). No mérito, afirma não caber ao ente público a apresentação de documentos firmados entre o agente financeiro e o segurado com o objetivo de demonstrar a não celebração do empréstimo consignado, postulando, ainda, pelo afastamento da condenação a título de danos morais.
Por sua vez, a instituição financeira argumenta no sentido da ausência de falha na prestação de seu serviço, destacando, para tanto, que apenas o ente autárquico restou condenado ao pagamento de danos materiais – dentro de tal contexto, requer o afastamento de sua condenação ao pagamento de indenização a título de danos morais. Subsidiariamente, pugna pela redução do quantum fixado pelo magistrado monocrático a título de dano moral.
Com contrarrazões (ID 270111237), subiram os autos a este E. Tribunal.
É o breve relatório.
PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região2ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5005205-23.2020.4.03.6104
RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, BANCO BRADESCO SA
Advogado do(a) APELANTE: GLAUCIO HENRIQUE TADEU CAPELLO - SP206793-A
APELADO: MARGARETH LOPES BARTOLOTTO MARQUES VELLOSO
Advogado do(a) APELADO: JOSE RICARDO BRITO DO NASCIMENTO - SP205450-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O Exmo. Sr. Desembargador Federal Carlos Francisco (Relator): Primeiramente, anoto que a Lei nº 10.820/2003 (com as alterações introduzidas pelas Leis nºs 10.953/2004, 13.172/2015 e 14.431/2022) dispõe as seguintes providências para o empréstimo consignado:
“Art. 6º. Os titulares de benefícios de aposentadoria e pensão do Regime Geral de Previdência Social e do benefício de prestação continuada de que trata o art. 20 da Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993, poderão autorizar que o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) proceda aos descontos referidos no art. 1º desta Lei e, de forma irrevogável e irretratável, que a instituição financeira na qual recebam os seus benefícios retenha, para fins de amortização, valores referentes ao pagamento mensal de empréstimos, financiamentos, cartões de crédito e operações de arrendamento mercantil por ela concedidos, quando previstos em contrato, na forma estabelecida em regulamento, observadas as normas editadas pelo INSS e ouvido o Conselho Nacional de Previdência Social.
§ 1º. Para os fins do ‘caput’, fica o INSS autorizado a dispor, em ato próprio, sobre:
I – as formalidades para habilitação das instituições e sociedades referidas no art. 1º;
II – os benefícios elegíveis, em função de sua natureza e forma de pagamento;
III – as rotinas a serem observadas para a prestação aos titulares de benefícios em manutenção e às instituições consignatárias das informações necessárias à consecução do disposto nesta Lei;
IV – os prazos para o início dos descontos autorizados e para o repasse das prestações às instituições consignatárias;
V – o valor dos encargos a serem cobrados para ressarcimento dos custos operacionais a ele acarretados pelas operações;
e VI – as demais normas que se fizerem necessárias.
§ 2º. Em qualquer circunstância, a responsabilidade do INSS em relação às operações referidas no caput deste artigo restringe-se à:
I – retenção dos valores autorizados pelo beneficiário e repasse à instituição consignatária nas operações de desconto, não cabendo à autarquia responsabilidade solidária pelos débitos contratados pelo segurado;
e II – manutenção dos pagamentos do titular do benefício na mesma instituição financeira enquanto houver saldo devedor nas operações em que for autorizada a retenção, não cabendo à autarquia responsabilidade solidária pelos débitos contratados pelo segurado.
(...)”.
Quanto à legitimação passiva e à responsabilização do INSS, por força do art. 6º, § 2º, da Lei nº 10.820/2003, a Turma Nacional de Uniformização, do Conselho da Justiça Federal, no Pedido de Uniformização de Interpretação de Lei nº 0500796-67.2017.405.8307/PE, Tema 183 (j. em 12/09/2018), concluiu:
“I – O INSS não tem responsabilidade civil pelos danos patrimoniais ou extrapatrimoniais decorrentes de ‘empréstimo consignado’, concedido mediante fraude, se a instituição financeira credora é a mesma responsável pelo pagamento do benefício previdenciário, nos termos do art. 6º, da Lei n. 10.820/03; II – O INSS pode ser civilmente responsabilizado por danos patrimoniais ou extrapatrimoniais, se demonstrada negligência, por omissão injustificada no desempenho do dever de fiscalização, se os ‘empréstimos consignados’ forem concedidos, de forma fraudulenta, por instituições financeiras distintas daquelas responsáveis pelo pagamento dos benefícios previdenciários. A responsabilidade do INSS, nessa hipótese, é subsidiária em relação à responsabilidade civil da instituição financeira.”.
A tese firmada no Tema 183/TNU segue a orientação dada pelo E. STJ no julgamento do AgRg no REsp 1445011/RS – a propósito:
“ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO NÃO AUTORIZADO. INDENIZAÇÃO. LEGITIMIDADE E RESPONSABILIDADE DO INSS. REEXAME DE PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. 1. O Superior Tribunal de Justiça entende que, nos termos do art. 6º da Lei 10.820/2003, nas hipóteses em que o empréstimo não tenha sido realizado no mesmo banco em que o aposentado recebe o benefício, cabe ao INSS reter os valores autorizados por ele e repassar à instituição financeira credora. Dessa forma, é de sua responsabilidade verificar se houve a efetiva autorização. Reconhecida, assim, a legitimidade da autarquia para responder os termos da demanda. 2. Consignado pela Corte local que foi autorizado o desconto indevido de valores sobre a aposentadoria do segurado, sem a sua necessária autorização, o que resultou em dano para o autor, fica caracterizada a responsabilidade civil, no caso. A revisão desse entendimento demanda reexame do contexto fático-probatório, o que é inviável no Superior Tribunal de Justiça, ante o óbice da Súmula 7/STJ: ‘A pretensão de simples reexame de prova não enseja Recurso Especial’. 3. Precedentes: AgRg no REsp 1335598/SC, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe 24.9.2015; AgRg no REsp 1272441/AL, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, DJe 02.6.2015; AgRg no AgRg no REsp 1370441/RS, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 13/05/2015; AREsp 484.968/SE, Rel. Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, DJe 20.5.2014; AgRg no REsp 1.369.669/PR, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe 12.9.2013; REsp 1.213.288/SC, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, DJe 1º.7.2013; AgRg no REsp 1.363.502/RS, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 2.5.2013. 4. Agravo Regimental não provido” (STJ, AgRg no REsp nº 1.445.011/RS, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 10/11/2016, DJe de 30/11/2016) – destaque em negrito nosso.
De fato, como o INSS opera o desconto nos valores do benefício dos segurados, sua conduta constitui elemento indispensável (nexo de causalidade) para a ocorrência do dano, de modo que, ao assumir tal papel, deve a autarquia adotar as providências necessárias para constatar se, de fato e de direito, o segurado autorizou a ocorrência de descontos em seu benefício em razão de contrato firmado junto à instituição financeira distinta daquela na qual é feito o crédito ordinário da benesse. Contudo, a responsabilidade principal é da instituição financeira que faz as tratativas fraudulentas, de modo que o INSS responde subsidiariamente pelos danos. Desta feita, de rigor afastar a preliminar de ilegitimidade passiva aventada pelo ente público.
Adentrando à prejudicial de mérito da prescrição aventada pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS, pertinente destacar que a parte-autora, por meio do ajuizamento desta demanda nos idos de 21/08/2019 (ID 270111135), postulou a condenação dos corréus ao pagamento de indenização, tanto a título de danos materiais como a título de danos morais, por fatos que albergariam as competências de pagamento de benefício previdenciário referente aos meses de dezembro/2017 a outubro/2018 (vide, a propósito, o peticionamento encartado ao documento ID 270111201). Desta feita, não se nota a fluência do prazo prescricional quinquenal aventado pela autarquia, de molde a ser imperativo o afastamento da alegação de ocorrência de prescrição.
Indo adiante, sobre a lesão patrimonial e extrapatrimonial, faz-se necessário situar o problema posto nos autos no contexto da responsabilidade civil por danos, para o que é relevante lembrar que os bens e os direitos de pessoas físicas ou jurídicas (Súmula 227 do E. STJ), assim como de universalidades e de entes despersonalizados, abrangem itens de diversas naturezas e conteúdos, os quais, em linhas gerais, podem ser divididos em materiais e em morais. Nos termos do art. 5º, X, da Constituição Federal, a proteção a esses bens e direitos tem atributos de garantia fundamental, de tal modo que o titular da prerrogativa indevidamente violada tem a faculdade de exigir o dever fundamental de reparação apropriada em face do responsável, sendo certa a possibilidade de cumulação da reparação da lesão material com o dano moral.
O objeto do dano material correspondente à lesão sofrida em bens tangíveis, intangíveis, móveis, imóveis, fungíveis e infungíveis, de modo que o ressarcimento é mensurado, em moeda, pela extensão do prejuízo (normalmente aferido pelo preço de mercado dos bens e dos direitos afetados), com o objetivo de recompor a perda sofrida. Já o objeto do dano moral (ou extrapatrimonial) diz respeito à lesão no âmbito da integridade psíquica, da intimidade, da privacidade, da imagem ou da personalidade (p. ex., dor, honra, tranquilidade, afetividade, solidariedade, prestígio, boa reputação e crenças religiosas), causada por um ato ou um fato ou por seus desdobramentos, de modo que sua extensão é a proporção do injusto sofrimento, aborrecimento ou constrangimento; embora a lesão moral possa ser reparada por diversos meios (p. ex., nos moldes do art. 5º, V, da Constituição), a indenização financeira tem sido utilizada com o objetivo dúplice de repor o dano sofrido e de submeter (ordinária e sistematicamente) o responsável aos deveres fundamentais do Estado de Direito.
Ao mesmo tempo em que os sujeitos de direito são dotados de liberdade de escolha, todos devem responder por seus atos ou omissões quando violarem limites determinados pelo ordenamento jurídico, gerando responsabilidades de diversas espécies (dentre elas as criminais). Para o que importa a este feito, a atribuição de responsabilidade civil pode ser imputada a todo aquele que causar lesão, por fato ou ato praticado (in committendo), por omissão (in ommittendo), por pessoa que o represente (in vigilando), por empregado, funcionário ou mandatário (in eligendo) e por coisa inanimada ou por animal (in custodiendo).
É pela correta delimitação jurídica da responsabilidade civil que se torna possível estabelecer os parâmetros para avaliação do caso sub judice, motivo pelo qual é necessário também consignar que, quanto ao fato gerador, há a responsabilidade contratual (relacionada a negócio jurídico não cumprido, no todo ou em parte, nos termos do art. 389 e seguintes do Código Civil) e responsabilidade extracontratual ou aquiliana (casos de violação à lei e a primados de Direito, independentemente de negócio jurídico, conforme art. 186 e seguintes, também do Código Civil); acerca do fundamento, há a responsabilidade subjetiva (baseada em culpa) e a responsabilidade objetiva (baseada no risco, não exigindo culpa); e, considerando o agente, há a responsabilidade direta ou simples (se oriunda de ato da própria pessoa imputada) e a responsabilidade indireta ou complexa (resultante de ato ou de fato de terceiro, animal ou coisa inanimada vinculada ao imputado).
Friso que a culpa ou o dolo podem aparecer como causa da lesão, mas não são imprescindíveis para atribuição de responsabilidade civil (embora tenham utilidade no caso de fixação de reparação). Nessa linha, não se deve confundir a teoria objetiva da culpa (formulada em contraposição à teoria da culpa subjetiva) com a teoria da responsabilidade objetiva (ou teoria do risco ou da culpa presumida). Para a teoria da culpa objetiva, a culpa é apreciada in abstracto, nos moldes das pessoas comuns, sem considerar as condições subjetivas do agente ou seu estado de consciência (vale dizer, afastando elementos pessoais ou íntimos do agente causador do ato danoso), o que, por consequência, permite responsabilizar incapazes e dementes; já a teoria da culpa subjetiva se serve de abstrações, porém, em menor grau, pois verifica a intenção íntima e pessoal do agente para conferir responsabilidade civil e o dever de reparar o injusto dano causado a outrem, vale dizer, culpa in concreto.
Por sua vez, a teoria da responsabilidade objetiva (ou teoria do risco ou culpa presumida) vê o dever de reparar independentemente de dolo ou de culpa do causador da lesão (excluída apenas se o prejuízo for exclusivamente gerado por ato ou por omissão do lesado), opondo-se à responsabilidade subjetiva (baseada no elemento subjetivo de culpabilidade do causador do dano, observando também o nexo causal entre a conduta do agente e o dano a ser ressarcido). A responsabilidade objetiva gera o dever de indenizar por parte daquele que interagiu (direta ou indiretamente) com o lesado, ou com o meio no qual está inserido, e se baseia na injustiça do dano por circunstância que não pode ser imputada ao titular do bem ou do direito prejudicado; por não depender de dolo ou de culpa, a responsabilidade civil decorre do risco gerado por determinada atividade, bastando o ato ou o fato, o dano e a relação de causalidade ente ambos.
Pois bem. Conforme é possível ser inferido dos documentos IDs 270111133 e 270111201, a parte-autora intentou a presente ação buscando a condenação do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS e do BANCO BRADESCO S. A. em razão de supostos danos material (no importe de R$ 23.391,48) e moral (na casa de, pelo menos, 30 salários mínimos, o que, na época do ajuizamento da demanda, remontava a R$ 29.940,00) suportados, oportunidade em que apresentou o seguinte panorama fático:
“(...) 3. A Autora, na qualidade de segurada da Autarquia Ré, através de aposentadoria por tempo de serviço, inscrita no NB nº 1413650608 e NIT nº 1.060.983.883-8, recebe o referido benefício previdenciário por meio de depósito bancário, em conta corrente de nº 56.168-3, junto à agência nº 0245 – Ponta da Praia, do Banco Itaú S/A. 4. Ocorre que, em setembro de 2018, a Autora compareceu à agência bancária supramencionada, a fim de fazer ‘prova de vida’, sendo na ocasião informada que, estava impedida de proceder a tal medida, pois, a Autarquia Ré teria cancelado os pagamentos devidos, repita-se, aposentadoria por tempo de serviço. 5. De imediato, a Autora encaminhou-se ao Posto do INSS, onde foi informada, pela funcionária do atendimento, Sra. Cristina, que houve uma fraude no sistema de pagamento de benefícios, sendo então, orientada a retornar à citada agência, no prazo de 20 (vinte) dias, para obter uma resposta definitiva, em especial, quanto ao pedido de reativação dos vencimentos. 6. Decorrido tal prazo, de 20 (vinte) dias, a Autora entrou em contato com o 1ª Réu, INSS, via ‘ligação telefônica 135’, e depois de muita insistência, foi informada que seria procedido o desbloqueio de seu benefício, e ainda que voltaria a receber o pagamento dos respectivos proventos no mês de novembro/2018. 7. Na mesma oportunidade, descobriu-se que, a mencionada fraude tratava-se de 01 (um) empréstimo, no nome da Autora, efetuado através da utilização de seus dados pessoais, na qualidade de beneficiária, e tendo como ‘ponte’, uma agência do 2º Réu, BANCO BRADESCO S/A, na Cidade de Campinas/SP. 8. A partir deste momento, os fatos tomaram um rumo imprevisto para a Autora, sublinhe-se pessoa idosa, honesta e cumpridora de suas obrigações, que nunca cometeu qualquer desvio de conduta. 9. Note-se que, a Autora, embora ciente quanto ao ocorrido, viu-se obrigada a comparecer por mais de 05 (cinco) vezes ao Posto do INSS, sendo que, em todas estas ocasiões, aguardava de 02 (duas) a 03 (três) horas para ser atendida, assim como, efetuou inúmeras e longas ligações à Autarquia Ré, no entanto, sem obter qualquer resposta satisfatória, no que tange aos valores não creditados em sua conta bancária. 10. Neste sentido, é evidente que a Autora FOI FINANCEIRAMENTE LESADA, bem como TEVE ATINGIDA A SUA HONRA, vez que, como cidadã trabalhadora e cumpridora de suas obrigações, viu-se privada de seu benefício previdenciário, por culpa do 2º Réu, que anuiu o contrato fraudulento, bem como a Autarquia Ré que bloqueou sua aposentadoria por 10 (dez) meses. E o mais gravoso: ciente dos fatos, o INSS e o Bradesco quedaram-se inertes em diligenciar para dar uma solução eficaz à aposentada. 11. Tais fatos causaram terríveis desconfortos tanto físicos, como mentais e emocionais à Autora. Nos dias subsequentes, mal conseguiu realizar suas tarefas normais, que exigem atenção, sossego e concentração de raciocínio. 12. A Autora viu-se ultrajada pela forma com que foi tratada pelos Réus, por meio de seus funcionários que não deram a atenção devida ao caso, assim como, pelo fato de ser privada dos valores dos quais faz jus por 10 (dez) meses. 13. Porém, certo é que os fatos acima, não devem ficar impunes. Ao contrário, devem sofrer pena certa, que no caso em tela, é o dever de indenizar, sob pena dos Requeridos repetirem tal conduta, com outros beneficiários (...)” – destaque em caixa alta no original.
“(...) com relação a delimitação correta da pretensão da Autora, a mesma esclarecer que: a) Requer a condenação dos Requeridos Instituto Nacional do Seguro Social – INSS e Banco Bradesco S/A à indenização devida por danos materiais, no importe de R$ 23.391,48 (...), uma vez que o benefício previdenciário não foi creditado quanto aos meses
de dezembro/2017 a outubro/2018; b) Também, requer a indenização por danos morais, onde o ‘quantum’ deverá ser arbitrado por V. Exa., no importe não inferior a 30 (trinta) salários mínimos vigentes (...)”.
A inicial anteriormente transcrita veio instruída com os seguintes documentos: (i) procuração (ID 270111134 – pág. 01); (ii) comprovante de residência e documentação pessoal (ID 270111134 – pág. 02); (iii) certidão de casamento (ID 270111134 – págs. 03/04); (iv) carta de concessão do benefício previdenciário com a menção de que o órgão pagador seria o “Itaú – Santos Ponta da Praia” (ID 270111134 – pág. 05); (v) tela sistêmica da autarquia previdenciária atinente ao “HISCRE – Histórico de Créditos” (ID 270111134 – págs. 06/09); (vi) tela sistêmica da autarquia previdenciária atinente ao “INFBEN – Informações do Benefício” (ID 270111134 – págs. 10/11); (vii) requerimento de bloqueio de averbação/registro de empréstimo e/ou cartão de crédito consignado preenchido em nome da parte-autora, porém, sem a devida assinatura e o protocolo junto ao ente previdenciário (ID 270111134 – pág. 12); e (viii) formulário sistêmico emitido pelo ente autárquico indicativo de que o benefício previdenciário titularizado pela parte-autora encontrava-se “suspenso/cessado”, contendo, ainda, em mencionado documento a menção da contratação de um empréstimo consignado junto ao Banco Bradesco (contrato nº 0123337815031), nos idos de 19/12/2017, com o primeiro desconto aprazado para “01/2018”, estando a avença “excluída” do sistema (com a data de 29/12/2017) – o valor emprestado seria de R$ 39.600,00, o que deveria ser pago em 72 parcelas de R$ 1.094,92 (ID 270111134 – pág. 13).
Citados, os réus apresentaram contestação (IDs 270111151 e 270111154), sendo que, após declinarem não mais haver provas a serem produzidas (IDs 270111227 e 270111228), sobreveio a r. sentença recorrida (IDs 270111230 e 270111231) que, sinteticamente, condenou a autarquia previdenciária ao pagamento de indenização por danos materiais (correspondente ao interregno em que deixou de depositar o benefício previdenciário titularizado pela parte-autora, no montante de R$ 23.391,48), bem como condenou tanto o ente público como a instituição financeira ao pagamento de indenização por danos morais (no importe de R$ 15.000,00, a ser suportado em partes iguais pelos corréus).
Com efeito, compulsando os presentes autos, verifica-se que a questão afeta à contratação de empréstimo consignado de forma fraudulenta restou equacionada de maneira administrativa pelo BANCO BRADESCO S. A., conforme é possível ser inferido do documento ID 270111134 – pág. 13 carreado aos autos pela própria parte-autora, donde se constata que a avença foi suspensa poucos dias após sua contratação, encontrando-se, desta forma, “excluída” do sistema, não tendo havido qualquer débito de prestação a ser objeto de ressarcimento nesta senda. Assim, mostra-se escorreita a não condenação da instituição financeira ao pagamento de indenização a título de danos materiais.
Por sua vez, no que se refere ao pleito de condenação do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS ao pagamento de indenização pelos danos materiais sofridos pela parte-autora, verifica-se dos autos a existência de alegação respaldada por extratos bancários (ID 270111201 c.c. IDs 270111213, 270111214, 270111215, 270111216, 270111217, 270111218 e 270111219) a apontar que a parte-autora não percebeu sua aposentadoria por tempo de serviço nas competências compreendidas entre dezembro/2017 e outubro/2018, em decorrência, a princípio, do fraudulento empréstimo consignado tomado por terceira pessoa, cabendo considerar que o ente previdenciário não se desincumbiu do ônus de provar o efetivo adimplemento de tais parcelas (na forma do art. 373, II, do Código de Processo Civil), sendo, assim, de rigor a manutenção da r. sentença no ponto em que o condenou ao pagamento da indenização ora em apreciação (na casa de R$ 23.391,48).
Pertinente salientar a completa impropriedade, para o deslinde da controvérsia posta, da alegação tecida pela autarquia no sentido de que não caberia a ela a imposição do ônus de apresentar o instrumento contratual entabulado entre o agente financeiro e a parte-autora com o fito de se comprovar a regularidade do empréstimo consignado então levado a efeito. Firma-se tal convicção à luz de que a ilegalidade da tomada do crédito já foi reconhecida pela instituição financeira (tanto que o contrato restou cancelado antes mesmo da cobrança da primeira parcela – ID 270111134 – pág. 13), não tendo pertinência perquirir-se questão (validade do contrato) sobre a qual já se assentou sua ilicitude.
Passo seguinte, no que se refere à pretensão de condenação dos corréus ao pagamento de indenização a título de danos morais, cumpre pontuar que a parte-autora, em razão de falha imputável reciproca e concomitantemente ao BANCO BRADESCO S. A. e ao INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS (à luz, no que tange a este réu, de que o benefício previdenciário da parte-autora era comumente pago junto ao “Banco Itaú” e o empréstimo consignado fraudulento foi requerido e obtido junto ao “Banco Bradesco”, avocando-se, assim, responsabilidade subsidiária a teor do sustentado anteriormente ao longo deste v. voto), viu-se privada de verba de natureza alimentar por longos meses (sem prejuízo de toda a dificuldade enfrentada na tentativa de solucionar a questão de maneira administrativa), culminando na necessidade de acionamento do Poder Judiciário para ver-se ressarcida no tocante aos valores não pagos de prestação previdenciária. Tais aspectos, devidamente concatenados, têm o condão de configurar dano moral presumido, que deve ser ressarcido em conjunto pelos apelantes (tal qual assentado na r. sentença recorrida).
Importante ser dito que a conclusão acima indicada não cede em face da argumentação apresentada pelo BANCO BRADESCO S. A. (no sentido de que apenas o ente previdenciário foi condenado ao pagamento de indenização por danos materiais e, nessa toada, porque não constatada a existência de falha na prestação do serviço bancário – vale dizer, não ter havido condenação da instituição financeira ao pagamento de indenização a título de danos materiais -, não teria cabimento impor à empresa privada reparação pelo abalo moral sofrido). Isso porque, conforme já salientado, ao banco não foi imposto o ressarcimento pelos danos materiais justamente porque o empréstimo consignado fraudulento acabou sendo cancelado antes mesmo da cobrança da primeira parcela, de molde a não se verificar, sob o enfoque do agente financeiro, prejuízo (de cunho material) à parte-autora.
Por fim, especificamente no tocante ao valor da indenização financeira por dano moral, imperioso indicar que a importância deve traduzir montante que sirva para a reparação da lesão (considerada a intensidade para o ofendido e a eventual caracterização de dolo ou do grau de culpa do responsável) e também ônus ao responsável para submetê-lo aos deveres fundamentais do Estado de Direito, incluindo o desestímulo de condutas lesivas ao consumidor, devendo ser objeto de ponderação para não ensejar enriquecimento sem causa do lesado ao mesmo tempo em que também não pode ser insignificante ou excessiva para o infrator. Esse dúplice escopo deve ser aferido por comedida avaliação judicial à luz do caso concreto, dialogando ainda com diversas outras matérias que reclamam indenização por dano moral, denotando coerência interdisciplinar na apreciação do magistrado.
Assim, considerando as circunstâncias do caso concreto, a partir dos parâmetros de arbitramento adotados pela jurisprudência desta E. Segunda Turma em casos análogos, tem-se que o quantum fixado à título de danos morais deve ser reduzido para R$ 10.000,00 (rateados em partes iguais, embora se trate de exigência solidária) – aliás, esse montante deverá ser acrescido nos moldes do Manual de Cálculos da Justiça Federal, com juros moratórios contados do evento danoso por se tratar de responsabilidade extracontratual (Súmula 54 do E. STJ). Consigne-se, por oportuno, que a redução de valor ora levada a efeito, a despeito de pugnada apenas pelo BANCO BRADESCO S. A., tem o condão de repercutir na esfera jurídica do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS nos moldes do comando contido no art. 1.005, do Código de Processo Civil.
Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso de apelação interposto pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS e DOU PARCIAL PROVIMENTO ao recurso de apelação manejado pelo BANCO BRADESCO S. A. (apenas para reduzir o valor fixado a título de indenização pelos danos morais sofridos pela parte-autora, estendendo, por consequência, o decidido, nos termos do art. 1.005, do CPC, ao ente previdenciário).
Em vista do trabalho adicional desenvolvido na fase recursal e considerando o conteúdo da controvérsia, com fundamento no art. 85, § 11, do CPC, a verba honorária fixada em primeiro grau de jurisdição, a ser arcada tão somente pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS, deve ser majorada em 10%, respeitados os limites máximos previstos nesse mesmo preceito legal, e observada a publicação da decisão recorrida a partir de 18/03/2016, inclusive (E. STJ, Agravo Interno nos Embargos de Divergência 1.539.725/DF, Rel. Min. Antônio Carlos Ferreira, 2ª seção, DJe de 19/10/2017).
É o voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. FRAUDE. RESPONSABILIDADE DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. ÔNUS SUBSIDIÁRIO DO INSS. DANO MATERIAL COMPROVADO. DANO MORAL PRESUMIDO.
- Por força do art. 6º, § 2º, da Lei nº 10.820/2003, o INSS não tem responsabilidade civil pelos danos patrimoniais ou extrapatrimoniais decorrentes de “empréstimo consignado”, concedido mediante fraude, se a instituição financeira credora é a mesma responsável pelo pagamento do benefício previdenciário, mas a autarquia é parte legítima para responder (subsidiariamente) por lesões se o empréstimo tiver sido concedido, mediante fraude, por instituição financeira distinta daquela responsável pelo pagamento ordinário da benesse. Tema 183/TNU e precedentes do E. STJ.
- A questão afeta à contratação de empréstimo consignado de forma fraudulenta restou equacionada de maneira administrativa pelo banco, destacando-se que a avença foi suspensa poucos dias após sua contratação, encontrando-se, desta forma, “excluída” do sistema, não tendo havido qualquer débito de prestação a ser objeto de ressarcimento nesta senda. Assim, mostra-se escorreita a não condenação da instituição financeira ao pagamento de indenização a título de danos materiais.
- No que se refere ao pleito de condenação do ente previdenciário ao pagamento de indenização pelos danos materiais sofridos, nota-se que a parte-autora não percebeu sua aposentadoria por tempo de serviço nas competências compreendidas entre dezembro/2017 e outubro/2018, em decorrência, a princípio, do fraudulento empréstimo consignado tomado por terceira pessoa, cabendo considerar que o ente previdenciário não se desincumbiu do ônus de provar o efetivo adimplemento de tais parcelas (na forma do art. 373, II, do Código de Processo Civil), sendo, assim, de rigor a manutenção da r. sentença no ponto em que o condenou ao pagamento da respectiva indenização.
- A parte-autora, em razão de falha imputável reciproca e concomitantemente aos corréus, viu-se privada de verba de natureza alimentar por longos meses (sem prejuízo de toda a dificuldade enfrentada na tentativa de solucionar a questão de maneira administrativa), culminando na necessidade de acionamento do Poder Judiciário para ver-se ressarcida no tocante aos valores não pagos de prestação previdenciária. Tais aspectos, devidamente concatenados, têm o condão de configurar dano moral presumido.
- Especificamente no tocante ao valor da indenização financeira por dano moral, a importância deve traduzir montante que sirva para a reparação da lesão (considerada a intensidade para o ofendido e a eventual caracterização de dolo ou do grau de culpa do responsável) e também ônus ao responsável para submetê-lo aos deveres fundamentais do Estado de Direito, incluindo o desestímulo de condutas lesivas ao consumidor, devendo ser objeto de ponderação para não ensejar enriquecimento sem causa do lesado ao mesmo tempo em que também não pode ser insignificante ou excessiva para o infrator. Esse dúplice escopo deve ser aferido por comedida avaliação judicial à luz do caso concreto, dialogando ainda com diversas outras matérias que reclamam indenização por dano moral, denotando coerência interdisciplinar na apreciação do magistrado. Importe fixado em 1º grau de jurisdição reduzido para R$ 10.000,00 tendo como base situações semelhantes enfrentadas pelo órgão julgador.
- Apelo da autarquia previdenciária desprovido. Apelo da instituição financeira parcialmente provido. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Segunda Turma decidiu, por unanimidade, NEGAR PROVIMENTO ao recurso de apelação interposto pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS e DAR PARCIAL PROVIMENTO ao recurso de apelação manejado pelo BANCO BRADESCO S. A., nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.