PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ERRO MATERIAL. CORREÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. LEI VIGENTE À ÉPOCA DO EXERCÍCIO LABORAL. AGENTES BIOLÓGICOS. ANÁLISE QUALITATIVA. EXPOSIÇÃO COMPROVADA. ILEGITIMIDADE PASIVA DO INSS. REGIME PRÓPRIO. ESPECIALIDADE RECONHECIDA. RMI DO B...
Ementa:
PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ERRO MATERIAL. CORREÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. LEI VIGENTE À ÉPOCA DO EXERCÍCIO LABORAL. AGENTES BIOLÓGICOS. ANÁLISE QUALITATIVA. EXPOSIÇÃO COMPROVADA. ILEGITIMIDADE PASIVA DO INSS. REGIME PRÓPRIO. ESPECIALIDADE RECONHECIDA. RMI DO BENEFÍCIO. REVISÃO DEVIDA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
- Primeiramente, corrijo o erro material constante na conclusão e dispositivo da sentença, uma vez que, conforme pedido inicial, fundamentação, CNIS e CTPS, o vínculo empregatício com o empregador "Município de Piedade" teve início em 21/01/1991.
- O exercício de atividades nocivas, causadoras de algum prejuízo à saúde e à integridade física ou mental do trabalhador ao longo do tempo, independentemente de idade, garante ao trabalhador a conversão em tempo comum para fins de aposentação por tempo de contribuição.
- Conforme orientação do C. Superior Tribunal de Justiça, a natureza especial da atividade deve ser reconhecida em razão do tempo da prestação e da legislação então vigente, tornando-se direito adquirido do empregado.
- O agente nocivo deve, em regra, ser definido em legislação contemporânea ao labor, admitindo-se excepcionalmente que se reconheça como nociva a sujeição do segurado a agente não previsto em regulamento, desde que comprovada a sua efetiva prejudicialidade.
- O labor deve ser exercido de forma habitual e permanente, com exposição do segurado ao agente nocivo indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço.
- A discussão sobre o uso de Equipamento de Proteção Individual (EPI) como fator de descaracterização do tempo especial encontra-se balizada pelo C. STF no Tema 555 de repercussão geral. Na hipótese de o segurado apresentar PPP indicativo de sua exposição a determinado agente nocivo e inexistindo prova de que o EPI, embora possa atenuar os efeitos prejudiciais, seja capaz de neutralizar totalmente a nocividade do ambiente laborativo, é de rigor reconhecer a especialidade do labor. Além disso, ficou pacificado que inexiste EPI capaz de neutralizar ou minimizar os efeitos nocivos do agente ruído. Precedentes.
- A exposição do trabalhador a agentes biológicos tem sua intensidade medida por análise qualitativa, bastando apenas o contato físico para caracterização da especialidade do trabalho, uma vez que não estabelece limites de tolerância ou quaisquer especificações no que tange à concentração dos agentes.
- Ilegitimidade passiva do INSS para reconhecimento da especialidade de período em que a parte autora esteve filiada ao Regime Próprio de Previdência.
- Reconhecida a atividade especial, exercida sob condições nocivas à saúde ou à integridade física do segurado, nos períodos de21/01/1991 a 30/04/1993 e 01/07/1999 a 13/10/2017.
- Diante dos períodos especiais ora reconhecidos, a parte autora faz jus à revisão da RMI do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição concedido na esfera administrativa.
- De rigor a manutenção da sucumbência recíproca, conforme fixado pelo r. Juízo a quo.
- Correção, de ofício, de erro material. Apelação da parte autora parcialmente provida. Apelação do INSS desprovida.
(TRF 3ª Região, 10ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5036698-36.2021.4.03.9999, Rel. LEILA PAIVA MORRISON, julgado em 11/10/2023, Intimação via sistema DATA: 18/10/2023)
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PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5036698-36.2021.4.03.9999
RELATOR: Gab. 36 - DES. FED. LEILA PAIVA
APELANTE: RENATA CECILIA TORQUETI FREIRE GOMES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogados do(a) APELANTE: CRISTINA MASSARELLI DO LAGO - SP302742-N, JAELSON DE OLIVEIRA SILVA - SP356411-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, RENATA CECILIA TORQUETI FREIRE GOMES
Advogado do(a) APELADO: CRISTINA MASSARELLI DO LAGO - SP302742-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5036698-36.2021.4.03.9999
RELATOR: Gab. 36 - DES. FED. LEILA PAIVA
APELANTE: RENATA CECILIA TORQUETI FREIRE GOMES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogados do(a) APELANTE: CRISTINA MASSARELLI DO LAGO - SP302742-N, JAELSON DE OLIVEIRA SILVA - SP356411-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, RENATA CECILIA TORQUETI FREIRE GOMES
Advogado do(a) APELADO: CRISTINA MASSARELLI DO LAGO - SP302742-N
R E L A T Ó R I O
A Senhora Desembargadora Federal Leila Paiva (Relatora):
Trata-se de apelações interpostas pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e pela parte autora em ação previdenciária objetivando o reconhecimento de tempo de atividade em condições especiais nos períodos indicados na inicial e a revisão da RMI do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição concedido na esfera administrativa.
O dispositivo da r. sentença foi assim estabelecido (ID 152851488):
"Diante do exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido para DECLARAR como especial o período de 20/01/1991 a 30/04/1993; e CONDENAR a autarquia-ré a recalcular a aposentadoria da autora considerando o tempo especial reconhecido nesta sentença. Tendo em vista a sucumbência reciproca, condeno as partes no pagamento de custas e despesas processuais, no importe de 50% para cada parte, e no pagamento de honorários advocatícios no valor de R$ 1.000,00 ao patrono da parte adversária, nos termos do art. §8º, do CPC, observada eventual gratuidade concedida e isenções legais. Publique e Intime-se."
Em suas razões recursais, o INSS alega que:
- não cabe o reconhecimento do período de 20/01/1991 a 30/04/1993, uma vez que não há enquadramento para a atividade de auxiliar de enfermagem ou agente de saúde nos anexos II e III dos Decretos 53.831/64 e 83.080/79, além do que o PPP apresentado não demonstra a exposição a agentes nocivos acima dos limites de tolerância, não tendo sido demonstrada a exposição permanente a agentes patogênicos de natureza infecto-contagiosa;
Ao final, prequestionando a matéria, pugna pelo provimento do apelo para que o pedido seja julgado improcedente.
Apela a parte autora argumentando que:
- a conversão do tempo trabalhado em condições especiais para tempo comum é possível e está regida pelos artigos 57, §5º, da Lei n. 8.213/1991 e 70 do Decreto n. 3.048/1999;
- deve ser reconhecido o período de 01/05/1993 a 15/03/2006, onde o PPP deixa claro a ineficácia do EPI;
- nos períodos em que exerceu a função de auxiliar de enfermagem, é notadamente claro o contato habitual com agentes nocivos provenientes de pessoas potencialmente infectadas, além do que, trabalhando em hospitais e ambulatórios municipais, qualquer EPI é insuficiente para controlar a nocividade;
- o juiz pode conceder ao postulante mais do que foi pedido ou, até mesmo, benefício diverso do requerido na inicial, tendo em vista a relativização do princípio da congruência;
- o documento necessário que possibilita o enquadramento da atividade como especial no período em comento encontra-se acostado aos autos;
Requer, por fim, o provimento da apelação para que seja reformada a sentença, julgando-se procedente o pleito exordial.
Sem contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte Regional.
É o relatório.
mcn
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5036698-36.2021.4.03.9999
RELATOR: Gab. 36 - DES. FED. LEILA PAIVA
APELANTE: RENATA CECILIA TORQUETI FREIRE GOMES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogados do(a) APELANTE: CRISTINA MASSARELLI DO LAGO - SP302742-N, JAELSON DE OLIVEIRA SILVA - SP356411-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, RENATA CECILIA TORQUETI FREIRE GOMES
Advogado do(a) APELADO: CRISTINA MASSARELLI DO LAGO - SP302742-N
V O T O
A Senhora Desembargadora Federal Leila Paiva (Relatora):
Cinge-se a controvérsia ao reconhecimento de tempo de atividade em condições especiais nos períodos indicados na inicial e à revisão da RMI do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição concedido na esfera administrativa.
As apelações preenchem os requisitos de admissibilidade e merecem ser conhecidas.
Erro material
Primeiramente, corrijo o erro material constante na conclusão e dispositivo da sentença, uma vez que, conforme pedido inicial, fundamentação, CNIS e CTPS, o vínculo empregatício com o empregador "Município de Piedade" teve início em 21/01/1991.
Desse modo, no dispositivo da sentença, onde consta o período de "20/01/1991 a 30/04/1993", leia-se "21/01/1991 a 30/04/1993".
Anote-se, desde logo, que a jurisprudência do C. STJ estabilizou a aplicação do princípio tempus regit actum, que deve orientar o reconhecimento e a comprovação do tempo de trabalho segundo a aplicação da legislação de regência vigente à época do exercício do labor, cujo interregno passa a integrar o patrimônio jurídico do trabalhador como direito adquirido, definindo, ainda, para eventual conversão de tempo, a lei em vigor ao tempo da aposentação. Precedentes: C. STJ, REsp 1.398.260/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, Primeira Seção, j. 14/5/2014, DJe 5/12/2014; REsp 1.151.363, Terceira Seção, Rel. Ministro JORGE MUSSI, DJe 05/04/2011.
Do trabalho em condições especiais
Da atividade especial
O benefício é devido àqueles que tenham exercido atividade especial, demonstrada, basicamente, por duas formas: 1) presunção da especialidade inerente à atividade profissional desempenhada; e 2) em razão da efetiva comprovação da exposição aos fatores nocivos à saúde.
1. O enquadramento do tempo especial por presunção em função do exercício de determinada atividade profissional tinha assento na Lei n. 3.807, de 26/08/1960, denominada Lei Orgânica da Previdência Social (LOPS), e suas respectivas alterações, ulteriormente o artigo 57 da Lei n 8.213, de 24/07/1991. Todavia, deixou de ser admitido com o advento da Lei n. 9.032, de 28/04/1995, que operou alteração no referido artigo 57 da LBPS, para exigir a efetiva prova da exposição ao agente nocivo.
As atividades especiais em função da categoria profissional, à exceção daquelas submetidas aos agentes calor, frio e ruído, para as quais é imprescindível a apresentação de laudo técnico, têm como parâmetro as tabelas dos Decretos n. 53.831, de 25/03/1964, Anexos I e II, e do n. 83.080, de 24/01/1979, Anexo, que vigeram simultaneamente, não tendo ocorrido revogação daquele diploma por este. Portanto, havendo divergência entre as referidas normas, prevalecerá a que for mais favorável ao segurado.
O rol de atividades inserto nos decretos tem caráter exemplificativo. Assim, é possível o enquadramento de outras atividades mediante perícia, consoante a Súmula 198/TFR do extinto E. Tribunal Federal de Recursos: "Atendidos os demais requisitos, é devida a aposentadoria especial, se perícia judicial constata que a atividade exercida pelo segurado é perigosa, insalubre ou penosa, mesmo não inscrita em Regulamento”.
Consolidando esse entendimento, o C. STJ definiu, no julgamento do REsp 1.306.113, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, o Tema 534/STJ: "as normas regulamentadoras que estabelecem os casos de agentes e atividades nocivos à saúde do trabalhador são exemplificativas, podendo ser tido como distinto o labor que a técnica médica e a legislação correlata considerarem como prejudiciais ao obreiro, desde que o trabalho seja permanente, não ocasional, nem intermitente, em condições especiais (art. 57, § 3º, da Lei 8.213/1991)", (PRIMEIRA SEÇÃO, j. 14/11/2012, DJe 07/03/2013, t. j. 26/06/2013).
O artigo 21 da EC 103/2019 vedou, expressamente, a caracterização do tempo especial por presunção relacionada a categoria profissional ou ocupação.
2. Noutra etapa, passou a ser exigida a comprovação de efetiva exposição aos agentes considerados prejudiciais à saúde ou à integridade física do segurado, consoante a Lei n. 9.032, de 28/04/1995, que deu nova redação ao artigo 57 da LBPS, impondo-se, a demonstração da submissão de forma permanente, não ocasional nem intermitente.
Nesse sentido, "a permanência e a habitualidade da exposição a agentes nocivos à saúde são requisitos exigíveis apenas para as atividades exercidas a partir de 29/04/1995, quando entrou em vigor a Lei n. 9.032/95, que alterou a redação do art. 57, § 3º, da Lei n. 8.213/1991" (AgInt no REsp 1.695.360/SP, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, Primeira Turma, j. 1º/04/2019, DJe 03/04/2019).
2.1. Inicialmente, considerava-se suficiente a constatação por meio dos formuláriospadrões (IS SSS-501.19/71, ISS-132, SB-40, DISES BE 5235, DSS-8030, DIRBEN-8030), preenchidos pelo empregador, independentemente de laudo técnico, com as devidas ressalvas aos agentes nocivos ruído, calor e frio, que sempre dependeram de demonstração por meio de laudo.
Nesse sentido é a compreensão do C. STJ, manifestada no Incidente de Uniformização de Jurisprudência, Pet 9.194/PR, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA (Primeira Seção, j. 28/05/2014, publ. 03/06/2014).
2.2. Noutro giro, o artigo 58 da Lei n. 8.213, de 24/07/1991, passou a exigir laudo técnico para comprovação das condições adversas de trabalho.
O Laudo Técnico de Condições Ambientais (LTCAT) previsto no § 1º do artigo 58 da LBPS deve ser elaborado por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho, e objetiva evidenciar as condições do local de trabalho para fins de reconhecimento de atividade especial. A atualização do documento é anual, quando da avaliação global, ou sempre que ocorrer qualquer alteração no ambiente de trabalho ou em sua organização.
Essa regra foi introduzida na ordem jurídica nacional pela Medida Provisória (MP) n. 1.523, de 11/10/1996, diversas vezes reeditada, e republicada pela MP n. 1.596-14, de 10/11/1997, finalmente convertida na Lei n. 9.528, de 10/12/1997.
Nessa senda, ponderando que ainda não se encontra totalmente sedimentada a jurisprudência sobre o assunto, passo a acompanhar o entendimento professado por esta E. Décima Turma, acerca da exigência do laudo técnico ou perícia técnica a partir da Lei n. 9.528, de 10/12/1997, visto que essa norma legal concedeu supedâneo jurídico válido ao Decreto n. 2.172, de 05/03/1997, em homenagem ao princípio constitucional da estrita legalidade.
Nesse sentido, colaciono precedentes do E. Superior Tribunal de Justiça:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. EXPOSIÇÃO A RUÍDO. COMPROVAÇÃO. NECESSIDADE DE LAUDO TÉCNICO. NÃO RECONHECIMENTO PELO TRIBUNAL A QUO. ALTERAÇÃO DO JULGADO. SÚMULA 7/STJ.
(...) 2. E ainda, nos termos da jurisprudência pacífica desta Corte, até o advento da Lei 9.032/1995, é possível o reconhecimento do tempo de serviço especial em face do enquadramento na categoria profissional do trabalhador. A partir dessa lei, a comprovação da atividade especial se dá por meio dos formulários SB-40 e DSS-8030, expedidos pelo INSS e preenchidos pelo empregador, situação modificada com a Lei 9.528/1997, que passou a exigir laudo técnico.
3. Contudo, o STJ orienta-se no sentido de que o reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído só se dá por laudo pericial; caso contrário, não é possível o reconhecimento do labor em condição especial. Precedente: REsp 1.657.238/RS, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 5/5/2017.
(...) 7. Agravo conhecido para não conhecer do Recurso Especial.
(AREsp 1773720/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/02/2021, DJe 01/07/2021)
Com o mesmo entendimento: AgInt no AREsp 894.266/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, Segunda Turma, j. 06/10/2016, DJe 17/10/2016; AgRg no AREsp 767.585/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, Segunda Turma, j. 27/10/2015, DJe 20/11/2015; REsp n. 422.616/RS, Rel. Ministro JORGE SCARTEZZINI, j. 02/03/2004, DJ 24/05/2004, p. 323; REsp n. 421.045/SC, Rel. Ministro JORGE SCARTEZZINI, j. 06/05/2004, DJ 28/06/2004, p. 382.
2.3. Ainda, a partir de 01/01/2004 passou a ser exigida a apresentação do formulário Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), que substituiu os formulários anteriores, e dispensa a apresentação de laudo pericial, inclusive o LTCAT.
O novo formulário foi previsto pelo § 4º do artigo 58 da LBPS a partir da alteração da Lei n. 9.528, de 10/12/1997, tendo sido regulamentado na forma do artigo 68 do Decreto n. 3.048, de 06/05/1999, e, inicialmente, pelas IN INSS ns. 95, 99 e 100, todas de 2003. O documento constitui o histórico-laboral do segurado, objetivando evidenciar os riscos do respectivo ambiente de trabalho e consolidar as informações constantes nos instrumentos previstos nas normas de proteção ao ambiente laboral.
O PPP é confeccionado com suporte nos dados do laudo técnico, razão por que é dispensada a apresentação do LTCAT, exceto na hipótese de impugnação idônea de seu conteúdo, na forma do artigo 272 da IN INSS n. 128, de 28/03/2022.
Nesse sentido, o entendimento do C. STJ, consoante o Incidente de Uniformização de Jurisprudência, Pet. 10.262, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, que recebeu a seguinte ementa:
PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. PREVIDENCIÁRIO. COMPROVAÇÃO DE TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. RUÍDO. PERFIL PROFISSIOGRÁFICO PREVIDENCIÁRIO (PPP). APRESENTAÇÃO SIMULTÂNEA DO RESPECTIVO LAUDO TÉCNICO DE CONDIÇÕES AMBIENTAIS DE TRABALHO (LTCAT). DESNECESSIDADE QUANDO AUSENTE IDÔNEA IMPUGNAÇÃO AO CONTEÚDO DO PPP.
1. Em regra, trazido aos autos o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), dispensável se faz, para o reconhecimento e contagem do tempo de serviço especial do segurado, a juntada do respectivo Laudo Técnico de Condições Ambientais de Trabalho (LTCAT), na medida que o PPP já é elaborado com base nos dados existentes no LTCAT, ressalvando-se, entretanto, a necessidade da também apresentação desse laudo quando idoneamente impugnado o conteúdo do PPP.
2. No caso concreto, conforme destacado no escorreito acórdão da TNU, assim como no bem lançado pronunciamento do Parquet, não foi suscitada pelo órgão previdenciário nenhuma objeção específica às informações técnicas constantes do PPP anexado aos autos, não se podendo, por isso, recusar-lhe validade como meio de prova apto à comprovação da exposição do trabalhador ao agente nocivo "ruído".
3. Pedido de uniformização de jurisprudência improcedente.
(Pet 10.262/RS, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 08/02/2017, DJe 16/02/2017)
Ressalte-se que o PPP é documento que retrata as características do trabalho do segurado, e traz a identificação do engenheiro ou perito responsável pela avaliação das condições de trabalho, sendo apto para comprovar o exercício de atividade sob condições especiais, fazendo as vezes do laudo técnico. Precedente: TRF3, Décima Turma, AC 00283905320084039999, Rel. Desembargador Federal SÉRGIO NASCIMENTO, DJF3 24/02/2010.
Síntese da comprovação do tempo de trabalho especial
O reconhecimento do trabalho especial será possível, considerada a evolução legislativa exposta, nos seguintes termos:
1) até 28/04/1995: com fulcro na Lei n. 3.807, de 26/08/1960 (LOPS), e suas alterações; e, posteriormente, a Lei n. 8.213, de 24/07/1991, em sua redação original, pela presunção da especialidade do trabalho, mediante o enquadramento da atividade, considerada a ocupação profissional ou a exposição a agentes nocivos, segundo as normas de regência da época, especialmente os Decretos n. 53.831, de 25/03/1964 e n. 83.080, de 24/01/1979. Admitida qualquer meio probatório, inclusive, mediante os antigos formulários, que vigoraram até 31/12/2003, independentemente de laudo técnico, à exceção dos agentes calor, frio e ruído.
2) a partir de 29/04/1995: entrou em vigor a Lei n. 9.032, de 28/04/1995, que alterou o artigo 57 da Lei n. 8.213, de 24/07/1991, e extinguiu a presunção da especialidade das atividades por categoria profissional, passando a ser imprescindível a demonstração por qualquer meio deprova da submissão aos agentes insalubres, considerando-se suficiente a apresentação de formulários padrão (IS SSS-501.19/71, ISS-132, SB-40, DISES-BE 5235, DSS-8030, DIRBEN-8030) preenchidos pela empresa (artigo 272 da IN INSS n. 128, de 28/03/2022), independentemente de laudo técnico, à exceção dos agentes calor, frio e ruído.
3) a partir de 11/12/1997: tem efetividade o Decreto n. 2.172, de 05/03/1997, que regulamenta a Lei n. 9.528, de 10/12/1997, o qual convalidou a MP n. 1.523, de 11/10/1996, diversas vezes reeditada, e republicada pela MP n. 1.596-14, de 10/11/1997, exigindo para o reconhecimento de tempo de serviço especial a prova qualificada da efetiva sujeição do segurado a quaisquer agentes agressivos mediante apresentação de formulário padrão elaborado com supedâneo em Laudo Técnico de Condições Ambientais do Trabalho (LTCAT) ou perícia técnica.
4) a partir de 01/01/2004: é obrigatória a apresentação do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), na forma do § 4º do artigo 58 da Lei n. 8.213, de 24/07/1991, com redação da Lei n. 9.528, de 10/12/1997, regulamentado pelo artigo 68 do Decreto n. 3.048, de 06/05/1999, e, inicialmente, pelas IN INSS ns. 95, 99 e 100, de 2003, depois pelo artigo 128 da IN INSS 128, de 28/03/2022.
Da conversão do tempo de trabalho
Após o reconhecimento do período laborado em condição comum ou especial, passa-se à utilização do respectivo interregno, mediante a conversão do tempo, para fins da aposentadoria. Entretanto, após a EC 103/2019, não há previsão na ordem jurídica nacional do direito à conversão de tempo de serviço.
1. A possibilidade de conversão de tempo comum em especial, com fulcro na redação original do artigo 57, § 3º, da Lei n. 8.213, de 24/07/1991, denominada conversão inversa, permaneceu hígida até ser suprimida na data da publicação da Lei n. 9.032, de 28/04/1995, passando a ser vedada a partir de 29/04/1995.
2. No que toca à conversão do tempoespecial em comum, o artigo 25, § 2º da EC 103/2019, reconheceu essa possibilidade, porém tão somente até a data de entrada em vigor da Reforma Previdenciária da EC 103/2019, em 13/11/2019, proibindo a conversão de tempo laborado após esta data, in verbis:
Art. 25 (...) § 2º “Será reconhecida a conversão de tempo especial em comum, na forma prevista na Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, ao segurado do Regime Geral de Previdência Social que comprovar tempo de efetivo exercício de atividade sujeita a condições especiais que efetivamente prejudiquem a saúde, cumprido até a data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional, vedada a conversão para o tempo cumprido após esta data”.
Vale rememorar que o assunto foi objeto de discussões. A celeuma iniciou-se a partir da entrada em vigor do artigo 28 da MP n. 1.663-10, de 28/05/1998, que havia revogado em parte o artigo 57 da Lei n. 8.213, de 24/07/1991, vedando, naquela ocasião, a possibilidade de conversão de tempo especial em comum. No entanto, após diversas reedições, a norma revogadora foi suprimida da Lei n. 9.711, de 20/11/1998, remanescendo na ordem jurídica a possibilidade de convolar, garantida pelo teor do § 5º do artigo 57 da LBPS.
Assim, o C. STJ consolidou o entendimento sobre o direito do trabalhador à conversão do tempo de serviço especial em comum para fins de concessão de aposentadoria, no julgamento do REsp n. 1.151.363/MG, Rel. Ministro JORGE MUSSI, (j. 23/03/2011, pub. 05/04/2011, t. j. 10/05/2011), cristalizando as teses dos Temas 422 e 423, in verbis:
Tema 422/STJ: Permanece a possibilidade de conversão do tempo de serviço exercido em atividades especiais para comum após 1998, pois a partir da última reedição da MP n. 1.663, parcialmente convertida na Lei 9.711/1998, a norma tornou-se definitiva sem a parte do texto que revogava o referido § 5º do art. 57 da Lei n. 8.213/1991.
Tema 423/STJ: A adoção deste ou daquele fator de conversão depende, tão somente, do tempo de contribuição total exigido em lei para a aposentadoria integral, ou seja, deve corresponder ao valor tomado como parâmetro, numa relação de proporcionalidade, o que corresponde a um mero cálculo matemático e não de regra previdenciária.
Ainda, tratando novamente da questão, o C. STJ deliberou a respeito da lei aplicável ao pedido de conversão do período de trabalho especial em comum e vice-versa, no julgamento do REsp n. 1.310.034/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, firmando entendimento de que deve prevalecer a legislação vigente no momento do respectivo requerimento administrativo, conforme a tese do Tema 546/STJ:"A lei vigente por ocasião da aposentadoria é a aplicável ao direito à conversão entre tempos de serviço especial e comum, independentemente do regime jurídico à época da prestação do serviço" (Primeira Seção, j. 24/10/2012, DJe 19/12/2012, t. j. 08/01/2018).
Colhe-se da ementa do v. acórdão que: “(...) o STJ sedimentou o entendimento de que, em regra; a) a configuração do tempo especial é de acordo com a lei vigente no momento do labor, e b) a lei em vigor quando preenchidas as exigências da aposentadoria é a que define o fator de conversão entre as espécies de tempo de serviço”.
Esse entendimento foi ratificado por ocasião do julgamento dos embargos de declaração: EDcl no REsp 1.310.034/PR, j. 26/11/2014; e EDcl nos EDcl no REsp 1.310.034/PR, j. 10/06/2015, t. j. 08/01/2018.
Nesse diapasão, uma vez prestado o serviço, o segurado adquire o direito à contagem sob a égide da norma jurídica em vigor no momento da prestação. Entretanto, o direito à conversão deve se submeter à disciplina vigente por ocasião do perfazimento do direito à aposentação.
Do equipamento de proteção individual (EPI)
O exame da utilização de Equipamento de Proteção Individual (EPI) passou a ser exigido para fins de aferição da intensidade do agente agressivo e, consequentemente, caracterização do tempo especial, a partir da edição da MP n. 1.729, de 02/12/1998, convertida na Lei n. 9.732, de 11/12/1998, que alterou o § 2º do artigo 58 da LBPS.
Dessa forma, somente após 03/12/1998 a informação relativa ao EPI eficaz passou a conceder supedâneo ao INSS para afastar a especialidade do labor.
No entanto, a discussão sobre o uso de EPI eficaz encontra-se balizada pelo C. STF no julgamento do ARE n. 664.335, Rel. Ministro LUIZ FUX, sob os auspícios da repercussão geral, tendo sido cristalizadas duas teses do Tema 555/STF: (i)“a primeira tese objetiva que se firma é: o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial”; (ii) “a segunda tese fixada (...): na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual – EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria”. (ARE 664335, Relator Ministro LUIZ FUX, Tribunal Pleno, j. 04/12/2014, publ. 12/02/2015, trâns. julg. 04/03/2015)
Assim, segundo a ratio decidendi fixada pelo Tema 555/STF, na hipótese de o segurado apresentar PPP indicativo de sua exposição a determinado agente nocivo, e inexistindo prova de que o EPI, embora atenue os efeitos prejudiciais, seja capaz de neutralizar totalmente a nocividade do ambiente laborativo, é de rigor admitir a especialidade do labor, até porque, no caso de divergência ou dúvida, a premissa é pelo reconhecimento do direito à especialidade do trabalho.
Nesse sentido é o entendimento desta E. Décima Turma:
PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. RUÍDO.
3. O uso do equipamento de proteção individual - EPI, pode ser insuficiente para neutralizar completamente a nocividade a que o trabalhador esteja submetido. (STF, ARE 664335/SC, Tribunal Pleno, Relator Ministro Luiz Fux, j. 04/12/2014, DJe-029 DIVULG 11/02/2015 Public 12/02/2015).
(...) 8. Remessa oficial, havida como submetida, e apelação providas em parte.
(TRF 3ª Região, 10ª Turma, ApCiv 5255662-30.2020.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal PAULO OCTAVIO BAPTISTA PEREIRA, j. 03/02/2022, DJEN: 09/02/2022)
Da prévia fonte de custeio
A matéria foi pacificada pelo C. STF no mesmo julgamento do ARE 664.335/SC, Rel. Ministro LUIZ FUX, (j. 04/12/2014, publ. 12/02/2015, t. j. 04/03/2015), quando foi afastada a alegação de ausência de prévia fonte de custeio para o direito à aposentadoria especial.
É sabido que o recolhimento das contribuições previdenciárias constitui obrigação do empregador. Incabível, pois, penalizar o trabalhador pela ausência do pagamento de tributos por parte da empresa, vez que a Autarquia Previdenciária tem mecanismos próprios de receber seus créditos, especialmente as contribuições sociais destinadas ao custeio da aposentação especial, na forma do artigo 57, §§ 6º e 7º, da LBPS, c/c os artigos 22, II, e 30, I, da Lei n. 8.212, de 24/07/1991, que institui o Plano de Custeio da Previdência Social, essa é a ratio decidendi do referido precedente obrigatório.
Da data do início do benefício (DIB)
Cumpre reiterar que o reconhecimento do direito à contagem do tempo especial deve ser norteado pelo momento que se consolidou a efetiva prestação das atividades especiais, porquanto o trabalhador incorporou ao seu patrimônio jurídico o direito à contagem do interregno como especial.
O C. STJ consolidou a orientação no sentido de que a data de início do pagamento do benefício (DIB) será fixada na data do requerimento administrativo (DER), se estiverem preenchidos os requisitos, ainda que a comprovação da especialidade da atividade tenha surgido em momento posterior, nos termos do Incidente de Uniformização, Petição 9.582, cuja ementa foi assim redigida, in verbis:
"PREVIDENCIÁRIO. INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. APOSENTADORIA ESPECIAL. TERMO INICIAL: DATA DO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO, QUANDO JÁ PREENCHIDOS OS REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA PROVIDO.
1. O art. 57, § 2o., da Lei 8.213/91 confere à aposentadoria especial o mesmo tratamento dado para a fixação do termo inicial da aposentadoria por idade, qual seja, a data de entrada do requerimento administrativo para todos os segurados, exceto o empregado.
2. A comprovação extemporânea da situação jurídica consolidada em momento anterior não tem o condão de afastar o direito adquirido do segurado, impondo-se o reconhecimento do direito ao benefício previdenciário no momento do requerimento administrativo, quando preenchidos os requisitos para a concessão da aposentadoria.
3. In casu, merece reparos o acórdão recorrido que, a despeito de reconhecer que o segurado já havia implementado os requisitos para a concessão de aposentadoria especial na data do requerimento administrativo, determinou a data inicial do benefício em momento posterior, quando foram apresentados em juízo os documentos comprobatórios do tempo laborado em condições especiais.
4. Incidente de uniformização provido para fazer prevalecer a orientação ora firmada."
(STJ - Petição nº 9.582 - RS (2012/0239062-7), Primeira Seção, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 26/08/15).
No entanto, quanto ao termo inicial dos efeitos financeiros, o C. STJ afetou os Recursos Especiais ns. 1.905.830/SP, 1.912.784/SP e 1.913.152/SP, para definição do Tema 1124/STJ: “definir o termo inicial dos efeitos financeiros dos benefícios previdenciários concedidos ou revisados judicialmente, por meio de prova não submetida ao crivo administrativo do INSS: se a contar da data do requerimento administrativo ou da citação da autarquia previdenciária”.
Assim, quando se verificar que a parte autora apresentou documentos do labor em condições especiais que não figuraram no requerimento administrativo, o termo inicial dos efeitos financeiros, representativo da data do início do pagamento (DIP), deverá ser estabelecido na fase da liquidação, nos exatos parâmetros do que restar assentado pelo C. Superior Tribunal de Justiça, na definição do Tema n. 1.124/STJ.
Nesse mesmo sentido, manifestou-se a E. Décima Turma: AC n. 0002775-35.2015.4.03.6113/SP, Décima Turma, Rel. Desembargador Federal Sérgio Nascimento, publ: 16/02/2022.
Dos agentes biológicos
As atividades profissionais que se submetam ao contato com doentes ou materiais infectocontagiantes são previstas como especiais em razão dos agentes biológicos a que estão expostos (vírus, bactérias, protozoários, parasitas, fungos, germes e outros micro-organismos), nos termos do item 1.3.2 do Anexo do Decreto 53.831/64 e item 3.0.1 do Anexo IV dos Decretos 2.172/97 e 3.048/99.
Segundo o Anexo 14, da NR-15 do Ministério do Trabalho e Emprego são insalubres as atividades profissionais que envolvam: pacientes em isolamento por doenças infectocontagiosas, bem como objetos de seu uso, não previamente esterilizados; carnes, glândulas, vísceras, sangue, ossos, couros, pelos e dejeções de animais portadores de doenças infectocontagiosas; esgotos (galerias e tanques); lixo urbano (coleta e industrialização); hospitais, serviços de emergência, enfermarias, ambulatórios, postos de vacinação e outros estabelecimentos destinados aos cuidados da saúde humana (aplica-se unicamente ao pessoal que tenha contato com os pacientes, bem como aos que manuseiam objetos de uso desses pacientes, não previamente esterilizados); hospitais, ambulatórios, postos de vacinação e outros estabelecimentos destinados ao atendimento e tratamento de animais (aplica-se apenas ao pessoal que tenha contato com tais animais); contato em laboratórios, com animais destinados ao preparo de soro, vacinas e outros produtos; laboratórios de análise clínica e histopatologia (aplica-se tão-somente ao pessoal técnico); gabinetes de autópsias, de anatomia e histoanatomopatologia (aplica-se somente ao pessoal técnico); cemitérios; estábulos e cavalariças; e resíduos de animais deteriorados.
Também estabelece aludido Anexo que a exposição do trabalhador a agentes biológicos tem sua intensidade medida por análise qualitativa, bastando apenas o contato físico para caracterização da especialidade do trabalho, uma vez que não estabelece limites de tolerância ou quaisquer especificações no que tange à concentração dos agentes.
Nesse ponto, entende-se por critério qualitativo a exposição iminente aos riscos biológicos ao longo do desenvolvimento do trabalho, não se exigindo a exposição durante toda a jornada, até mesmo porque o artigo 65 do Decreto n. 4.882/2003 estabeleceu: “Considera-se trabalho permanente, para efeito desta Subseção, aquele que é exercido de forma não ocasional nem intermitente, no qual a exposição do empregado, do trabalhador avulso ou do cooperado ao agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço”. (Redação dada pelo Decreto n. 4.882, de 2003)”
Nesse sentido, o Colendo Superior Tribunal de Justiça:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. DEFICIÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. ÓBICE DA SÚMULA 284/STF. TEMPO ESPECIAL. EXPOSIÇÃO A AGENTES BIOLÓGICOS. AMBIENTE HOSPITALAR. CONCEITOS DE HABITUALIDADE E PERMANÊNCIA QUE COMPORTAM INTERPRETAÇÃO. PREVALÊNCIA DO CRITÉRIO QUALITATIVO. RISCO IMINENTE. AVALIAÇÃO DA REAL EFETIVIDADE E DA DEVIDA UTILIZAÇÃO DO EPI. REEXAME DE PROVA. SÚMULA 7/STJ. CONVERSÃO DE TEMPO DE SERVIÇO COMUM EM ESPECIAL. INCIDÊNCIA DA LEGISLAÇÃO VIGENTE QUANDO PREENCHIDOS OS REQUISITOS DO BENEFÍCIO PRETENDIDO. MATÉRIA JÁ DECIDIDA SOB O RITO DO ART. 543-C DO CPC.
1. É deficiente a fundamentação do recurso especial em que a alegação de ofensa ao art. 535 do CPC se faz de forma genérica, sem a demonstração exata dos pontos pelos quais o acórdão se fez omisso, contraditório ou obscuro. Aplica-se, na hipótese, o óbice da Súmula 284 do STF.
2. A circunstância de o contato com os agentes biológicos não perdurar durante toda a jornada de trabalho não significa que não tenha havido exposição a agentes nocivos de forma habitual e permanente, na medida que a natureza do trabalho desenvolvido pela autora, no ambiente laboral hospitalar, permite concluir por sua constante vulnerabilidade. Questão que se resolve pelo parâmetro qualitativo, e não quantitativo.
3. Na hipótese, a instância ordinária manifestou-se no sentido de que, sendo evidente a exposição a agentes de natureza infecto-contagiosa, não há como atestar a real efetividade do Equipamento de Proteção Individual - EPI. Rever esse entendimento, tal como colocada a questão nas razões recursais, demandaria, necessariamente, novo exame do acervo fático-probatório constante dos autos, providência vedada em recurso especial, conforme o óbice da Súmula 7/STJ.
4. No julgamento do REsp 1.310.034/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, processado nos termos do arts. 543-C do CPC, o STJ firmou entendimento no sentido de que, para fazer jus à conversão de tempo de serviço comum em especial, é necessário que o segurado tenha reunido os requisitos para o benefício pretendido antes da vigência da Lei n. 9.032/95, independentemente do regime jurídico reinante à época em que prestado o serviço.
5. Recurso especial do INSS parcialmente provido, para se afastar a pretendida conversão de tempo de serviço comum em especial.
(REsp. nº 1.468.401/RS, Primeira Turma, Relator Ministro. SÉRGIO KUKINA, DJe 27.03.2017) (destaquei
Da especialidade do período em gozo do benefício de auxílio-doença
A matéria foi pacificada pelo C. STJ no julgamento do REsp 1.759.098/RS, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, que definiu o Tema 998/STJ segundo a seguinte tese: "o segurado em gozo de auxílio-doença, seja acidentário ou previdenciário, faz jus ao cômputo desse mesmo período como tempo de serviço especial", conforme o v. acórdão assim ementado:
"PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL ADMITIDO COMO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 1.036 DO CÓDIGO FUX. POSSIBILIDADE DE CÔMPUTO DO TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL, PARA FINS DE APOSENTADORIA, PRESTADO NO PERÍODO EM QUE O SEGURADO ESTEVE EM GOZO DE AUXÍLIO-DOENÇA DE NATUREZA NÃO ACIDENTÁRIA. PARECER MINISTERIAL PELO PROVIMENTO PARCIAL DO RECURSO. RECURSO ESPECIAL DO INSS A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. Até a edição do Decreto 3.048/1999 inexistia na legislação qualquer restrição ao cômputo do tempo de benefício por incapacidade não acidentário para fins de conversão de tempo especial. Assim, comprovada a exposição do Segurado a condições especiais que prejudicassem a sua saúde e a integridade física, na forma exigida pela legislação, reconhecer-se-ia a especialidade pelo período de afastamento em que o Segurado permanecesse em gozo de auxílio-doença, seja este acidentário ou previdenciário.
2. A partir da alteração então promovida pelo Decreto 4.882/2003, nas hipóteses em que o Segurado fosse afastado de suas atividades habituais especiais por motivos de auxílio-doença não acidentário, o período de afastamento seria computado como tempo de atividade comum.
3. A justificativa para tal distinção era o fato de que, nos períodos de afastamento em razão de benefício não acidentário, não estaria o Segurado exposto a qualquer agente nocivo, o que impossibilitaria a contagem de tal período como tempo de serviço especial.
4. Contudo, a legislação continuou a permitir o cômputo, como atividade especial, de períodos em que o Segurado estivesse em gozo de salário-maternidade e férias, por exemplo, afastamentos esses que também suspendem o seu contrato de trabalho, tal como ocorre com o auxílio-doença não acidentário, e retiram o Trabalhador da exposição aos agentes nocivos. Isso denota irracionalidade na limitação imposta pelo decreto regulamentar, afrontando as premissas da interpretação das regras de Direito Previdenciário, que prima pela expansão da proteção preventiva ao Segurado e pela máxima eficácia de suas salvaguardas jurídicas e judiciais.
5. Não se pode esperar do poder judicial qualquer interpretação jurídica que venha a restringir ou prejudicar o plexo de garantias das pessoas, com destaque para aquelas que reinvindicam legítima proteção do Direito Previdenciário. Pelo contrário, o esperável da atividade judicante é que restaure visão humanística do Direito, que foi destruída pelo positivismo jurídico.
6. Deve-se levar em conta que a Lei de Benefícios não traz qualquer distinção quanto aos benefícios auxílio-doença acidentário ou previdenciário. Por outro lado, a Lei 9.032/1995 ampliou a aproximação da natureza jurídica dos dois institutos e o § 6o. do artigo 57 da Lei 8.213/1991 determinou expressamente que o direito ao benefício previdenciário da aposentadoria especial será financiado com os recursos provenientes da contribuição deque trata o art. 22, II da Lei 8.212/1991, cujas alíquotas são acrescidas conforme a atividade exercida pelo Segurado a serviço da empresa, alíquotas, estas, que são recolhidas independentemente de estar ou não o Trabalhador em gozo de benefício.
7. Note-se que o custeio do tempo de contribuição especial se dá por intermédio de fonte que não é diretamente relacionada à natureza dada ao benefício por incapacidade concedido ao Segurado, mas sim quanto ao grau preponderante de risco existente no local de trabalho deste, o que importa concluir que, estando ou não afastado por benefício movido por acidente do trabalho, o Segurado exposto a condições nocivas à sua saúde promove a ocorrência do fato gerador da contribuição previdenciária destinada ao custeio do benefício de aposentadoria especial.
8. Tais ponderações, permitem concluir que o Decreto 4.882/2003 extrapolou o limite do poder regulamentar administrativo, restringindo ilegalmente a proteção exclusiva dada pela Previdência Social ao trabalhador sujeito a condições especiais que prejudiquem a sua saúde ou a sua integridade física.
9. Impõe-se reconhecer que o Segurado faz jus à percepção de benefício por incapacidade temporária, independente de sua natureza, sem que seu recebimento implique em qualquer prejuízo na contagem de seu tempo de atividade especial, o que permite a fixação da seguinte tese: O Segurado que exerce atividades em condições especiais, quando em gozo de auxílio-doença, seja acidentário ou previdenciário, faz jus ao cômputo desse mesmo período como tempo de serviço especial.
10. Recurso especial do INSS a que se nega provimento.”
(REsp 1.759.098/RS, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA SEÇÃO, j. 26/06/2019, DJe 01/08/2019, trans. em julgado 15/02/2022)
De outro giro, frise-se que o C. STF, negando seguimento ao recurso extraordinário interposto pelo INSS, definiu no RE 1.279.819, Rel. Ministro LUIZ FUX, o Tema 1107/STF: “É infraconstitucional, a ela se aplicando os efeitos da ausência de repercussão geral, a controvérsia relativa à consideração, como tempo especial, dos períodos de gozo de auxílio-doença não acidentário”, (j. 29/10/2020, publ. 10/11/2020, t. j. 05/12/2020).
Da possibilidade de reconhecimento de labor especial exercido perante o RPPS para fins de aposentação em RGPS
Ressalte-se que a identificação de quem é titular da atribuição de efetuar a averbação de tempo de trabalho em condições especiais, do trabalhador privado e público, é questão que antecede a abordagem sobre a disciplina da contagem recíproca e da compensação das contribuições entre o Regime Próprio de Previdência Social (RPPS) e o Regime Geral de Previdência Social (RGPS) para fins de aposentadoria.
O cerne do problema reside na investigação para o fim de apontar a quem cabe a obrigação de fazer consistente em averbar e certificar o exercício de tempo especial, comprovado e reconhecido como desempenhado sob o efeito de agentes nocivos na esfera pública, submetida ao RPPS, no sentido de viabilizar ao trabalhador o exercício de seu direito à contagem, linear ou convertida, para fins de posterior aposentação no RGPS.
Ressalte-se que não se cuida de discutir o direito ao reconhecimento do labor especial exercido na esfera pública, nem tampouco da conversão em comum, matéria já pacificada pelo C. Supremo Tribunal Federal (STF), mas, isto sim, de perscrutar qual é o órgão incumbido de atestar a especialidade do período na esfera pública.
Quanto ao direito ao reconhecimento do tempo especial e de sua conversão em comum, o assunto foi pacificado por força da evolução jurisprudencial.
1º) Inicialmente, foi admitida a possibilidade de reconhecimento de tempo especial laborado pelo servidor público no RPPS. O C. Supremo Tribunal Federal pacificou, no julgamento do Mandado de Injunção 721/DF, Relator Ministro MARCO AURÉLIO, considerando a ausência da edição da norma legal regulamentadora exigida pelo artigo 40. §4º, da Constituição da República (CR), (com redação anterior à EC n. 103/2019), que seria aplicável a mesma legislação que orienta o Regime Geral de Previdência Social, na forma do artigo 57, § 1º, da Lei n. 8.213, de 24/07/1991. Eis a ementa, in verbis:
MANDADO DE INJUNÇÃO - NATUREZA. Conforme disposto no inciso LXXI do artigo 5º da Constituição Federal, conceder-se-á mandado de injunção quando necessário ao exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania. Há ação mandamental e não simplesmente declaratória de omissão. A carga de declaração não é objeto da impetração, mas premissa da ordem a ser formalizada. MANDADO DE INJUNÇÃO - DECISÃO - BALIZAS. Tratando-se de processo subjetivo, a decisão possui eficácia considerada a relação jurídica nele revelada. APOSENTADORIA - TRABALHO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS - PREJUÍZO À SAÚDE DO SERVIDOR - INEXISTÊNCIA DE LEI COMPLEMENTAR - ARTIGO 40, § 4º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. Inexistente a disciplina específica da aposentadoria especial do servidor, impõe-se a adoção, via pronunciamento judicial, daquela própria aos trabalhadores em geral - artigo 57, § 1º, da Lei nº 8.213/91. (MI 721, Relator Ministro MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno, j. 30/08/2007, publ. 30/11/2007)
2º) Perpetuada a omissão legislativa a respeito da disciplina legal do artigo 40, § 4º, da CR (com redação anterior à EC n. 103/2019), tratou o C. STF, no Mandado de Injunção n. 1596, Relator Ministro TEORI ZAVASCKI, de estabelecer a impossibilidade de conversão do tempo de atividade especial trabalhado em RPPS em comum, admitindo tão somente a contagem de forma linear da atividade especial para a concessão da aposentadoria especial, nos termos da seguinte ementa:
MANDADO DE INJUNÇÃO. APOSENTADORIA ESPECIAL DE SERVIDOR PÚBLICO. ART. 40, § 4º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, APLICAÇÃO DAS NORMAS DO REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL. AGRAVO IMPROVIDO. 1. Segundo a jurisprudência do STF, a omissão legislativa na regulamentação do art. 40, § 4º, da Constituição, deve ser suprida mediante a aplicação das normas do Regime Geral de Previdência Social previstas na Lei 8.213/91 e no Decreto 3.048/99. Não se admite a conversão de períodos especiais em comuns, mas apenas a concessão da aposentadoria especial mediante a prova do exercício de atividades exercidas em condições nocivas. Ainda, a jurisprudência do STF também reconhece o direito à aposentadoria especial dos servidores públicos portadores de deficiência Fundamentos observados pela decisão agravada. 2. Agravo regimental improvido.
(MI 1596 AgR, Relator Ministro TEORI ZAVASCKI, Tribunal Pleno, j. 16/05/2013, publ. 31/05/2013)
3º) Em 09/04/2014, a Colenda Suprema Corte cristalizou o verbete da Súmula Vinculante n. 33, ratificando o que fora anteriormente disposto no Mandado de Injunção n. 721/DF:
Súmula nº 33: Aplicam-se ao servidor público, no que couber, as regras do regime geral da previdência social sobre aposentadoria especial de que trata o artigo 40, § 4º, inciso III da Constituição Federal, até a edição de lei complementar específica.
4º) Revisitando o assunto, no julgamento da Repercussão Geral no RE 1.014.286/SP, Relator para o acórdão Ministro EDSON FACHIN, o E. STF cristalizou o entendimento no sentido de admitir, não somente a aposentadoria especial, mas, inclusive, permitir a conversão do tempo especial em comum para fins de concessão de outros benefícios previdenciários, definindo a tese do Tema 942/STF, nos seguintes termos:
"Até a edição da Emenda Constitucional nº 103/2019, o direito à conversão, em tempo comum, do prestado sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física de servidor público decorre da previsão de adoção de requisitos e critérios diferenciados para a jubilação daquele enquadrado na hipótese prevista no então vigente inciso III do § 4º do art. 40 da Constituição da República, devendo ser aplicadas as normas do regime geral de previdência social relativas à aposentadoria especial contidas na Lei 8.213/1991 para viabilizar sua concretização enquanto não sobrevier lei complementar disciplinadora da matéria. Após a vigência da EC n.º 103/2019, o direito à conversão em tempo comum, do prestado sob condições especiais pelos servidores obedecerá à legislação complementar dos entes federados, nos termos da competência conferida pelo art. 40, § 4º-C, da Constituição da República"
Eis a ementa do v. acórdão:
RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. APOSENTADORIA ESPECIAL DE SERVIDOR PÚBLICO.ARTIGO 40, § 4º, III, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. PEDIDO DE AVERBAÇÃO DE TEMPO DE SERVIÇO PRESTADO EM ATIVIDADES EXERCIDAS SOB CONDIÇÕES ESPECIAIS QUE PREJUDIQUEM A SAÚDE OU A INTEGRIDADE FÍSICA DO SERVIDOR, COM CONVERSÃO DO TEMPO ESPECIAL EM COMUM, MEDIANTE CONTAGEM DIFERENCIADA, PARA OBTENÇÃO DE OUTROS BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS. POSSIBILIDADE ATÉ A EDIÇÃO DA EMENDA CONSTITUCIONAL N.º 103/2019. DIREITO INTERTEMPORAL. APÓS A EDIÇÃO DA EC 103/2019, O DIREITO À CONVERSÃO OBEDECERÁ À LEGISLAÇÃO COMPLEMENTAR DOS ENTES FEDERADOS. COMPETÊNCIA LEGISLATIVA CONFERIDA PELO ART. 40, § 4º-C DA CRFB.
1. A Constituição impõe a construção de critérios diferenciados para o cômputo do tempo de serviço em condições de prejuízo à saúde ou à integridade física, conforme permite verificar a interpretação sistemática e teleológica do art. 40, § 4°, CRFB.
2. Desde a edição das Emendas Constitucionais 20/1998 e 47/2005, não há mais dúvida acerca da efetiva existência do direito constitucional daqueles que laboraram em condições especiais à submissão a requisitos e critérios diferenciados para alcançar a aposentadoria. Nesse sentido é a orientação desta Suprema Corte, cristalizada no verbete de n.º 33 da Súmula da Jurisprudência Vinculante: “Aplicam-se ao servidor público, no que couber, as regras do regime geral da previdência social sobre aposentadoria especial de que trata o artigo 40, § 4º, inciso III da Constituição Federal, até a edição de lei complementar específica.”
3. Ao permitir a norma constitucional a aposentadoria especial com tempo reduzido de contribuição, verifica-se que reconhece os danos impostos a quem laborou em parte ou na integralidade de sua vida contributiva sob condições nocivas, de modo que nesse contexto o fator de conversão do tempo especial em comum opera como preceito de isonomia, equilibrando a compensação pelos riscos impostos. A conversão surge, destarte, como consectário lógico da isonomia na proteção dos trabalhadores expostos a agentes nocivos.
4. Após a EC 103/2019, o § 4º-C do art. 40 da Constituição, passou a dispor que o ente federado poderá estabelecer por lei complementaridade e tempo de contribuição diferenciados para aposentadoria de servidores cujas atividades sejam exercidas com efetiva exposição a agentes químicos, físicos e biológicos prejudiciais à saúde, ou associação desses agentes, vedada a caracterização por categoria profissional ou ocupação. Não há vedação expressa ao direito à conversão do tempo comum em especial, que poderá ser disposta em normativa local pelos entes federados, tal como operou a legislação federal em relação aos filiados ao RGPS, nos termos do art. 57, da Lei 8213/91.
5. Recurso extraordinário desprovido, com fixação da seguinte tese:“Até a edição da Emenda Constitucional nº 103/2019, o direito à conversão, em tempo comum, do prestado sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física de servidor público decorre da previsão de adoção de requisitos e critérios diferenciados para a jubilação daquele enquadrado na hipótese prevista no então vigente inciso III do § 4º do art. 40 da Constituição da República, devendo ser aplicadas as normas do regime geral de previdência social relativas à aposentadoria especial contidas na Lei 8.213/1991 para viabilizar sua concretização enquanto não sobrevier lei complementar disciplinadora da matéria. Após a vigência da EC n.º 103/2019, o direito à conversão em tempo comum, do prestado sob condições especiais pelos servidores obedecerá à legislação complementar dos entes federados, nos termos da competência conferida pelo art. 40, § 4º-C, da Constituição da República.
(RE 1014286, Relator p/ Acórdão Ministro EDSON FACHIN, Tribunal Pleno, j. 31/08/2020, Processo Eletrônico Repercussão Geral – Mérito, publ. 24/09/2020)
Por fim, o C. STF manifestou-se em sede de embargos de declaração para esclarecer que “a análise dos pressupostos para a obtenção de benefícios previdenciários, em que se discutem questões fáticas e dependam de interpretação de legislação infraconstitucional, não compete a esta Suprema Corte. Tal análise caberá aos órgãos administrativos e judiciais competentes, em cada caso”, (RE 1014286 ED, Relator Ministro EDSON FACHIN, Tribunal Pleno, j. 17/05/2021, publ. 09/06/2021).
Nessa senda foi o entendimento da Turma Nacional de Uniformização, ao decidir o Tema 278/TNU: “I - O(A) segurado(a) que trabalhava sob condições especiais e passou, sob qualquer condição, para regime previdenciário diverso, tem direito à expedição de certidão desse tempo identificado como especial, discriminado de data a data, ficando a conversão em comum e a contagem recíproca à critério do regime de destino, nos termos do art. 96, IX, da Lei n.º 8.213/1991; II - Na contagem recíproca entre o Regime Geral da Previdência Social - RGPS e o Regime Próprio da União, é possível a conversão de tempo especial em comum, cumprido até o advento da EC n.º 103/2019”.
Esse escorço jurisprudencial tem por fito apenas demonstrar que não se cuida aqui de impedir o reconhecimento do tempo especial ou a conversão do respectivo interregno, porquanto, nos termos da ratio decidendi do Tema 942/STF, até a edição da EC n. 103/2019 não havia quaisquer impedimentos à aplicação, aos servidores públicos, das regras do RGPS para a conversão do período de trabalho em condições nocivas à saúde ou à integridade física em tempo de atividade comum.
Trata-se aqui, portanto, de perscrutar a quem compete a obrigação de fazer consistente no reconhecimento do tempo especial.
Da questão relativa à legitimidade passiva do INSS
Anote-se que a questão da legitimidade passiva será abordada segundo a teoria da asserção, que está em conformidade com a jurisprudência majoritária do Colendo STJ, e preconiza a aferição das condições da ação segundo a exposição dos fatos na petição inicial, permitindo, a partir de um exame abstrato, perscrutar se o réu é o sujeito responsável pela violação do direito material da parte autora.
Sobre o assunto:
AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL - AÇÃO CONDENATÓRIA - DECISÃO MONOCRÁTICA QUE NEGOU PROVIMENTO AO RECLAMO. INSURGÊNCIA DA REQUERIDA.
1. Segundo a jurisprudência desta Corte, as condições da ação são averiguadas de acordo com a teoria da asserção, razão pela qual, para que se reconheça a legitimidade passiva 'ad causam', os argumentos aduzidos na inicial devem possibilitar a inferência, em um exame puramente abstrato, de que o réu pode ser o sujeito responsável pela violação do direito subjetivo do autor. Precedentes. (...).
(AgInt no AREsp n. 1.230.412/SP, relator Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, julgado em 19/11/2019, DJe de 22/11/2019.)
Ainda nesse sentido: AgInt no AREsp n. 1.710.782/SP, relator Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, j. 8/3/2021; AgInt no AgInt no AREsp n. 1.302.429/RJ, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, j. 24/8/2020; AgInt no REsp n. 1.710.937/DF, relator Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, j. 14/10/2019; REsp n. 1.733.387/SP, relatora Ministra NANCY ANDRIGHI, Terceira Turma, j. 15/5/2018; REsp n. 1.395.875/PE, relator Ministro HERMAN BENJAMIN, Segunda Turma, j. 20/2/2014; REsp n. 1.157.383/RS, relatora Ministra NANCY ANDRIGHI, Terceira Turma, j. 14/8/2012.
Sob esse enfoque resulta que a prolação do decisum acerca da presença, ou não, da legitimidade passiva do INSS tem caráter processual, vez que não implica adentrar à análise do mérito relativamente ao direito material acerca da efetiva averbação e certificação, nem tampouco quanto à conversão do tempo especial em comum, conforme assegurado pelo C. STF, mas, tão somente, examina de quem é a atribuição de conferir as provas do exercício do labor especial para fins de averbação e certificação.
Ainda que assim não fosse, no tocante aos períodos de labor que se quer computar como especial, o processo deve ser extinto sem resolução de mérito, nos termos dos artigos 485, IV, e 320 do Código de Processo Civil, em conformidade com a tese firmada pelo E. Superior Tribunal de Justiça no julgamento do REsp 1.352.721/SP, relativo ao Tema 629/STJ dos recursos repetitivos, no sentido de que “A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa” (REsp 1352721/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, CORTE ESPECIAL, julgado em 16/12/2015, DJe 28/04/2016).
Frise-se que a E. Corte Superior já decidiu que o alcance da tese do Tema 629/STJ não se limita às demandas relativas ao labor rural, conforme se depreende in verbis:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DECISÃO QUE ACOLHE A PRETENSÃO DO SEGURADO PARA RECONHECER A POSSIBILIDADE DE AJUIZAMENTO DE NOVA AÇÃO. AGRAVO INTERNO QUE SE LIMITA A DEFENDER A IMPOSSIBILIDADE DE RECONHECIMENTO DA ATIVIDADE ESPECIAL. RAZÕES RECURSAIS DISSOCIADAS DA REALIDADE DOS AUTOS. INCIDÊNCIA DAS SÚMULAS 283 E 284/STF. AGRAVO INTERNO DO INSS A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
(...)
4. Ademais, cabe esclarecer que, ao contrário do que afirma o INSS, o entendimento firmado no REsp. 1.352.721/SP, julgado em sede de recurso repetitivo pela Corte Especial do STJ, fixa parâmetro para o julgamento de qualquer ação previdenciária, não se podendo restringir seu alcance a lides de trabalhadores rurais.
5. Agravo Interno do INSS a que se nega provimento.
(AgInt no AgInt no AREsp 1538872/PR, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 26/10/2020, DJe 12/11/2020)
A verificação do titular da atribuição é crucial quando o objeto da lide proposta tem por escopo o exercício do direito ao cumprimento de obrigação de fazer, caracterizada pela omissão do órgão público, por ter deixado de averbar o tempo respectivo no prontuário do autor da ação, e de certificá-lo para fins de contagem do interregno como especial. Essa circunstância define a condição da ação consistente na legitimidade passiva do réu, que deve figurar no polo passivo da lide porque deixou de exercer o seu múnus público.
É verdade que, antes de a C. Corte Suprema assegurar o reconhecimento do tempo especial laborado pelos servidores públicos, não tinha lugar a discussão sobre as obrigações de averbar e certificar o eventual labor especial, porquanto os órgãos públicos simplesmente anotavam nas certidões o tempo comum sob o RPPS.
Com efeito, o trabalhador que migrou do RPPS para o RGPS enfrenta um impasse no momento da aposentação, pois ao pretender a contagem do tempo de trabalho especial laborado no regime público, que não fora averbado ou certificado, porquanto o reconhecimento nem sequer era admitido antes de o C. STF pacificar esse direito, vê-se premido do cômputo do respectivo período.
Assim, passou a vir à baila o problema a respeito de identificar a quem compete a obrigação de certificar o tempo especial público para fins de contagem no RGPS: se ao órgão público ao qual era vinculado o segurado ou ao INSS.
Trata-se de indagar tanto na esfera administrativa quanto na judicial a respeito da atribuição de analisar documentos pertinentes ao cumprimento dos requisitos normativos, tais como formulários, PPPs e laudos técnicos, que demonstrem o exercício de labor mediante submissão aos agentes insalubres na atividade desenvolvida perante o RPPS.
Assim, na hipótese de não se mostrar hígida a existência de vínculo jurídico entre o INSS e a parte autora, capaz de obrigar a Autarquia Previdenciária a se debruçar sobre o exame da natureza do trabalho sob o RPPS, se comum ou especial, é mister a extinção do feito sem julgamento de mérito, oportunizando ao segurado a possibilidade de buscar o reconhecimento de seu eventual direito à contagem de tempo especial mediante o iter legal cabível.
Pois bem. Preceitua a norma do artigo 12 da Lei n. 8.213, de 24/07/1991, que são excluídos do Regime Geral de Previdência Social os servidores civis e militares sujeitos a sistema próprio de previdência:
"Art. 12. O servidor civil ou militar da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios, bem como o das respectivas autarquias e fundações, é excluído do Regime Geral de Previdência Social consubstanciado nesta lei, desde que esteja sujeito a sistema próprio de previdência social.
Parágrafo único. Caso este servidor venha a exercer, concomitantemente, uma ou mais atividades abrangidas pelo Regime Geral de Previdência Social, tornar-se-á segurado obrigatório em relação a essas atividades."
Assim, o servidor público dos entes federativos, ocupante de cargo efetivo, bem como o das respectivas autarquias e fundações, quando amparado por Regime Próprio de Previdência Social (RPPS), fica excluído do Regime Geral de Previdência Social (RGPS).
Evidencia-se, desde logo, que não cabe ao INSS realizar o reconhecimento de sua natureza especial do labor sob o RPPS, porquanto essa tarefa compete ao ente para o qual trabalhou o servidor, o qual deverá expedir a respectiva CTC.
Com efeito, somente incumbe ao INSS o lançamento de tempo de serviço especial, o seu enquadramento e a respectiva conversão em tempo comum relativamente ao interregno trabalhado sob as regras da CLT, vinculado ao Regime Geral de Previdência Social, inclusive com o dever de expedir certidão de tempo de serviço.
Eis as principais normas a respeito da expedição da CTC:
a) Lei n. 8.213, de 24/07/1991, artigo 96:
"Art. 96. O tempo de contribuição ou de serviço de que trata esta Seção será contado de acordo com a legislação pertinente, observadas as normas seguintes:
I - não será admitida a contagem em dobro ou em outras condições especiais;
II - é vedada a contagem de tempo de serviço público com o de atividade privada, quando concomitantes;
III - não será contado por um sistema o tempo de serviço utilizado para concessão de aposentadoria pelo outro;
IV - o tempo de serviço anterior ou posterior à obrigatoriedade de filiação à Previdência Social só será contado mediante indenização da contribuição correspondente ao período respectivo, com acréscimo de juros moratórios de zero vírgula cinco por cento ao mês, capitalizados anualmente, e multa de dez por cento. (Redação dada pela Medida Provisória nº 2.187-13, de 2001) (Vide Medida Provisória nº 316, de 2006)
V - é vedada a emissão de Certidão de Tempo de Contribuição (CTC) com o registro exclusivo de tempo de serviço, sem a comprovação de contribuição efetiva, exceto para o segurado empregado, empregado doméstico, trabalhador avulso e, a partir de 1º de abril de 2003, para o contribuinte individual que presta serviço a empresa obrigada a arrecadar a contribuição a seu cargo, observado o disposto no § 5º do art. 4º da Lei nº 10.666, de 8 de maio de 2003; (Incluído pela Lei nº 13.846, de 2019)
VI - a CTC somente poderá ser emitida por regime próprio de previdência social para ex-servidor; (Incluído pela Lei nº 13.846, de 2019)
VII - é vedada a contagem recíproca de tempo de contribuição do RGPS por regime próprio de previdência social sem a emissão da CTC correspondente, ainda que o tempo de contribuição referente ao RGPS tenha sido prestado pelo servidor público ao próprio ente instituidor; (Incluído pela Lei nº 13.846, de 2019)
VIII - é vedada a desaverbação de tempo em regime próprio de previdência social quando o tempo averbado tiver gerado a concessão de vantagens remuneratórias ao servidor público em atividade; e (Incluído pela Lei nº 13.846, de 2019)
IX - para fins de elegibilidade às aposentadorias especiais referidas no § 4º do art. 40 e no § 1º do art. 201 da Constituição Federal, os períodos reconhecidos pelo regime previdenciário de origem como de tempo especial, sem conversão em tempo comum, deverão estar incluídos nos períodos de contribuição compreendidos na CTC e discriminados de data a data. (Incluído pela Lei nº 13.846, de 2019)
b) Decreto n. 3.048, de 06/05/1999, artigos 125, §1º, inciso I, e 127, inciso VI:
"Art. 125. Para efeito de contagem recíproca, hipótese em que os diferentes sistemas de previdência social ou proteção social se compensarão financeiramente, fica assegurado: (Redação dada pelo Decreto nº 10.410, de 2020)
I - o cômputo do tempo de contribuição na administração pública e de serviço militar exercido nas atividades de que tratam os art. 42, art. 142 e art. 143 da Constituição, para fins de concessão de benefícios previstos no RGPS, inclusive de aposentadoria em decorrência de tratado, convenção ou acordo internacional; e (Redação dada pelo Decreto nº 10.410, de 2020)
(...)
§ 1º Para os fins deste artigo, é vedada: (Redação dada pelo Decreto nº 8.145, de 2013)"
I - conversão do tempo de contribuição exercido em atividade sujeita à condições especiais, nos termos do disposto no art. 66; (Redação dada pelo Decreto nº 10.410, de 2020)
(...)
Art. 127. O tempo de contribuição de que trata este Capítulo será contado de acordo com a legislação pertinente, observadas as seguintes normas:
(...)
VI - para ex-servidor público, a certidão de tempo de contribuição somente poderá ser emitida por regime próprio de previdência social; (Incluído pelo Decreto nº 10.410, de 2020)”.
Art. 130. O tempo de contribuição para regime próprio de previdência social ou para Regime Geral de Previdência Social deve ser provado com certidão fornecida: (Redação dada pelo Decreto nº 6.722, de 2008).
I - pela unidade gestora do regime próprio de previdência social ou pelo setor competente da administração federal, estadual, do Distrito Federal e municipal, suas autarquias e fundações, desde que devidamente homologada pela unidade gestora do regime próprio, relativamente ao tempo de contribuição para o respectivo regime próprio de previdência social; ou (Redação dada pelo Decreto nº 6.722, de 2008).
II - pelo setor competente do Instituto Nacional do Seguro Social, relativamente ao tempo de contribuição para o Regime Geral de Previdência Social. (Redação dada pelo Decreto nº 3.668, de 2000)
c) a Instrução Normativa PRES/INSS n. 128, de 28/03/2022, artigos 70, 213, § 1º; 511 a 513 e 515:
Art. 70. Observado o art. 130 do RPS, o aproveitamento no RGPS do tempo de contribuição durante o qual o agente público federal, estadual, distrital ou municipal, foi vinculado a RPPS, na forma de contagem recíproca de que trata a Lei nº 6.226, de 14 de julho de 1975, será feito mediante a apresentação da Certidão de Tempo de Contribuição - CTC, conforme Anexo XV, que deverá estar acompanhada da "Relação das Remunerações de Contribuições por competências", conforme Anexo XXIII, caso compreenda período posterior à competência junho de 1994, sendo que, para fins de emissão desses documentos, o ente federativo deverá observar os requisitos e adotar os padrões previstos pela Portaria MPS nº 154, de 15 de maio de 2008.
(...)
Art. 213. A CTC oriunda de outros regimes de previdência, emitida a partir de 16 de maio de 2008, data da publicação da Portaria MPS nº 154, de 2008, somente poderá ser aceita para fins de contagem recíproca no RGPS, se for emitida na forma do modelo de "Certidão de Tempo de Contribuição", constante no Anexo XV.
§ 1º A CTC somente poderá ser emitida por RPPS para ex-servidor.
(...)
Art. 511. A Certidão de Tempo de Contribuição - CTC emitida pelo INSS é o instrumento que permite que o tempo de contribuição vertido para o RGPS seja aproveitado por Regimes Próprios de Previdência Social - RPPSs ou Regimes de Previdência Militar, para fins de contagem recíproca.
§ 1º A CTC deverá ser única, devendo nela constar os períodos de efetiva contribuição ao RGPS, de forma integral, e os respectivos salários de contribuição a partir de 1º de julho de 1994.
§ 2º Para a expedição da CTC, não será exigido que o segurado se desvincule de suas atividades abrangidas pelo RGPS.
Art. 512. A CTC só poderá ser emitida para períodos de contribuição vinculados ao RGPS.
§ 1º Para requerimentos de CTC posteriores a 18 de janeiro de 2019, início da vigência da Medida Provisória nº 871, deverão ser certificados os períodos de emprego público celetista, com filiação à Previdência Social Urbana, inclusive nas situações de averbação automática.
§ 2º Para fins de aplicação do § 1º, o período averbado automaticamente, bem como o tempo de contribuição ao RGPS concomitante a este período, deverá ter a sua destinação expressa na CTC, vinculada ao órgão público que efetuou a averbação, exceto se a averbação automática não tiver gerado qualquer direito ou vantagem, situação em que a CTC poderá ter destinação diversa.
§ 3º Considera-se averbação automática o tempo de contribuição vinculado ao RGPS prestado pelo servidor público, que teve a apresentação da CTC dispensada pelo INSS para fins de realização da compensação financeira, nas seguintes hipóteses:
I - período averbado no próprio ente em que foi prestado o serviço, decorrente da criação do Regime Jurídico Único, em obediência ao disposto no art. 39 da Constituição Federal de 1988; e
II - no caso dos servidores estaduais, municipais ou distritais, período averbado no próprio ente em que foi prestado o serviço quando da transformação do Regime de Previdência em RPPS.
§ 4º Não devem ser considerados como averbação automática os períodos averbados a partir de 18 de janeiro de 2019.
§ 5º Para CTCs emitidas anteriormente a 18 de janeiro de 2019, não cabe revisão para inclusão de períodos objetos de averbação automática, incluindo os períodos concomitantes a este.
Art. 513. É vedada emissão de CTC para fins de contagem de recíproca:
I - com conversão de tempo de contribuição exercido em atividade sujeita a condições especiais;
(...)
Art. 515. Quando for solicitada CTC com identificação do tempo de serviço prestado em condições perigosas ou insalubres, será realizada a análise de mérito da atividade cujo reconhecimento é pretendido como atividade especial.
Parágrafo único. Os períodos reconhecidos pelo INSS como de tempo de atividade exercida em condições especiais deverão ser incluídos na CTC e discriminados de data a data, sem conversão em tempo comum.
d) Portaria INSS n. 154, de 15/05/2008, artigo 2º:
Art. 2º O tempo de contribuição para Regime Próprio de Previdência Social – RPPS deverá ser provado com CTC fornecida pela unidade gestora do RPPS ou, excepcionalmente, pelo órgão de origem do servidor, desde que devidamente homologada pela respectiva unidade gestora do RPPS.
§ 1º O ente federativo expedirá a CTC mediante requerimento formal do interessado, no
qual esclarecerá o fim e a razão do pedido.
A partir da interpretação sistemática e teleológica do referido conjunto normativo, é de rigor concluir que a expedição de CTC pelo INSS somente diz respeito ao labor comum ou especial no RGPS, competindo ao respectivo órgão público a expedição de CTC indicativa do tempo de labor comum ou especial sob o RPPS.
Assim, não está dentre as atribuições da Autarquia Previdenciária proceder à aferição das condições nas quais o trabalho foi exercido no RPPS, especialmente quanto ao exame da submissão a agentes nocivos para fins de reconhecimento da especialidade, ainda que as provas lhe tenham sido apresentadas em sede administrativa, porquanto esse exame deve ser realizado pelo respectivo órgão público do RPPS, que, após concluir pela existência do tempo especial, deverá incluir o período na CTC, fazendo constar data a data, em observância ao inciso IX do artigo 96 da Lei n. 8.213, de 24/07/1991.
Acrescente-se que, embora a CTC no RGPS possa ser expedida sem desligamento do empregado da relação de trabalho, no RPPS a certidão somente será expedida para ex-servidor, ou seja, desde que tenha ocorrido a exoneração ou a demissão do cargo efetivo, na forma do inciso VI da Lei n. 8.213, de 24/07/1991, com redaçãoda MP n. 871, de 18/01/2019, convertida na Lei n. 13.849, de 18/06/ 2019.
Em síntese, a CTC deve ser emitida pelo regime de previdência sob o qual foi exercido o labor especial.
Nesse sentido, é o entendimento desta C. Décima Turma:
PROCESSO CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. REMESSA OFICIAL TIDA POR INTERPOSTA. ATIVIDADE ESPECIAL. ILEGITIMIDADE PASSIVA DO INSS EM RELAÇÃO À PARTE DO PERÍODO QUE SE PRETENDE VER RECONHECIDO. COMPROVAÇÃO DA ESPECIALIDADE. JULGAMENTO “ULTRA PETITA”. PREENCHIDOS OS REQUISITOS, SEM APLICAÇÃO DO FATOR PREVIDENCIÁRIO, NA DATA DA CITAÇÃO. REAFIRMAÇÃO DA DER.
(...)
II - Ilegitimidade passiva ad causam do INSS, reconhecida em relação ao pedido de reconhecimento da especialidade do período de 01.09.1991 a 30.06.1999, no qual o autor trabalhou para a Prefeitura Municipal de Lutécia/SP e esteve vinculada ao RPPS.
XVII - Apelação do réu improvida e remessa oficial tida por interposta parcialmente provida.
(TRF 3ª Região, 10ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5290274-91.2020.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal OTAVIO HENRIQUE MARTINS PORT, julgado em 14/09/2022, DJEN DATA: 16/09/2022)
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. AGRAVO INTERNO. E APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. POLICIAL MILITAR. REGIME PRÓPRIO DE PREVIDÊNCIA SOCIAL. ILEGITIMIDADE PASSIVA DO INSS. VIGILANTE. ARMA DE FOGO. JULGAMENTO DO TEMA 1031 PELO STJ. PRÉVIA FONTE DE CUSTEIO. EXPOSIÇÃO A RUÍDO E À TENSÃO ELÉTRICA. NÍVEIS ABAIXO DOS LIMITES LEGAIS. BENEFÍCIO DA JUSTIÇA GRATUITA. REVOGAÇÃO.
I - A jurisprudência dessa E. Corte entende que o INSS não tem legitimidade passiva para reconhecimento de atividade especial em que o segurado esteve submetido a Regime Próprio de Previdência Social, ainda que o intuito seja viabilizar a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição junto ao RGPS.
(...) XII - Agravos internos (art. 1.021, CPC) interpostos pelas partes improvidos.
(TRF 3ª Região, 10ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5007232-38.2017.4.03.6183, Rel. Desembargador Federal RAPHAEL JOSÉ DE OLIVEIRA SILVA, j. 02/12/2021, Intim. 03/12/2021)
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. AGRAVO INTERNO. IMPUGNAÇÃO À DECISÃO MONOCRÁTICA. PRELIMINAR REJEITADA. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. REGIME PRÓPRIO DE PREVIDÊNCIA SOCIAL. RECONHECIMENTO DE ATIVIDADE ESPECIAL. ILEGITIMIDADE PASSIVA DO INSS. VIGILANTE. ARMA DE FOGO. COMPROVAÇÃO. JULGAMENTO DO TEMA 1031 PELO STJ. PRÉVIA FONTE DE CUSTEIO.
(...)
III - A jurisprudência desta E. Corte tem firmado entendimento no sentido de que o INSS não tem legitimidade passiva para reconhecimento da especialidade do período em que o segurado esteve submetido a Regime Próprio de Previdência Social, com intuito de viabilizar a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição junto ao RGPS.
IV - Mantidos os termos da decisão agravada que reconheceu a ilegitimidade passiva ad causam do INSS, com relação ao pedido de reconhecimento da especialidade do período de 15.07.1991 a 24.01.2006, no qual o autor trabalhou para a Polícia Militar do Estado de São Paulo e esteve vinculado ao RPPS, conforme certidões juntadas aos autos.
(...) IX - Preliminar rejeitada. No mérito, agravos internos (art. 1.021, CPC) interpostos pelas partes improvidos.
(TRF 3ª Região, 10ª Turma, ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA - 6164167-19.2019.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal SERGIO DO NASCIMENTO, j. 14/09/2021, Intim. 17/09/2021)
No mesmo sentido:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. RECONHECIMENTO DE ATIVIDADE ESPECIAL EXERCIDA NO RPPS. IMPOSSIBILIDADE. NÃO PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS PARA A APOSENTAÇÃO. VERBA HONORÁRIA.
(...)
- Configurada a ilegitimidade passiva do INSS no tocante ao reconhecimento da especialidade dos lapsos de 25.07.1983 a 31.01.1984, de 12.08.1987 a 01.05.1991 e de 19.09.1991 a 27.11.2015, quando o autor laborou vinculado ao Comando da Marinha, à Secretaria de Segurança Pública e à Polícia Militar, uma vez que, conforme documentos carreados, o trabalho supostamente exercido sob condições especiais não ocorreu sob as normas do Regime Geral da Previdência Social, mas sob as regras do Regime Próprio de Previdência do Serviço Público Federal/Estadual, impondo-se, de ofício, a extinção do processo, sem resolução do mérito, quanto à pretensão relativa ao período retro mencionado, ex vi do art. 485, VI, do CPC/2015, à falta de pressuposto de existência da relação processual.
(...)- Apelação da parte autora improvida.
(TRF 3ª Região, 9ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5001804-56.2020.4.03.6123, Rel. Desembargador Federal GILBERTO RODRIGUES JORDAN, j.15/09/2022, DJEN 21/09/2022)
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ILEGITIMIDADE PASSIVA DO INSS. EXTINÇÃO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO. RECONHECIMENTO PARCIAL DE ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTES QUÍMICOS. NÃO PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DA APOSENTADORIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
- Configurada a ilegitimidade passiva do INSS no tocante ao reconhecimento da especialidade do período de trabalho que ocorreu sob as normas de Regime Próprio de Previdência Social, impondo-se, de ofício, a extinção do processo, sem resolução do mérito, quanto à pretensão relativa ao referido período, ex vi do art. 485, VI, do CPC/2015, à falta de pressuposto de existência da relação processual.
(...)
- Extinção do processo, sem resolução do mérito, quanto ao pedido de reconhecimento da especialidade do período de 15/04/1982 a 02/09/1986. Apelação da Autarquia Federal parcialmente provida.
(TRF 3ª Região, AC nº 5266375-64.2020.4.03.9999, Nona Turma, Rel. Desembargador Federal GILBERTO JORDAN, e-DJF3: 14/10/2020)
PREVIDENCIÁRIO. REMESSA NECESSÁRIA. APELAÇÃO. ILEGITIMIDADE PASSIVA RECONHECIDA DE OFÍCIO. EXTINÇÃO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. COMPROVAÇÃO DAS CONDIÇÕES ESPECIAIS. FUNÇÃO DE VIGIA. IMPLEMENTAÇÃO DOS REQUISITOS. DIB. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. MANUAL DE CÁLCULOS NA JUSTIÇA FEDERAL E LEI Nº 11.960/2009. HONORÁRIOS DE ADVOGADO. CUSTAS. JUSTIÇA ESTADUAL.
1. Regime próprio de previdência - para o reconhecimento das atividades especiais do servidor, a ação deve ser proposta contra o ente público que arcará com o benefício de aposentadoria ou, em casos como o presente, em que se pleiteia a contagem recíproca, que arcará com a indenização ao órgão concessor, inclusive do tempo ficto.
2. Extinção da ação, sem resolução de mérito, pela ilegitimidade passiva ad causam do INSS relativamente ao reconhecimento das atividades especiais exercidas junto à autarquia estadual, sujeita ao regime próprio de previdência.
(...) 13. Ilegitimidade passiva reconhecida de ofício, com a extinção do processo sem resolução de mérito. Sentença corrigida de ofício. Preliminar de conhecimento da remessa necessária não conhecida. Apelação do INSS não provida. Remessa necessária provida em parte.
(TRF 3ª Região, AC nº 0021987-92.2013.4.03.9999/SP, Sétima Turma, Desembargador Federal PAULO DOMINGUES, e-DJF3: 13/02/2019).
Apresentado panorama legal, passemos ao exame do acervo fático-probatório produzido nos autos.
Do caso concreto
Trata-se de ação previdenciária objetivando o reconhecimento de tempo de atividade em condições especiais e a revisão da RMI do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição concedido na esfera administrativa.
A r. sentença findou-se parcialmente procedente para reconhecer a especialidade laborativa no período de 21/01/1991 a 30/04/1993 e condenar a Autarquia Previdenciária à revisão da RMI do benefício.
A parte autora requer o reconhecimento da especialidade do período pleiteado na exordial, qual seja, de 21/01/1991 a 11/06/2018.
O INSS, por sua vez, requer o afastamento do tempo trabalhado em condições especiais no período de 20/01/1991 a 30/04/1993.
A princípio, observa-se que o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição que a parte autora pretende revisar (NB 184621158-9) teve início (DIB) na data do requerimento administrativo (DER), em 13/10/2017 (ID 152851438), de modo que devem ser analisados os períodos até a referida data.
Quanto aos períodos em discussão, acerca dos quais se litiga a respeito do reconhecimento da atividade como especial, estão assim detalhados:
Período: 21/01/1991 a 30/04/1993
Empregador: Prefeitura Municipal de Piedade
Função: Agente de Saúde
Setor: Assistência Médica
Prova: PPP (ID 152851441 - Págs. 35/36)
Enquadramento/Norma: Especial - Exposição habitual e permanente a agentes biológicos (bactérias, fungos, vírus, parasitas e bacilos) – item 1.3.2 do Decreto n. 53.831/1964, item 1.3.4 do Decreto n. 83.080/1979.
Período: 01/05/1993 a 30/06/1999
Empregador: Prefeitura Municipal de Piedade
Ilegitimidade passiva do INSS para reconhecimento da especialidade no período, conforme certidão expedida pela referida Municipalidade (ID 152851441 - Pág. 32), dando conta de que no mencionado período a parte autora exerceu sua função em Regime Jurídico Estatutário, Lei Municipal n. 3.112/1999, filiado ao Regime Próprio de Previdência.
Período: 01/07/1999 a 13/10/2017
Empregador: Prefeitura Municipal de Piedade
Função: Agente de Saúde (01/07/1999 a 15/03/2006) e Auxiliar de Enfermagem (16/03/2006 a 13/10/2017)
Setor: Assistência Médica (01/07/1999 a 15/03/2006) e Secretaria de Saúde (16/03/2006 a 13/10/2017)
Prova: PPP (ID 152851441 - Págs. 35/36)
Enquadramento/Norma: Especial - Exposição habitual e permanente a agentes biológicos (bactérias, fungos, vírus, parasitas e bacilos) – itens 3.0.1 dos Decretos 2.172/1997, 3.048/1999 e 4.882/2003.
Frise-se que as provas carreadas aos autos foram elaboradas por profissionais legalmente habilitados e têm presunção de veracidade, sobretudo quando o PPP não for impugnado em sede administrativa, nem tampouco exigidos outros documentos complementares, conforme o artigo 281, § 5º, da IN INSS n. 128, de 28/03/2022. Ademais, é atribuição da empresa a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, mediante formulário na forma estabelecida pelo INSS, na forma do artigo 58, § 1º, da LBPS, razão por que compete à Autarquia Previdenciária realizar todos os atos e procedimentos necessários à verificação do atendimento das obrigações impostas pela legislação previdenciária, e a imposição da multa por seu eventual descumprimento, por força do artigo 125-A da Lei n. 8.213, de 24/07/1991, incluído pela Lei n. 11.941, de 27/05/2009.
No que concerne às anotações sobre a utilização de Equipamento de Proteção Individual (EPI) eficaz, as informações do PPP não são idôneas para descaracterizar a natureza especial do labor, porquanto não há dados sobre a real eficácia do EPI, nem tampouco provas de que o tipo de equipamento utilizado foi realmente suficiente para eliminar ou mitigar a nocividade dos agentes nocivos descritos. Ademais, como assentado pelo C. STF no Tema 555/STF, na hipótese de dúvida ou divergência é de rigor o reconhecimento da especialidade do trabalho.
Dessa forma, considerando o conjunto probatório dos autos, é de rigor o reconhecimento da atividade especial, exercida sob condições nocivas à saúde ou à integridade física do segurado, nos períodos de 21/01/1991 a 30/04/1993 e 01/07/1999 a 13/10/2017.
Diante dos períodos especiais ora reconhecidos, convertidos para tempo comum pelo fator de conversão 1,20, somados aos demais interregnos de labor comum apontados na CTPS e no relatório CNIS, perfaz a parte autora, na data do requerimento administrativo (DER), em 13/10/2017, o total de 34 anos, 8 meses e 25 dias de tempo de contribuição, fazendo jus à revisão da RMI do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição concedido na esfera administrativa.
Quanto ao termo inicial dos efeitos financeiros da revisão, a parte autora buscou obter a revisão do benefício previdenciário perante a Autarquia Previdenciária, verificando-se das provas dos autos que apresentou na data do requerimento administrativo (DER), em 13/10/2017, toda a documentação necessária para a comprovação do labor, inclusive em condições especiais, não havendo que se cogitar de aplicação da questão submetida ao crivo do C. STJ no exame do Tema 1124/STJ.
As prestações vencidas deverão ser corrigidas monetariamente e acrescidas de juros de mora.
Ajuizada a presente ação em junho/2019, decorridos menos de cinco anos da data do deferimento administrativo, em 12/06/2018 (ID 152851438), inocorrente, in casu, a prescrição quinquenal.
Atente-se que os valores pagos, na via administrativa ou por força de decisão judicial, a título de benefícios inacumuláveis no período, deverão ser integralmente abatidos do débito.
Finalmente, quanto ao eventual prequestionamento suscitado, assinalo não haver qualquer infringência à legislação federal ou a dispositivos constitucionais.
Consectários legais
A correção monetária e os juros de mora incidirão conforme a legislação de regência, observando-se os critérios preconizados pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, que refere a aplicação da EC n. 113/2021.
Ainda quanto aos juros, destaque-se que são devidos até a data da expedição do ofício precatório ou da requisição de pequeno valor (RPV), conforme o Tema 96, cristalizado pelo C. STF no julgamento do RE 579.431, observando-se, a partir de então, o teor da Súmula Vinculante 17/STF.
Das custas e despesas processuais
A Autarquia Previdenciária é isenta do pagamento de custas e emolumentos no âmbito da Justiça Federal e nas ações processadas perante a Justiça Estadual de São Paulo, por força do artigo 4º, I, da Lei Federal n. 9.289/1996, e do artigo 6º da Lei Estadual paulista n. 11.608/2003.
A isenção, por sua vez, não a exime do reembolso das despesas judiciais eventualmente recolhidas pela parte vencedora, desde que devidamente comprovada nos autos, consoante o parágrafo único do referido artigo 4º da Lei n. 9.289/1996.
Quanto às demandas aforadas no Estado de Mato Grosso do Sul, a isenção prevista nas Leis Estaduais sul-mato-grossenses ns. 1.135/1991 e 1.936/1998 foi revogada pela Lei Estadual n. 3.779/2009 (artigo 24, §§ 1º e 2º), razão pela qual cabe ao INSS o ônus do pagamento das custas processuais naquele Estado.
Por fim, caberá à parte vencida arcar com as despesas processuais e as custas somente ao final, na forma do artigo 91 do CPC.
Dos honorários advocatícios
De rigor a manutenção da sucumbência recíproca, conforme fixado pelo r. Juízo a quo.
Dispositivo
Ante o exposto, corrijo, de ofício, o erro material constante na sentença, dou parcial provimento à apelação da parte autora e nego provimento à apelação do INSS, nos termos da fundamentação.
É o voto.
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ERRO MATERIAL. CORREÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. LEI VIGENTE À ÉPOCA DO EXERCÍCIO LABORAL. AGENTES BIOLÓGICOS. ANÁLISE QUALITATIVA. EXPOSIÇÃO COMPROVADA. ILEGITIMIDADE PASIVA DO INSS. REGIME PRÓPRIO. ESPECIALIDADE RECONHECIDA. RMI DO BENEFÍCIO. REVISÃO DEVIDA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
- Primeiramente, corrijo o erro material constante na conclusão e dispositivo da sentença, uma vez que, conforme pedido inicial, fundamentação, CNIS e CTPS, o vínculo empregatício com o empregador "Município de Piedade" teve início em 21/01/1991.
- O exercício de atividades nocivas, causadoras de algum prejuízo à saúde e à integridade física ou mental do trabalhador ao longo do tempo, independentemente de idade, garante ao trabalhador a conversão em tempo comum para fins de aposentação por tempo de contribuição.
- Conforme orientação do C. Superior Tribunal de Justiça, a natureza especial da atividade deve ser reconhecida em razão do tempo da prestação e da legislação então vigente, tornando-se direito adquirido do empregado.
- O agente nocivo deve, em regra, ser definido em legislação contemporânea ao labor, admitindo-se excepcionalmente que se reconheça como nociva a sujeição do segurado a agente não previsto em regulamento, desde que comprovada a sua efetiva prejudicialidade.
- O labor deve ser exercido de forma habitual e permanente, com exposição do segurado ao agente nocivo indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço.
- A discussão sobre o uso de Equipamento de Proteção Individual (EPI) como fator de descaracterização do tempo especial encontra-se balizada pelo C. STF no Tema 555 de repercussão geral. Na hipótese de o segurado apresentar PPP indicativo de sua exposição a determinado agente nocivo e inexistindo prova de que o EPI, embora possa atenuar os efeitos prejudiciais, seja capaz de neutralizar totalmente a nocividade do ambiente laborativo, é de rigor reconhecer a especialidade do labor. Além disso, ficou pacificado que inexiste EPI capaz de neutralizar ou minimizar os efeitos nocivos do agente ruído. Precedentes.
- A exposição do trabalhador a agentes biológicos tem sua intensidade medida por análise qualitativa, bastando apenas o contato físico para caracterização da especialidade do trabalho, uma vez que não estabelece limites de tolerância ou quaisquer especificações no que tange à concentração dos agentes.
- Ilegitimidade passiva do INSS para reconhecimento da especialidade de período em que a parte autora esteve filiada ao Regime Próprio de Previdência.
- Reconhecida a atividade especial, exercida sob condições nocivas à saúde ou à integridade física do segurado, nos períodos de21/01/1991 a 30/04/1993 e 01/07/1999 a 13/10/2017.
- Diante dos períodos especiais ora reconhecidos, a parte autora faz jus à revisão da RMI do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição concedido na esfera administrativa.
- De rigor a manutenção da sucumbência recíproca, conforme fixado pelo r. Juízo a quo.
- Correção, de ofício, de erro material. Apelação da parte autora parcialmente provida. Apelação do INSS desprovida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Turma, por unanimidade, decidiu corrigir, de ofício, o erro material constante na sentença, dar parcial provimento à apelação da parte autora e negar provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.