PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. ART. 203, V, CF/88, LEI N. 8.742/93 E 12.435/2011. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. DEVOLUÇÃO DE VALORES. INEXIGIBILIDADE. BOA-FÉ OBJETIVA. APELAÇÃO DO INSS NÃO PROVIDA
Ementa:
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. ART. 203, V, CF/88, LEI N. 8.742/93 E 12.435/2011. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. DEVOLUÇÃO DE VALORES. INEXIGIBILIDADE. BOA-FÉ OBJETIVA. APELAÇÃO DO INSS NÃO PROVIDA.
- O benefício de prestação continuada é devido à pessoa com deficiência ou idoso que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família
- Conclui-se dos autos que não há qualquer indício de fraude ou ato ilícito praticado pela parte autora pelo suposto pagamento indevido do benefício, o que pressupõe a sua boa-fé objetiva no recebimento de valores.
- Ausente a má-fé, presume-se a boa-fé da parte autora e, tendo em vista o caráter alimentar do amparo social, entendo inexigível a devolução dos valores já pagos.
- Em casos tais, é imprescindível que seja comprovada a má-fé do beneficiário ou que seja ilidida a boa-fé da pessoa que recebeu de forma indevida o benefício previdenciário, a fim de obrigar o ressarcimento ao erário.
- De outra parte, à autarquia impõe-se o dever de fiscalização e controle na concessão e pagamento dos benefícios, dispondo de recursos visando constatar eventuais irregularidades que causem prejuízo ao Erário Público.
- O INSS não realizou a reavaliação da continuidade das condições que originaram a concessão do benefício assistencial a cada 2 (dois) anos, exigência prevista nos termos do art. 21 da Lei 8.742/1993 e do art. 42 do Dec. 6.214, fugindo à razoabilidade a tentativa de cobrar da parte autora vultuosa quantia que se acumulou durante o extenso lapso temporal em que a autarquia permaneceu inerte.
- A narrativa fática dos autos conduz ao entendimento de não se tratar, no caso em tela, de “situação em que o homem médio consegue constatar a existência de erro”, a autorizar, nos termos delineados pelo C. STJ, a devolução dos valores ao erário.
- Nesse sentido, incabível a cobrança de verba alimentar recebida de boa-fé.
- Desprovido o apelo, cabível o arbitramento de honorários em grau recursal.
- Apelação do INSS não provida.
(TRF 3ª Região, 9ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5001468-69.2017.4.03.9999, Rel. CRISTINA NASCIMENTO DE MELO, julgado em 08/12/2023, Intimação via sistema DATA: 12/12/2023)
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PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001468-69.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. CRISTINA MELO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ILDA GONZAGA DE MELO
Advogado do(a) APELADO: MARIA APARECIDA FERNANDES MANSILHA - MS12369-A
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001468-69.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. CRISTINA MELO
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APELADO: ILDA GONZAGA DE MELO
Advogado do(a) APELADO: MARIA APARECIDA FERNANDES MANSILHA - MS12369-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL CRISTINA MELO: Trata-se de apelação em face da r. sentença que julgou procedente o pedido inicial para: (i) declarar inexigível o débito de R$ 43.872,60, decorrente da concessão de benefício assistencial.
Nas razões recursais, a Autarquia sustenta a legalidade da cobrança administrativa. Requer a reforma do julgado.
Com contrarrazões, os autos subiram a esta Corte.
O Ministério Público manifestou-se pelo desprovimento do recurso.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001468-69.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. CRISTINA MELO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ILDA GONZAGA DE MELO
Advogado do(a) APELADO: MARIA APARECIDA FERNANDES MANSILHA - MS12369-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL CRISTINA MELO: Em razão de sua regularidade formal, recebo o(s) recurso(s), nos termos do artigo 1.011 do CPC/2015.
A parte autora visa a declaração de inexigibilidade de débito oriundo da cobrança de concessão de benefício assistencial de prestação continuada previsto no artigo 20 da Lei n. 8.742/1993, regulamentado pelos Decretos n. 6.214/2007 e 7.617/2011.
A referida lei conferiu eficácia ao inciso V do artigo 203 da Constituição Cidadã ao estabelecer as condições para a concessão do benefício de assistência social, quais sejam: ser o postulante pessoa com deficiência ou idoso, e em ambos os casos, comprovar situação de miserabilidade, de modo a não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
Dispõe o art. 20, § 3º, da Lei 8.742/93 que “considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo”. O requisito financeiro estabelecido pela lei teve sua constitucionalidade contestada, ao fundamento de que permitiria que situações de patente miserabilidade social fossem consideradas fora do alcance do benefício assistencial previsto constitucionalmente.
Ao apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.232 1/DF, o Supremo Tribunal Federal declarou a constitucionalidade do art. 20, § 3º, da LOAS.
A decisão do Supremo Tribunal Federal, entretanto, não pôs termo à controvérsia quanto à aplicação em concreto do critério da renda familiar per capita estabelecido pela LOAS.
Como a lei permaneceu inalterada, elaboraram-se maneiras de se contornar o critério objetivo e único estipulado pela LOAS e de se avaliar o real estado de miserabilidade social das famílias com entes idosos ou deficientes.
Paralelamente, foram editadas leis que estabeleceram critérios mais elásticos para a concessão de outros benefícios assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; a Lei 10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso à Alimentação; a Lei 10.219/01, que criou o Bolsa Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro a Municípios que instituírem programas de garantia de renda mínima associados a ações socioeducativas.
O objetivo do Constituinte ao impor a cláusula “não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família” possui único intuito: conferir proteção social àqueles incapazes de garantir a respectiva subsistência.
Segundo consta dos autos, o benefício assistencial (NB: 88/103.685.667-1) foi concedido em 1998, e posteriormente suspenso pela autarquia em 09/02/2011.
De acordo com o INSS, teriam sido constatados indícios de irregularidade no benefício de prestação continuada que lhe havia sido concedido, no período compreendido entre 16/03/2005 a 01/08/2008, o gerou a cobrança dos valores de R$ 43.872,60.
Verifica-se que a irregularidade supostamente se deu por conta do recebimento, pela parte autora, do benefício de pensão por morte decorrente do óbito de seu cônjuge desde 2005.
Alega a autarquia ainda que a parte autora deixou de informar que, quando do requerimento do amparo social, residia com seu cônjuge, beneficiário de aposentadoria por idade rural, no valor de 1 (um) salário mínimo.
Passo à análise da possibilidade de devolução dos demais valores.
Destaco, primeiramente, que a E. Primeira Seção do C. STJ, ao apreciar o tema repetitivo de n. 979, em que se submeteu a julgamento a questão acerca da “Devolução ou não de valores recebidos de boa-fé, a título de benefício previdenciário, por força de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da Administração da Previdência Social”, firmou a seguinte tese jurídica: "Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados decorrentes de erro administrativo (material ou operacional), não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela Administração, são repetíveis, sendo legítimo o desconto no percentual de até 30% (trinta por cento) de valor do benefício pago ao segurado/beneficiário, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido."
Depreende-se, em breve resumo, que o mencionado precedente firmou as seguintes molduras para solução da temática:
1) o pagamento indevido decorrente de má aplicação ou de interpretação errônea da lei não são passíveis de devolução pelo segurado;
2) os valores recebidos indevidamente em razão de erro material ou operacional da Administração são passíveis de devolução, salvo comprovação da boa-fé do segurado;
3) a comprovação da boa-fé será exigida para as ações ajuizadas a partir de 23/04/2021 (publicação do acórdão paradigma);
4) a repetição, quando admitida, permite o desconto do percentual de até 30% do valor do benefício do segurado.
A distinção entre os casos de cabimento (ou não) da restituição pelos segurados está de acordo com o princípio da segurança jurídica em suas duas dimensões: a objetiva, que é a segurança jurídica stricto sensu; e outra subjetiva, que é a proteção à confiança legítima.
Sobre a boa-fé objetiva, pode-se definir nas palavras da Exma. Ministra Nancy Andrighi (RE 803.481/GO), como sendo “uma exigência de lealdade, impondo que cada parte se comporte de forma honesta, escorreita e leal, em conformidade com um padrão ético de confiança, a fim de permitir a concretização das legítimas expectativas que justificaram a celebração do acordo de vontades. O ordenamento jurídico, nesse contexto, repele a prática de condutas contraditórias, impregnadas ou não de malícia ou torpeza, que importem em quebra da confiança legitimamente depositada na outra parte da relação contratual”.
Nesse sentido, relembro que um dos princípios basilares do Direito Civil diz respeito a presunção da boa-fé, devendo a má-fé ser provada por quem alega.
No caso, tendo sido constatado pelo INSS, em procedimento realizado com o objetivo de verificar a continuidade das condições que deram origem ao benefício assistencial, que houve modificação da condição socioeconômica da família, não se verifica nenhuma ilegalidade na cessação do benefício.
Com efeito, acerca dos valores recebidos a título de benefício assistencial, trata-se de verba alimentar utilizada para sustento e sobrevivência imediata do beneficiário.
Observo que não há qualquer indício de fraude ou ato ilícito praticado pela parte autora pelo suposto pagamento indevido do benefício, o que pressupõe a sua boa-fé objetiva no recebimento de valores.
Ausente a má-fé, presume-se a boa-fé da parte autora e, tendo em vista o caráter alimentar do amparo social, entendo inexigível a devolução dos valores já pagos.
Ademais, a alegação da autarquia de que houve a superação da renda mensal per capta não merece pleito, visto que a aposentadoria do cônjuge da autora (também pessoa idosa à época), atrai o entendimento de que os benefícios previdenciários e assistenciais no valor de um salário-mínimo pagos aos idosos devem ser excluídos para fins de apuração da renda mensal per capita da família (TF, RE 580.963; TRU/3ª Região, Súmula 22; e art. 20, §14, da Lei 8.742/1993).
Nesse sentido, o C. Superior Tribunal de Justiça no julgamento do REsp 1355052:
PREVIDENCIÁRIO. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO ASSISTENCIAL PREVISTO NA LEI N. 8.742/93 A PESSOA COM DEFICIÊNCIA. AFERIÇÃO DA HIPOSSUFICIÊNCIA DO NÚCLEO FAMILIAR. RENDA PER CAPITA. IMPOSSIBILIDADE DE SE COMPUTAR PARA ESSE FIM O BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO, NO VALOR DE UM SALÁRIO MÍNIMO, RECEBIDO POR IDOSO.
1. Recurso especial no qual se discute se o benefício previdenciário, recebido por idoso, no valor de um salário mínimo, deve compor a renda familiar para fins de concessão ou não do benefício de prestação mensal continuada a pessoa deficiente.
2. Com a finalidade para a qual é destinado o recurso especial submetido a julgamento pelo rito do artigo 543-C do CPC, define-se: Aplica-se o parágrafo único do artigo 34 do Estatuto do Idoso (Lei n. 10.741/03), por analogia, a pedido de benefício assistencial feito por pessoa com deficiência a fim de que benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário mínimo, não seja computado no cálculo da renda per capita prevista no artigo 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93.
3. Recurso especial provido. Acórdão submetido à sistemática do § 7º do art. 543-C do Código de Processo Civil e dos arts. 5º, II, e 6º, da Resolução STJ n. 08/2008. (REsp 1355052 /SP, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 25/02/2015, DJe 05/11/2015)
Tratando-se de verba alimentar, entende-se que o valor é utilizado para sustento e sobrevivência imediata do beneficiário.
De outra parte, à autarquia impõe-se o poder-dever de fiscalização e controle na concessão e pagamento dos benefícios, dispondo de recursos visando constatar eventuais irregularidades que causem prejuízo ao Erário Público.
Vê-se, pois, que a narrativa fática dos autos conduz ao entendimento de não se tratar, no caso em tela, de “situação em que o homem médio consegue constatar a existência de erro”, a autorizar, nos termos delineados pelo C. STJ, a devolução dos valores ao erário.
Nesse sentido, o entendimento deste Tribunal Regional Federal da 3ª Região:
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO PAGO INDEVIDAMENTE. RECEBIMENTO DE BOA-FÉ. ERRO DA ADMINISTRAÇÃO. INEXEGIBILIDADE DA RESTITUIÇÃO AO ERÁRIO. 1.Não há que se falar na incompetência da Justiça Estadual para apreciar a questão relativa à necessidade de devolução de valores recebidos indevidamente a título de benefício previdenciário, em virtude da competência federal delegada prevista no Art. 109, § 3º, da Constituição Federal. 2. Restou pacificado pelo e. Supremo Tribunal Federal ser desnecessária a restituição dos valores recebidos de boa fé, devido ao seu caráter alimentar, em razão do princípio da irrepetibilidade dos alimentos (MS 26085, Relatora Ministra Cármen Lúcia, Tribunal Pleno; RE 587371, Relator Ministro Teori Zavascki, Tribunal Pleno; RE 638115, RE 638115, Relator Ministro Gilmar Mendes, Tribunal Pleno). 3. Pelo princípio da autotutela, a Administração pode anular seus próprios atos quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial (Súmula nº 473/STF). 4. Uma vez descontado pelo INSS, não se pode cogitar na hipótese de devolução de valores, compelindo a Administração a pagar algo que, efetivamente, não deve. A natureza alimentar do benefício não abarca as prestações já descontadas e que não eram devidas. 5. Tendo a autoria decaído de parte do pedido, devem ser observadas as disposições contidas nos §§ 2º, 3º, I, e 4º, do Art. 85, e no Art. 86, do CPC. 6. Apelação provida em parte. (TRF 3ª Região, 10ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 6088312-34.2019.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal PAULO OCTAVIO BAPTISTA PEREIRA, julgado em 28/9/2021, DJEN DATA: 6/10/2021)
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. ART. 203, V, CF/88, LEI N. 8.742/93 E 12.435/2011. NÃO PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. DEVOLUÇÃO DE VALORES. INEXIGIBILIDADE. BOA-FÉ OBJETIVA.
- O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência ou idoso que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.
- Na hipótese dos autos, a parte autora não demonstrou o preenchimento de requisito essencial à concessão do benefício assistencial.
- O Superior Tribunal de Justiça, ao analisar o Tema 979 (REsp 1.381.734/RN), fixou a seguinte tese: "Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados, decorrentes de erro administrativo (material ou operacional) não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela administração, são repetíveis, sendo legítimo o desconto no percentual de até 30% do valor do benefício pago ao segurado/beneficiário, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprove sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido."
- A respeito especificamente do conceito de boa-fé objetiva, conforme definido pela Exma. Ministra Nancy Andrighi no julgamento do Recurso Especial nº 803.481/GO, “esta se apresenta como uma exigência de lealdade, modelo objetivo de conduta, arquétipo social pelo qual impõe o poder-dever de que cada pessoa ajuste a própria conduta a esse arquétipo, agindo como agiria uma pessoa honesta, escorreita e leal” (REsp 803.481/GO, Terceira Turma, julgado em 28/06/2007).
- A Autarquia Federal não efetuou a reavaliação da continuidade das condições que originaram a concessão do benefício assistencial a cada 2 (dois) anos, nos termos do art. 21 da Lei de Assistência e art. 42 do Decreto nº 6.214, fugindo à razoabilidade a tentativa de cobrar da Autora o pagamento de quantia que alcançou monta tão vultosa, em consequência do extenso lapso temporal em que a mesma auferiu o referido benefício em suposto desacordo com a norma legal.
- Não há qualquer indício de fraude ou ato ilícito praticado pela parte autora pelo suposto equívoco administrativo na concessão do benefício, o que afasta a existência de má-fé. - Ausente a comprovação de má-fé, presume-se a boa-fé da Autora e, em vista do caráter alimentar do amparo social, inexigível a devolução dos valores já pagos. - Na hipótese dos autos, incabível a condenação ao pagamento de honorários advocatícios, por se tratar de pessoas jurídicas de direito público integrantes da mesma fazenda, a teor da Súmula nº 421 do Superior Tribunal de Justiça. - Tendo em vista que as partes envolvidas integram o âmbito do mesmo ente federativo e, de acordo com o entendimento jurisprudencial consolidado, torna-se inviável a condenação às verbas de sucumbência. Apelação provida em parte. (ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP 5003254-09.2022.4.03.6141, 9a Turma, 28/09/2023, Desembargador Federal GILBERTO JORDAN).
Sendo assim, entendo inexigível a cobrança do débito pelo INSS, nos termos da r. sentença.
Por outro lado, não cabe, no caso, a restituição dos valores já descontados, pois seu acolhimento equivaleria à determinação do pagamento de verba que se sabe indevida.
Com efeito, os descontos foram realizados no exercício do poder-dever de autotutela da autarquia previdenciária, nos termos da Súmula 473 do STF, não se podendo compelir o INSS ao pagamento de quantia que se entende não devida.
Nesse sentido, colaciono decisões desta E. Nona Turma:
MANDADO DE SEGURANÇA. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. PAGAMENTO INDEVIDO DE PARCELAS SEGUIDO DE DESCONTO ADMINISTRATIVO. RESTITUIÇÃO DAS PARCELAS JÁ DESCONTADAS PELO INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL (INSS). IMPOSSIBILIDADE.
- É incabível a restituição de valores descontados administrativamente em razão de pagamento de verba indevida.
- Da mesma forma que a concessão errônea do benefício ab initio gerou direito ao recebimento do benefício até decisão em contrário, a restituição levada a efeito na esfera administrativa deve seguir o mesmo princípio, ou seja, produzir efeitos até que seja cessada, no caso, por ordem judicial.
- Feito o desconto pelo INSS, não se pode cogitar de devolução de valores, compelindo a Administração a pagar algo que, efetivamente, não deve.
- A natureza alimentar do benefício não abarca as prestações já descontadas e que não eram devidas pelo INSS.
- Apelação e reexame necessário providos.
(ApelRemNec 5000419-18.2020.4.03.6109, Desembargadora Federal DALDICE SANTANA, 9ª Turma, 31/03/2023).
Desprovido o apelo, cabível o arbitramento de honorários em grau recursal, os quais majoro em 2%, nos termos do §11 do art. 85, do CPC.
Diante do exposto, nego provimento ao recurso de apelação, nos termos da fundamentação.
É o voto.
gabcm/gdsouza
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. ART. 203, V, CF/88, LEI N. 8.742/93 E 12.435/2011. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. DEVOLUÇÃO DE VALORES. INEXIGIBILIDADE. BOA-FÉ OBJETIVA. APELAÇÃO DO INSS NÃO PROVIDA.
- O benefício de prestação continuada é devido à pessoa com deficiência ou idoso que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família
- Conclui-se dos autos que não há qualquer indício de fraude ou ato ilícito praticado pela parte autora pelo suposto pagamento indevido do benefício, o que pressupõe a sua boa-fé objetiva no recebimento de valores.
- Ausente a má-fé, presume-se a boa-fé da parte autora e, tendo em vista o caráter alimentar do amparo social, entendo inexigível a devolução dos valores já pagos.
- Em casos tais, é imprescindível que seja comprovada a má-fé do beneficiário ou que seja ilidida a boa-fé da pessoa que recebeu de forma indevida o benefício previdenciário, a fim de obrigar o ressarcimento ao erário.
- De outra parte, à autarquia impõe-se o dever de fiscalização e controle na concessão e pagamento dos benefícios, dispondo de recursos visando constatar eventuais irregularidades que causem prejuízo ao Erário Público.
- O INSS não realizou a reavaliação da continuidade das condições que originaram a concessão do benefício assistencial a cada 2 (dois) anos, exigência prevista nos termos do art. 21 da Lei 8.742/1993 e do art. 42 do Dec. 6.214, fugindo à razoabilidade a tentativa de cobrar da parte autora vultuosa quantia que se acumulou durante o extenso lapso temporal em que a autarquia permaneceu inerte.
- A narrativa fática dos autos conduz ao entendimento de não se tratar, no caso em tela, de “situação em que o homem médio consegue constatar a existência de erro”, a autorizar, nos termos delineados pelo C. STJ, a devolução dos valores ao erário.
- Nesse sentido, incabível a cobrança de verba alimentar recebida de boa-fé.
- Desprovido o apelo, cabível o arbitramento de honorários em grau recursal.
- Apelação do INSS não provida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por unanimidade, decidiu negar provimento ao recurso, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.