PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL COMPROVADA. RUÍDO. AGENTES BIOLÓGICOS. EXPOSIÇÃO A ESGOTO. POSSIBILIDADE DE CÔMPUTO DO TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL PRESTADO NO PERÍODO EM QUE O SEGURADO ESTEVE EM GOZO DE AUXÍLIO-DOENÇA. REQUISITOS CUMPRIDOS. BENEFÍCIO DEFE...
Ementa:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL COMPROVADA. RUÍDO. AGENTES BIOLÓGICOS. EXPOSIÇÃO A ESGOTO. POSSIBILIDADE DE CÔMPUTO DO TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL PRESTADO NO PERÍODO EM QUE O SEGURADO ESTEVE EM GOZO DE AUXÍLIO-DOENÇA. REQUISITOS CUMPRIDOS. BENEFÍCIO DEFERIDO.
1. Em consulta ao sistema informatizado do Superior Tribunal de Justiça, verifica-se que as decisões proferidas, sob regime de repercussão geral, nos REsp n. 1.759.098 e 1.723.181/RS (Tema 998), transitaram em julgado, não havendo que se falar em sobrestamento/suspensão do presente feito.
2. A concessão da aposentadoria por tempo de serviço, hoje tempo de contribuição, está condicionada ao preenchimento dos requisitos previstos nos artigos 52 e 53 da Lei Federal nº 8.213/91. A par do tempo de serviço/contribuição, deve também o segurado comprovar o cumprimento da carência, nos termos do artigo 25, inciso II, da Lei Federal nº 8.213/91.
3. A controvérsia nos presentes autos corresponde ao reconhecimento do exercício de atividade especial nos períodos de 09/05/1989 a 28/02/2001 e 01/03/2001 a 18/09/2017.
4. Em se tratando de agente nocivo ruído, a comprovação da exposição demanda avaliação técnica para se aferir o nível em relação aos limites de tolerância estabelecidos nos diversos períodos. Trata-se, como já visto, de avaliação quantitativa.
5. Nesse sentido, o Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.6, fixou o nível mínimo em 80dB. Por força do Quadro I do Anexo do Decreto nº 72.771/73, de 06/09/1973, esse nível foi elevado para 90dB.
6. O Quadro Anexo I do Decreto nº 83.080/79, mantido pelo Decreto nº 89.312/84, considera insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 90 decibéis, de acordo com o Código 1.1.5. Essa situação foi alterada pela edição dos Decretos nºs 357, de 07/12/1991 e 611, de 21/07/1992, que incorporaram, a um só tempo, o Anexo I do Decreto nº 83.080, de 24/01/1979, que fixou o nível mínimo de ruído em 90dB e o Anexo do Decreto nº 53.831, de 25/03/1964, que fixava o nível mínimo de 80dB, de modo que prevalece este, por ser mais favorável.
7. De 06/03/1997 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 2.172/97, e de 07/05/1999 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 3.048/99, o limite de tolerância voltou a ser fixado em 90 dB.
8. A partir de 19/11/2003, com a alteração ao Decreto nº 3.048/99, Anexo IV, introduzida pelo Decreto nº 4.882/03, o limite de tolerância do agente nocivo ruído caiu para 85 dB.
9. O STJ, no julgamento do REsp. nº 1.398.260/PR (1ª Seção, j. 14/05/2014, DJe: 05/12/2014, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN), representativo de controvérsia, reconheceu a impossibilidade de aplicação retroativa do índice de 85 dB para o período de 06-03-1997 a 18-11-/2003, devendo ser aplicado o limite vigente ao tempo da prestação do labor, qual seja, 90dB.
10. 09/05/1989 a 28/02/2001 (Sanasa - Campinas). Nesse período, a parte autora trabalhou nos cargos de operador de reservatório de água, operador de reservatório e operador II exposta a ruídos de 98 dB(A) a 100 dB (A), enquadrados nos códigos 1.1.6, Anexo do Decreto Federal nº 53.831/64 e 2.0.1, Anexo IV do Decreto Federal nº 2.172/97 (PPP – fls. 12/15, ID 163016353).
11. 01/03/2001 a 18/09/2017 (Sanasa - Campinas). Nesse período, o PPP (fls. 12/15, ID 163016353) registra que a parte autora trabalhou nas funções de técnico em saneamento e agente técnico em saneamento, com exposição a agentes biológicos, decorrente do contato com “esgoto in natura”. Da descrição das atividades da parte autora consta o que segue: 1) a partir de 01/03/2001 até 31/10/2005: “Participa da elaboração de projetos de sistemas de recalque e tratamento de esgoto; orienta nas atribuições das equipes de operação; realiza coletas e análises de amostras de água e de esgoto; confere boletins diários de serviços de manutenção e operação, a fim de operar com eficiência adequada os referidos sistemas”; 2) a partir de 01/11/2005 a 18/09/2017: “efetua operação dos sistemas de bombeamento e tratamento de esgoto, através do acionamento de equipamentos elétricos-mecânicos válvulas, comportas, painéis de comando, coletando amostras das unidades de tratamento, para produzir um efluente final tratado dentro das características físico-químicas e biológicas pré-determinadas”.
12. São classificados, no item 3.0.1, alínea ‘e’, do Anexo IV do Decreto 3.048/99, como agentes nocivos os “microorganismos e parasitas infecciosos vivos e suas toxinas” aos quais o segurado fica exposto nos “trabalhos em galerias, fossas e tanques”. Ainda, segundo o Anexo 14, da NR-15 do Ministério do Trabalho, a exposição do trabalhador a agentes biológicos tem sua intensidade medida a partir de análise qualitativa, considerada insalubridade, de grau máximo, trabalho ou operações, em contato permanente com esgotos (galerias ou tanques), bastando apenas o contato físico para caracterização da especialidade do labor. Assim, independentemente do PPP revelar o nível de concentração, há o contato habitual e permanente aos agentes biológicos.
13. Assim, dado o contato da parte autora com agentes biológicos advindos da exposição a esgotos, restou demonstrado o exercício de labor especial no período postulado, na forma da lei que disciplina a aposentadoria especial.
14. O Superior Tribunal de Justiça, em julgamento repetitivo, fixou a seguinte tese: “O segurado que exerce atividades em condições especiais, quando em gozo de auxílio-doença, seja acidentário ou previdenciário, faz jus ao cômputo desse mesmo período como tempo de serviço especial” (1ª Seção, REsp 1723181/RS e 1759098/RS, j. 26/06/2019, DJe 01/08/2019, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO).
15. No caso, a parte autora esteve em gozo do benefício de auxílio-doença previdenciário, de 24/02/2015 a 09/07/2015 (informação constante do CNIS).
16. Logo, devem ser considerados como especiais os períodos de 09/05/1989 a 28/02/2001 e 01/03/2001 a 18/09/2017, sem excluir o período em que a parte autora esteve em gozo de auxílio-doença.
17. Assim sendo, mantida a concessão do benefício previdenciário à parte autora, nos termos da r. sentença.
18. Apliquem-se, para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, os critérios estabelecidos pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta de liquidação, observando-se o decidido nos autos do RE 870947, até a edição da EC 113/2021, a partir de quando será aplicada exclusivamente a taxa Selic.
18. Apelação do INSS desprovida. Correção, de ofício, dos critérios de juros de mora e atualização monetária.
(TRF 3ª Região, 7ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5016644-62.2019.4.03.6105, Rel. JEAN MARCOS FERREIRA, julgado em 15/03/2024, DJEN DATA: 20/03/2024)
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PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5016644-62.2019.4.03.6105
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. JEAN MARCOS
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARCELO CORREA
Advogado do(a) APELADO: JOSE ANTONIO CREMASCO - SP59298-A
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5016644-62.2019.4.03.6105
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. JEAN MARCOS
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARCELO CORREA
Advogado do(a) APELADO: JOSE ANTONIO CREMASCO - SP59298-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O Desembargador Federal Jean Marcos (Relator):
Trata-se de ação previdenciária ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL -INSS, objetivando o reconhecimento de atividades em condições especiais, para fins de concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição.
A r. sentença (ID 163016368) julgou o pedido inicial procedente, nos seguintes termos:
“Por todo o exposto, julgo PROCEDENTES os pedidos formulados pelo autor, julgando o mérito do feito, a teor do art. 487, I do Código de Processo Civil, para:
Reconhecer o caráter especial das atividades exercidas pelo autor nos períodos de 09/05/1989 a 28/02/2001 e 01/03/2001 a 18/09/2017;
Declarar o tempo total de contribuição do autor, de 44 anos e 07 dias, até a data da DER (19/03/2018);
condenar o réu a conceder o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição ao autor, a partir da DER (19/03/2018 - NB 42/186.830.063-0), com o pagamento das prestações vencidas acrescidas de juros de mora e correção monetária até a data do efetivo pagamento.
Os índices de correção monetária serão os constantes da Tabela de Correção Monetária para Benefícios Previdenciários (Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal – CJF - Cap. 4, item 4.3.1), e os juros serão contados da citação, de 0,5% ao mês, a teor do art. 1º-F da Lei n. 9.494/97.
Condeno o réu ao pagamento de honorários advocatícios, a ser liquidado oportunamente, no percentual mínimo previsto no inciso I, do § 3º, respeitada tal proporção, em eventual aplicação dos incisos II a V, a teor do § 5º, todos do art. 85, do NCPC, cujo percentual deverá incidir sobre a condenação calculada até a presente data.
Sem condenação ao pagamento das custas por ser o réu isento.
Diante da presença de prova documental suficiente a comprovar os fatos constitutivos do direito do autor, porquanto procede seu pedido de mérito, bem como em face da natureza alimentar dos benefícios previdenciários, concedo, a requerimento, a antecipação dos efeitos da tutela, a teor do art. 311, IV, do NCPC.
Oficie-se ao Instituto Nacional do Seguro Social – INSS para que implante o benefício da parte autora, no prazo de 30 (trinta) dias, sob pena de omissão e responsabilidade civil, devendo a autoridade administrativa comunicar a este Juízo o cumprimento desta ordem”.
O INSS, ora apelante (ID 163016370), requer o sobrestamento do processo até a conclusão do julgamento dos REsp 1.759.098/RS e 1.723.181/RS (Tema 998) pelo Superior Tribunal de Justiça.
No mérito, afirma que a parte autora não provou a exposição a agentes considerados nocivos à saúde de maneira habitual e permanente e que legitimem o cômputo de tempo especial, nos termos da lei e das normas técnicas de regência.
Aduz a ausência de prévia fonte de custeio.
Aponta a ausência de códigos de recolhimento pertinentes à exposição a agente nocivo no respectivo campo GFIP nos documentos técnicos apresentados.
Alega que os períodos em que a parte autora esteve em gozo de benefício previdenciário de auxílio-doença não poderiam ser reconhecidos como especiais em razão do afastamento das atividades laborativas.
Por fim, requer-se a reforma da r. sentença recorrida “para o fim de fixar os juros de mora a partir da competência 06/2012 de acordo com a Lei n.º 12.703/12, que alterou o art. 12 da Lei n.º 8.177/91, estabelecendo juros de mora variáveis de acordo com a taxa de juros aplicada aos depósitos da caderneta de poupança, ou seja, fixando-se juros de mora legais de acordo com o percentual legal vigente em cada competência executada (incidência de trato sucessivo)”.
Contrarrazões (ID 163016375).
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5016644-62.2019.4.03.6105
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. JEAN MARCOS
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARCELO CORREA
Advogado do(a) APELADO: JOSE ANTONIO CREMASCO - SP59298-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O Desembargador Federal Jean Marcos (Relator):
Em consulta ao sistema informatizado do Superior Tribunal de Justiça, verifica-se que as decisões proferidas, sob regime de repercussão geral, nos REsp n. 1.759.098 e 1.723.181/RS (Tema 998), transitaram em julgado, não havendo que se falar em sobrestamento/suspensão do presente feito.
DA APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO
A Emenda Constitucional nº 20, de 15-12-98, introduziu mudanças profundas no regime das aposentadorias. Assegurou, contudo, a aposentadoria ao segurado do Regime Geral de Previdência Social que tenha cumprido todos os requisitos necessários à obtenção do benefício com base nos critérios da legislação então vigente.
A Aposentadoria por Tempo de Serviço passou a ser Aposentadoria por Tempo de Contribuição, mas o tempo de serviço até então prestado deverá ser contado como tempo de contribuição até que lei nova discipline a matéria.
Para aqueles que implementaram os requisitos para a concessão da aposentadoria por tempo de serviço até a data de publicação da EC nº 20/98, fica assegurada a percepção do benefício, na forma integral ou proporcional, conforme o caso, com base nas regras anteriores ao referido diploma legal.
Por sua vez, para os segurados já filiados à Previdência Social, mas que não tinham implementado os requisitos para a percepção da aposentadoria por tempo de serviço antes da sua entrada em vigor, a EC nº 20/98 impôs as condições constantes do seu artigo 9º, incisos I e II.
Ressalte-se, contudo, que as regras de transição previstas no artigo 9º, incisos I e II, da EC nº 20/98, aplicam-se somente para a aposentadoria proporcional por tempo de serviço, e não para a integral, uma vez que tais requisitos não foram previstos nas regras permanentes para obtenção do referido benefício.
Desse modo, caso o segurado complete o tempo suficiente para a percepção da aposentadoria na forma integral, faz jus ao benefício independentemente de cumprimento do requisito etário e do período adicional de contribuição previstos no artigo 9º da EC nº 20/98.
Por sua vez, para aqueles filiados à Previdência Social após a EC nº 20/98, não há mais possibilidade de percepção da aposentadoria proporcional, mas apenas na forma integral, desde que completado o tempo de serviço/contribuição de 35 (trinta e cinco) anos, para os homens, e de 30 (trinta) anos, para as mulheres.
Nesses termos, à vista das modificações introduzidas pela EC 20/98, vigoravam as seguintes regras para a concessão de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição:
Segurados filiados à Previdência Social antes da EC nº 20/98:
a) têm direito à aposentadoria (integral ou proporcional), calculada com base nas regras anteriores à EC nº 20/98, desde que cumprida a carência do artigo 25 c/c 142 da Lei Federal nº 8.213/91, e o tempo de serviço/contribuição dos artigos 52 e 53 da Lei Federal nº 8.213/91 até 16/12/1998;
b) têm direito à aposentadoria proporcional, calculada com base nas regras posteriores à EC nº 20/98, desde que cumprida a carência do artigo 25 c/c 142 da Lei Federal nº 8.213/91, o tempo de serviço/contribuição dos artigos 52 e 53 da Lei Federal nº 8.213/91, além dos requisitos adicionais do art. 9º da EC nº 20/98 (idade mínima e período adicional de contribuição de 40%);
c) têm direito à aposentadoria integral, calculada com base nas regras posteriores à EC nº 20/98, desde que completado o tempo de serviço/contribuição de 35 (trinta e cinco) anos, para os homens, e de 30 (trinta) anos, para as mulheres.
Segurados filiados à Previdência Social após a EC nº 20/98 têm direito somente à aposentadoria integral, calculada com base nas regras posteriores à EC nº 20/98, desde que completado o tempo de serviço/contribuição de 35 (trinta e cinco) anos, para os homens, e 30 (trinta) anos, para as mulheres.
Novas e profundas modificações no regime das aposentadorias vieram com a EC 103/2019.
A EC 103/2019, vigente a partir de 13-11-2019, extinguiu a Aposentadoria por Tempo de Contribuição. Exige-se, desde então, a conjugação dos requisitos idade e tempo mínimo de contribuição. Nesses termos, para se ter direito a aposentação, o segurado deverá ter 65 anos de idade, se homem, e 62 anos, se mulher. Para os trabalhadores rurais e segurados especiais, exigem-se 60 anos de idade, se homem, e 55 anos, se mulher.
O artigo 3º da nova Emenda assegurou o direito à Aposentadoria por Tempo de Contribuição aos segurados que houvessem cumprido as condições anteriormente à sua vigência.
A nova Emenda também instituiu quatro regras de transição para os segurados que se encontravam filiados ao RGPS e que não houvessem completado os requisitos até a data de 13-11-2019. As regras de transição, previstas nos artigos 15, 16, 17 e 20, estabelecem o seguinte:
(1) sistema de pontos, com idade e tempo de contribuição;
(2) tempo de contribuição e idade mínima;
(3) tempo de contribuição e pedágio de 50% com fator previdenciário. Não há idade; e
(4) tempo de contribuição, pedágio e requisito da idade mínima.
Feitas essas breves considerações, examina-se o caso concreto.
DO PERÍODO ESPECIAL. DISCIPLINA NORMATIVA.
Para fins de reconhecimento de labor especial, não basta a insalubridade, base e fundamento do respectivo adicional, nos termos das normas trabalhistas, mas é necessário, a partir delas, a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos à saúde ou integridade física, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, nos termos da legislação previdenciária de regência, restando apenas excetuados os casos de nocividade presumida por ocupação profissional.
Quanto à comprovação da efetiva exposição aos agentes nocivos, nos termos da lei e regulamentos, tem-se o seguinte quadro dos períodos e dos meios de prova admitidos:
Até 28-04-1995.
Embora a nova Constituição não faça alusão a trabalhos penosos, insalubres ou perigosos, mas, sim, a trabalho sujeito a condições especiais que prejudicam a saúde ou integridade física, restou mantida, pela Lei de Benefícios, na sua redação originária, a regra referente a relação das atividades prejudiciais, a qual deveria ser objeto de lei específica.
Nesses termos, porque o reconhecimento da atividade especial ainda era feito com base no enquadramento por atividade profissional ou ocupação, além dos agentes nocivos especificados, a comprovação também pode ser feita com a admissão de qualquer meio de prova válido, como é o caso formulários próprios instituídos pelo INSS, e até mesmo por meio da CTPS, no caso de reconhecimento de atividade especial com base no enquadramento por categoria profissional, e, mais recentemente, por meio do PPP.
A partir da Lei n. 9.032, de 28-04-1995.
As novas exigências introduzidas – trabalho deve ser permanente, não ocasional nem intermitente, e a exposição deve ser a agentes nocivos prejudiciais à saúde ou integridade física – são incompatíveis com o regime anterior que permitia o reconhecimento da atividade especial também com base no enquadramento por atividade ou ocupação profissional, prevista nos anexos dos antigos decretos normativos.
Nesses termos, a comprovação da efetiva exposição aos agentes nocivos químicos, físicos, biológicos ou associação desses que sejam prejudiciais à saúde deve ser feita por meio dos formulários próprios do INSS, exceto para ruído e calor, em que a comprovação se dá por meio de laudo técnico, e, por fim, por meio dos PPP.
a partir de 10-12-1997.
A comprovação da exposição aos agentes pressupõe a existência de laudo técnico de condições ambientais.
Embora a Medida Provisória n. 1.523-1, e suas reedições, tenham introduzido as alterações ao artigo 58 da Lei de Benefícios, entre as quais a relativa ao formulário baseado em laudo técnico ambiental como meio de comprovação da exposição aos agentes nocivos, conforme já exposto, foi ela revogada pela MP n. 1.596/97, esta convertida na Lei n. 9.528, de 10-12-1997.
Assim, a jurisprudência acabou adotando como termo inicial da exigência de laudo técnico ambiental como meio para comprovação da atividade especial a data da Lei n. 9.528, de 10-12-1997. Nesse sentido o entendimento adotado nesta 7ª. Turma, no julgamento da Apelação Cível 5001130-92.2022.4.03.6128. Transcrevo, para registro, a seguinte parte do voto da eminente Relatora, Desembargadora Federal Inês Virgínia:
“Até 28.04.1995, a especialidade poderia ser reconhecida sem comprovação da exposição, desde que a atividade estivesse enquadrada nos decretos n° 53.831/64 ou n° 83.080/1979, sendo possível e desejável o uso de analogia, para considerar a inserção de determinada categoria profissional, aproximando os diversos grupos de trabalhadores que se enquadrem em atividades assemelhadas, a fim de evitar situações injustas, acarretando sua não aplicação.
Após 28.04.1995, com o advento da Lei 9.032/1995, o segurado passou a ter que comprovar a exposição permanente a agentes prejudiciais à saúde, de forma permanente, não ocasional nem intermitente; entendendo-se como permanente, o trabalho em que a exposição ao agente nocivo é indissociável da produção ou serviço.
As condições especiais de trabalho podem ser provadas pelos instrumentos previstos nas normas de proteção ao ambiente laboral (PPRA, PGR, PCMAT, PCMSO, LTCAT, PPP, SB-40, DISES BE 5235, DSS-8030, DIRBEN-8030 e CAT), sem prejuízos de outros meios de prova, sendo de se frisar que apenas a partir da edição do Decreto 2.172, de 05.03.1997, tornou-se exigível a apresentação de laudo técnico a corroborar as informações constantes nos formulários, salvo para o agente ruído e calor, que sempre exigiu laudo técnico. Todavia, consoante entendimento já sufragado por esta Turma, por se tratar de matéria reservada à lei, tal decreto somente teve eficácia a partir da edição da Lei n 9.528, de 10/12/1997.
O artigo 58 da Lei 8.213/91 dispõe que cabe ao Poder Público definir quais agentes configuram o labor especial e a forma como este será comprovado. A relação dos agentes reputados nocivos pelo Poder Público é trazida, portanto, por normas regulamentares consideradas exemplificativas (Tema Repetitivo 534, REsp 1306113/SC), de que é exemplo o Decreto n. 2.172/97. Assim, se a atividade exercida pelo segurado realmente importar em exposição a fatores de risco, ainda que ela não esteja prevista em regulamento, é possível reconhecê-la como especial.
A partir de 01.01.2004, é obrigatório o fornecimento do PPP - Perfil Profissiográfico Previdenciário aos segurados expostos a agentes nocivos, documento que retrata o histórico laboral do segurado, evidencia os riscos do respectivo ambiente de trabalho e consolida as informações constantes nos instrumentos previstos nas normas de proteção ao ambiente laboral antes mencionados.” (sublinhamos)
Em resumo, de acordo com as normas que disciplinam a matéria, a demonstração das condições especiais de trabalho por parte do segurado pode ser feita por meio de formulários próprios, laudo técnico de condições ambientais, Perfil Profissiográfico Previdenciários e outros documentos técnicos.
Saliente-se, ainda, a teor de entendimento do TRF da 3ª Região, "a desnecessidade de que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que exercida a atividade insalubre, em face de inexistência de previsão legal para tanto, e desde que não haja mudanças significativas no cenário laboral" (TRF-3, 8ª Turma, APELREEX 0004079-86.2012.4.03.6109, DJe: 15/05/2015 Rel. Des. Fed. TANIA MARANGONI). No mesmo sentido: TRF 3ª Região, 7ª Turma, ApCiv. 0002587-92.2008.4.03.6111, j. 24/10/2016, DJe: 04/11/2016, Rel. Des. Fed. PAULO DOMINGUES).
No que se refere ao uso de EPI (equipamento de proteção individual), verifica-se que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE 664.335/SC, j. 04/12/2014, DJe: 12.02.2015, Rel. Min. LUIZ FUX, em sede de repercussão geral, fixou duas teses:
"(...) a primeira tese objetiva que se firma é: o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial. A Administração poderá, no exercício da fiscalização, aferir as informações prestadas pela empresa, sem prejuízo do inafastável judicial review. Em caso de divergência ou dúvida sobre a real eficácia do Equipamento de Proteção Individual, a premissa a nortear a Administração e o Judiciário é pelo reconhecimento do direito ao benefício da aposentadoria especial. Isto porque o uso de EPI, no caso concreto, pode não se afigurar suficiente para descaracterizar completamente a relação nociva a que o empregado se submete";
(...)
a segunda tese fixada neste Recurso Extraordinário é a seguinte: na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria".
Portanto, a desqualificação em decorrência do uso de EPI requer prova da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não afastam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
DO CASO CONCRETO
A controvérsia nos presentes autos corresponde ao reconhecimento do exercício de atividade especial nos períodos de 09/05/1989 a 28/02/2001 e 01/03/2001 a 18/09/2017.
09/05/1989 a 28/02/2001 (Sanasa - Campinas)
Nesse período, a parte autora trabalhou nos cargos de operador de reservatório de água, operador de reservatório e operador II exposta a ruídos de 98 dB(A) a 100 dB (A), enquadrados nos códigos 1.1.6, Anexo do Decreto Federal nº 53.831/64 e 2.0.1, Anexo IV do Decreto Federal nº 2.172/97 (PPP – fls. 12/15, ID 163016353).
Em se tratando de agente nocivo ruído, a comprovação da exposição demanda avaliação técnica para se aferir o nível em relação aos limites de tolerância estabelecidos nos diversos períodos. Trata-se, como já visto, de avaliação quantitativa.
Nesse sentido, o Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.6, fixou o nível mínimo em 80dB. Por força do Quadro I do Anexo do Decreto n. 72.771/73, de 06-09-1973, esse nível foi elevado para 90dB.
O Quadro Anexo I do Decreto nº 83.080/79, mantido pelo Decreto n. 89.312/84, considera insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 90 decibéis, de acordo com o Código 1.1.5. Essa situação foi alterada pela edição dos Decretos n. 357, de 07-12-1991 e 611, de 21-07-1992, que incorporaram, a um só tempo, o Anexo I do Decreto n. 83.080, de 24-01-1979, que fixou o nível mínimo de ruído em 90dB e o Anexo do Decreto n. 53.831, de 25-03-1964, que fixou o nível mínimo de 80dB, de modo que prevalece este, por ser mais favorável.
De 06-03-1997 a 18-11-2003, na vigência do Decreto nº 2.172/97, e de 07-05-1999 a 18-11-2003, na vigência do Decreto nº 3.048/99, o limite de tolerância voltou a ser fixado em 90 dB.
A partir de 19-11-2003, com a alteração ao Decreto nº 3.048/99, Anexo IV, introduzida pelo Decreto nº 4.882/03, o limite de tolerância do agente nocivo ruído caiu para 85 dB.
O STJ, no julgamento do REsp. nº 1.398.260/PR (1ª Seção, j. 14/05/2014, DJe: 05/12/2014, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN), representativo de controvérsia, reconheceu a impossibilidade de aplicação retroativa do índice de 85 dB para o período de 06-03-1997 a 18-11-/2003, devendo ser aplicado o limite vigente ao tempo da prestação do labor, qual seja, 90dB.
Saliente-se que, conforme acima declinado, a apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível de ruído acima do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora, forçoso concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior.
Assim, tem-se o seguinte quadro:
Período Trabalhado
Enquadramento
Limites de Tolerância
Até 05/03/1997
1. Anexo do Decreto nº 53.831/64.
2. Decretos nºs 357/91 e 611/92
80 dB
De 06/03/1997 a 18/11/2003
Anexo IV do Decreto nº 2.172/97
Anexo IV do Decreto nº 3.048/99, redação original
90dB
A partir de 19/11/2003
Anexo IV do Decreto nº 3.048/99, com a alteração do Decreto nº 4.882/03
85 dB
Nesse caso, portanto, porque o nível do ruído é superior ao limite estabelecido, deve ser reconhecido como especial.
01/03/2001 a 18/09/2017 (Sanasa - Campinas)
Nesse período, o PPP (fls. 12/15, ID 163016353) registra que a parte autora trabalhou nas funções de técnico em saneamento e agente técnico em saneamento, com exposição a agentes biológicos, decorrente do contato com “esgoto in natura”.
Da descrição das atividades da parte autora consta o que segue: 1) a partir de 01/03/2001 até 31/10/2005: “Participa da elaboração de projetos de sistemas de recalque e tratamento de esgoto; orienta nas atribuições das equipes de operação; realiza coletas e análises de amostras de água e de esgoto; confere boletins diários de serviços de manutenção e operação, a fim de operar com eficiência adequada os referidos sistemas”; 2) a partir de 01/11/2005 a 18/09/2017: “efetua operação dos sistemas de bombeamento e tratamento de esgoto, através do acionamento de equipamentos elétricos-mecânicos válvulas, comportas, painéis de comando, coletando amostras das unidades de tratamento, para produzir um efluente final tratado dentro das características físico-químicas e biológicas pré-determinadas”.
Até a edição da Lei nº. 9.032, de 28-04-1995, o reconhecimento da atividade especial pode se dar com base nas ocupações contempladas nos anexos dos Decretos 53.831/1964 e 83.080/1979, conforme acima já exposto.
Já quanto aos períodos posteriores a Lei 9.032/95, deve a parte autora demonstrar a exposição a agentes nocivos à saúde ou integridade física.
São classificados, no item 3.0.1, alínea ‘e’, do Anexo IV do Decreto 3.048/99, como agentes nocivos os “microorganismos e parasitas infecciosos vivos e suas toxinas” aos quais o segurado fica exposto nos “trabalhos em galerias, fossas e tanques”.
Ainda, segundo o Anexo 14, da NR-15 do Ministério do Trabalho, a exposição do trabalhador a agentes biológicos tem sua intensidade medida a partir de análise qualitativa, considerada insalubridade, de grau máximo, trabalho ou operações, em contato permanente com esgotos (galerias ou tanques), bastando apenas o contato físico para caracterização da especialidade do labor. Assim, independentemente do PPP revelar o nível de concentração, há o contato habitual e permanente aos agentes biológicos.
Nesse sentido, a jurisprudência específica da Sétima Turma:
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. TRABALHO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. REEXAME NECESSÁRIO. DESCABIMENTO. ANOTAÇÕES EM CTPS. PRESUNÇÃO DE VERACIDADE. PERFIL PROFISSIOGRÁFICO PREVIDENCIÁRIO - PPP. EPI INEFICAZ OU NEUTRALIZADOR. HABITUALIDADE DA EXPOSIÇÃO. RUÍDO. METODOLOGIA DE AFERIÇÃO DO RUÍDO. AGENTE BIOLÓGICO. EXPOSIÇÃO A ESGOTO. JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA. HONORÁRIOS RECURSAIS. APELAÇÃO DO INSS DESPROVIDA.
(...)
- Tocante ao PPP de ID Num. 128592957 - Pág. 8/9, a exposição a microorganismos é latente, pois, ao laborar ao realizar limpeza de bueiros e esgoto sanitário, o segurado estava exposto a agentes de natureza biológica de natureza latente.
- São classificados, no item 3.0.1, alínea ‘e’, do Anexo IV dos Decretos 2.172/97 e 3.048/99, como agentes nocivos os microorganismos e parasitas infecciosos vivos e suas toxinas a trabalhos em galerias, fossas e tanques. (Precedentes desta E. Turma : Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1721166 - 0006329-91.2009.4.03.6111, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO DOMINGUES, julgado em 09/04/2018, e-DJF3 Judicial 1 DATA:18/04/2018, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1394453 - 0000235-98.2007.4.03.6111, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO, julgado em 26/03/2018, e-DJF3 Judicial 1 DATA:09/04/2018)
- No item 3.0.1, alínea ‘e’, do Anexo IV dos Decretos 2.172/97 e 3.048/99, como agentes nocivos os microorganismos e parasitas infecciosos vivos e suas toxinas a trabalhos em galerias, fossas e tanques.
- Segundo o Anexo 14, da NR-15 do Ministério do Trabalho, a exposição do trabalhador a agentes biológicos tem sua intensidade medida a partir de análise qualitativa, considerada insalubridade de grau máximo, trabalho ou operações, em contato permanente com esgotos (galerias ou tanques), bastando apenas o contato físico para caracterização da especialidade do labor. Assim, independentemente do PPP revelar o nível de concentração, há o contato habitual e permanente aos agentes biológicos.
(...)
-Desprovido o apelo do INSS interposto na vigência da nova lei, os honorários fixados na sentença devem, no caso, ser majorados em 2%, nos termos do artigo 85, parágrafo 11, do CPC/2015.
- Apelação do INSS desprovida.
(TRF 3ª Região, 7ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5005622-62.2019.4.03.6119, Rel. Desembargador Federal INES VIRGINIA PRADO SOARES, julgado em 09/05/2023, DJEN DATA: 12/05/2023)
Assim, dado o contato da parte autora com agentes biológicos advindos da exposição a esgotos, restou demonstrado o exercício de labor especial no período postulado, na forma da lei que disciplina a aposentadoria especial.
Reitere-se, mais uma vez, que o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP substitui o laudo técnico, sendo documento suficiente à comprovação da atividade nociva à saúde ou integridade física.
Quanto à alegação de necessidade de prévio custeio, ressalto que inexiste vinculação do ato de reconhecimento de tempo de atividade perigosa/nociva ao eventual pagamento de encargos tributários com alíquotas diferenciadas, eis que os artigos 57 e 58 da Lei nº 8.213/91 não demandam tal exigência, que constituiria encargo para o empregador, não podendo o empregado ser por isso prejudicado.
Ainda, o trabalhador não pode ser penalizado pelo incorreto recolhimento de tributos por parte de seu empregador. A autarquia previdenciária tem meios próprios de receber seus créditos.
Ademais, o Superior Tribunal de Justiça, em julgamento repetitivo, fixou a seguinte tese: “O segurado que exerce atividades em condições especiais, quando em gozo de auxílio-doença, seja acidentário ou previdenciário, faz jus ao cômputo desse mesmo período como tempo de serviço especial” (1ª Seção, REsp 1723181/RS e 1759098/RS, j. 26/06/2019, DJe 01/08/2019, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO).
No caso, a parte autora esteve em gozo do benefício de auxílio-doença previdenciário, de 24/02/2015 a 09/07/2015 (informação constante do CNIS).
Logo, devem ser considerados como especiais os períodos de 09/05/1989 a 28/02/2001 e 01/03/2001 a 18/09/2017, sem excluir o período em que a parte autora esteve em gozo de auxílio-doença.
Sendo o requerimento do benefício posterior à Lei Federal nº 8.213/91, deve ser aplicado o fator de conversão de 1,40, mais favorável ao segurado, como determina o artigo 70 do Decreto Federal nº. 3048/99, com a redação dada pelo Decreto Federal nº. 4.827/03.
Os períodos registrados em CTPS são suficientes para garantir o cumprimento da carência, de acordo com a tabela do artigo 142 da Lei Federal nº 8.213/1991.
Assim sendo, mantida a concessão do benefício previdenciário à parte autora, nos termos da r. sentença.
Anote-se, na espécie, a obrigatoriedade da dedução, na fase de liquidação, dos valores eventualmente pagos à parte autora na esfera administrativa.
Apliquem-se, para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, os critérios estabelecidos pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta de liquidação, observando-se o decidido nos autos do RE 870947, até a edição da EC 113/2021, a partir de quando será aplicada exclusivamente a taxa Selic.
Considerado o trabalho adicional realizado pelos advogados, em decorrência da interposição de recurso, os honorários advocatícios, a cargo do INSS, por ocasião da liquidação, deverão ser acrescidos de percentual de 1% (um por cento), nos termos do artigo 85, § 11, do Código de Processo Civil.
O INSS é isento de custas processuais, arcando com as demais despesas, inclusive honorários periciais (Res. CJF nºs. 541 e 558/2007), além de reembolsar custas recolhidas pela parte contrária, o que não é o caso dos autos, ante a gratuidade processual concedida (art. 4º, I e parágrafo único, da Lei 9.289/1996, art. 24-A da Lei 9.028/1995, n.r., e art. 8º, § 1º, da Lei 8.620/1993).
Por tais fundamentos, nego provimento à apelação do INSS. Corrijo, de ofício, os critérios de juros de mora e atualização monetária para determinar a observância do RE 870.947, até a edição da EC 113/2021, a partir de quando será aplicada exclusivamente a taxa Selic.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL COMPROVADA. RUÍDO. AGENTES BIOLÓGICOS. EXPOSIÇÃO A ESGOTO. POSSIBILIDADE DE CÔMPUTO DO TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL PRESTADO NO PERÍODO EM QUE O SEGURADO ESTEVE EM GOZO DE AUXÍLIO-DOENÇA. REQUISITOS CUMPRIDOS. BENEFÍCIO DEFERIDO.
1. Em consulta ao sistema informatizado do Superior Tribunal de Justiça, verifica-se que as decisões proferidas, sob regime de repercussão geral, nos REsp n. 1.759.098 e 1.723.181/RS (Tema 998), transitaram em julgado, não havendo que se falar em sobrestamento/suspensão do presente feito.
2. A concessão da aposentadoria por tempo de serviço, hoje tempo de contribuição, está condicionada ao preenchimento dos requisitos previstos nos artigos 52 e 53 da Lei Federal nº 8.213/91. A par do tempo de serviço/contribuição, deve também o segurado comprovar o cumprimento da carência, nos termos do artigo 25, inciso II, da Lei Federal nº 8.213/91.
3. A controvérsia nos presentes autos corresponde ao reconhecimento do exercício de atividade especial nos períodos de 09/05/1989 a 28/02/2001 e 01/03/2001 a 18/09/2017.
4. Em se tratando de agente nocivo ruído, a comprovação da exposição demanda avaliação técnica para se aferir o nível em relação aos limites de tolerância estabelecidos nos diversos períodos. Trata-se, como já visto, de avaliação quantitativa.
5. Nesse sentido, o Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.6, fixou o nível mínimo em 80dB. Por força do Quadro I do Anexo do Decreto nº 72.771/73, de 06/09/1973, esse nível foi elevado para 90dB.
6. O Quadro Anexo I do Decreto nº 83.080/79, mantido pelo Decreto nº 89.312/84, considera insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 90 decibéis, de acordo com o Código 1.1.5. Essa situação foi alterada pela edição dos Decretos nºs 357, de 07/12/1991 e 611, de 21/07/1992, que incorporaram, a um só tempo, o Anexo I do Decreto nº 83.080, de 24/01/1979, que fixou o nível mínimo de ruído em 90dB e o Anexo do Decreto nº 53.831, de 25/03/1964, que fixava o nível mínimo de 80dB, de modo que prevalece este, por ser mais favorável.
7. De 06/03/1997 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 2.172/97, e de 07/05/1999 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 3.048/99, o limite de tolerância voltou a ser fixado em 90 dB.
8. A partir de 19/11/2003, com a alteração ao Decreto nº 3.048/99, Anexo IV, introduzida pelo Decreto nº 4.882/03, o limite de tolerância do agente nocivo ruído caiu para 85 dB.
9. O STJ, no julgamento do REsp. nº 1.398.260/PR (1ª Seção, j. 14/05/2014, DJe: 05/12/2014, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN), representativo de controvérsia, reconheceu a impossibilidade de aplicação retroativa do índice de 85 dB para o período de 06-03-1997 a 18-11-/2003, devendo ser aplicado o limite vigente ao tempo da prestação do labor, qual seja, 90dB.
10. 09/05/1989 a 28/02/2001 (Sanasa - Campinas). Nesse período, a parte autora trabalhou nos cargos de operador de reservatório de água, operador de reservatório e operador II exposta a ruídos de 98 dB(A) a 100 dB (A), enquadrados nos códigos 1.1.6, Anexo do Decreto Federal nº 53.831/64 e 2.0.1, Anexo IV do Decreto Federal nº 2.172/97 (PPP – fls. 12/15, ID 163016353).
11. 01/03/2001 a 18/09/2017 (Sanasa - Campinas). Nesse período, o PPP (fls. 12/15, ID 163016353) registra que a parte autora trabalhou nas funções de técnico em saneamento e agente técnico em saneamento, com exposição a agentes biológicos, decorrente do contato com “esgoto in natura”. Da descrição das atividades da parte autora consta o que segue: 1) a partir de 01/03/2001 até 31/10/2005: “Participa da elaboração de projetos de sistemas de recalque e tratamento de esgoto; orienta nas atribuições das equipes de operação; realiza coletas e análises de amostras de água e de esgoto; confere boletins diários de serviços de manutenção e operação, a fim de operar com eficiência adequada os referidos sistemas”; 2) a partir de 01/11/2005 a 18/09/2017: “efetua operação dos sistemas de bombeamento e tratamento de esgoto, através do acionamento de equipamentos elétricos-mecânicos válvulas, comportas, painéis de comando, coletando amostras das unidades de tratamento, para produzir um efluente final tratado dentro das características físico-químicas e biológicas pré-determinadas”.
12. São classificados, no item 3.0.1, alínea ‘e’, do Anexo IV do Decreto 3.048/99, como agentes nocivos os “microorganismos e parasitas infecciosos vivos e suas toxinas” aos quais o segurado fica exposto nos “trabalhos em galerias, fossas e tanques”. Ainda, segundo o Anexo 14, da NR-15 do Ministério do Trabalho, a exposição do trabalhador a agentes biológicos tem sua intensidade medida a partir de análise qualitativa, considerada insalubridade, de grau máximo, trabalho ou operações, em contato permanente com esgotos (galerias ou tanques), bastando apenas o contato físico para caracterização da especialidade do labor. Assim, independentemente do PPP revelar o nível de concentração, há o contato habitual e permanente aos agentes biológicos.
13. Assim, dado o contato da parte autora com agentes biológicos advindos da exposição a esgotos, restou demonstrado o exercício de labor especial no período postulado, na forma da lei que disciplina a aposentadoria especial.
14. O Superior Tribunal de Justiça, em julgamento repetitivo, fixou a seguinte tese: “O segurado que exerce atividades em condições especiais, quando em gozo de auxílio-doença, seja acidentário ou previdenciário, faz jus ao cômputo desse mesmo período como tempo de serviço especial” (1ª Seção, REsp 1723181/RS e 1759098/RS, j. 26/06/2019, DJe 01/08/2019, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO).
15. No caso, a parte autora esteve em gozo do benefício de auxílio-doença previdenciário, de 24/02/2015 a 09/07/2015 (informação constante do CNIS).
16. Logo, devem ser considerados como especiais os períodos de 09/05/1989 a 28/02/2001 e 01/03/2001 a 18/09/2017, sem excluir o período em que a parte autora esteve em gozo de auxílio-doença.
17. Assim sendo, mantida a concessão do benefício previdenciário à parte autora, nos termos da r. sentença.
18. Apliquem-se, para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, os critérios estabelecidos pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta de liquidação, observando-se o decidido nos autos do RE 870947, até a edição da EC 113/2021, a partir de quando será aplicada exclusivamente a taxa Selic.
18. Apelação do INSS desprovida. Correção, de ofício, dos critérios de juros de mora e atualização monetária.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu negar provimento à apelação do INSS e alterar, de ofício, os critérios de juros de mora e atualização monetária, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.