PENAL. PROCESSO PENAL. USO DE DOCUMENTO FALSO E ESTELIONATO MAJORADO. ABERTURA DE CONTA CORRENTE, TRANSFERÊNCIA DE PAGAMENTO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO EM NOME DE TERCEIROS E CONTRATAÇÃO DE EMPRÉSTIMOS CONSIGNADOS. AUTORIA NÃO COMPROVADA. ABSOLVIÇÃO MANTIDA
Ementa:
PENAL. PROCESSO PENAL. USO DE DOCUMENTO FALSO E ESTELIONATO MAJORADO. ABERTURA DE CONTA CORRENTE, TRANSFERÊNCIA DE PAGAMENTO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO EM NOME DE TERCEIROS E CONTRATAÇÃO DE EMPRÉSTIMOS CONSIGNADOS. AUTORIA NÃO COMPROVADA. ABSOLVIÇÃO MANTIDA.
- O inquérito policial foi inicialmente instaurado para a apuração dos crimes de uso de documento público falso e estelionato majorado praticados por pessoa desconhecida, que, se passando por uma segurada do INSS fez abertura de uma conta bancária na Agência da CEFem Pirassununga/SP, ransferindo o local de recebimento do benefício previdenciário da segurada, bem como efetuou contrato de empréstimo bancário, induzindo ou mantendo em erro o ente público e auferindo vantagem indevida, emitindo declaração falsa com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade. Ao longo da instrução criminal apurou-se que pessoas desconhecidas, utilizando-se da mesma fotografia e com a mesma digital, falsificaram e/ou usaram RGs e CPFs falsos também em nome de outras pessoas praticando crimes similares, com o mesmo “modus operandi” em cidades do interior do Estado de São Paulo.
- Da documentação apresentada às agências da Caixa Econômica Federal, nota-se que os falsários, além dos documentos de identificação falsos, juntavam comprovante de residência e comprovante de recebimento de benefício previdenciário (Detalhamento Crédito Benefício Previdenciário). Portanto, os crimes foram praticados de maneira muito bem estruturada e complexa, vislumbrando estar-se diante de uma possível associação criminosa.
- No que concerne à ré, a despeito de ter sido presa em flagrante por delito bastante similar, apurado nos autos de n.º 0001406-68.2013.403.6115, não há qualquer comprovação de que tenha efetivamente participado dos delitos imputados nos presentes autos.
- Vale frisar que, se durante a fase inquisitorial vige o princípio do in dubio pro societate, para a imposição de juízo condenatório, é imprescindível a certeza do preenchimento de todos os requisitos indispensáveis para a configuração do delito. Meros indícios ou conjecturas não bastam para um decreto condenatório, que deve se alicerçar em provas robustas. Aplicável, portanto, o princípio in dubio pro reo. Mantida a absolvição.
- Apelação do Ministério Público Federal a que se nega provimento.
(TRF 3ª Região, 11ª Turma, ApCrim - APELAÇÃO CRIMINAL - 0002785-39.2016.4.03.6115, Rel. FAUSTO MARTIN DE SANCTIS, julgado em 10/05/2024, Intimação via sistema DATA: 14/05/2024)
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PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região
11ª Turma
APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0002785-39.2016.4.03.6115
RELATOR: Gab. 38 - DES. FED. FAUSTO DE SANCTIS
APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP
APELADO: ROSELI MIRIAM DE OLIVEIRA
Advogado do(a) APELADO: MAURICIO MACCHI - SP311138-A
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região11ª Turma
APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0002785-39.2016.4.03.6115
RELATOR: Gab. 38 - DES. FED. FAUSTO DE SANCTIS
APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP
APELADO: ROSELI MIRIAM DE OLIVEIRA
Advogados do(a) APELADO: MAURICIO MACCHI - SP311138-A, VICENTE PENEZZI JUNIOR - SP57793-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS:
Trata-se de ação penal movida pelo Ministério Público Federal em face de ROSELI MIRIAM DE OLIVEIRA, nascida em 27.03.1953, como incursa no artigo 171, caput e §3º, do Código Penal, por seis vezes, e no artigo 304 c.c. o artigo 297, do Código Penal, por duas vezes, todos em concurso material.
Narra a denúncia (ID 267686380 – fls. 03/12), recebida na data de 02.08.2016 (ID 267686380 – fls. 14/18):
Consta do incluso inquérito policial que, no dia 20/06/2012, em agência (n.º 0334) da Caixa Econômica Federal (CEF) em Pirassununga/SP, localizada na rua XV de Novembro, n.º 1.505, Centro, naquele município, ROSELI MIRLAM DE OLIVEIRA fez uso de Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) e de Cédula de Identidade Registro Geral (CIRG) falsos, com o escopo de efetuar a abertura de conta corrente em nome de Berenice Tavares de Mello. Consta, também, que, no dia 07/08/2012, ROSELI MIRIAM DE OLIVEIRA obteve, para si, vantagem indevida consistente no recebimento de 01 (uma) parcela do benefício previdenciário de aposentadoria por invalidez (NB nº' 113.398.525-1) em nome de Berenice Tavares de Mello, no importe de R$ 3.139,45 (três mil, cento e trinta e nove reais e quarenta e cinco centavos), em prejuízo da Caixa Econômica Federal (CEF) e do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), mantendo em erro aquela empresa pública federal. Consta, inclusive, que, no dia 24/07/2012, também em referida agência bancária (n.º 0334), ROSELI MIRIAM DEOLIVEIRA obteve, para si, vantagem indevida consistente na obtenção de empréstimo consignado em nome de Berenice Tavares de Mello, em prejuízo da Caixa Econômica Federal (CEF), no importe de R$ 22.092,34 (vinte e dois mil, noventa e dois reais e trinta e quatro centavos), mantendo em erro aquela empresa pública federal. Consta, outrossim, que, no dia 31/05/2012, em agência (nº 0348) da Caixa Econômica Federal (CEF) situada no município de São Carlos/SP, localizada na rua Conde do Pinhal, nº 2.142, Centro, ROSELI MIRIAM DE OLIVEIRA fez uso de Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) e de Cédula de Identidade Registro Geral (CIRG) falsos, com o escopo de efetuar a abertura de conta corrente em nome de Rossana Rossi Pantaleão. Consta, ainda, que, nos dias 06/07/2012, 07/08/2012 e 10/09/2012, ROSELI MIRIAM DE OLIVEIRA obteve, para si, vantagem indevida consistente no recebimento de 03 (três) parcelas do benefício previdenciário de aposentadoria por invalidez (NB nº 117.006.050-9) em nome de Rossana Rossi Pantaleão, no importe de R$ 7.287,98 (sete mil, duzentos e oitenta e sete reais e noventa e oito centavos), em prejuízo da Caixa Econômica Federal (CEF) e do INSS, mantendo em erro aquela empresa pública federal. Consta, por fim, que, no dia 21/06/2012, nessa mesma agência bancária (nº 0348), ROSELI MIRIAM DE OLIVEIRA obteve, para si, vantagem indevida consistente na obtenção de empréstimo consignado em nome de Rossana Rossi Pantaleão, em prejuízo da Caixa Econômica Federal (CEF), no importe de R$ 22.620,00 (vinte e dois mil, seiscentos e vinte reais), mantendo em erro referida empresa pública federal. Consoante apurado, no dia 20/06/2012, a denunciada compareceu à agência da CEF em Pirassununga/SP, munida de documentos falsos (fi. 18), e abriu a conta corrente nº 0334 001 00021269-0 (cópia às fis. 16/7), em nome de Berenice Tavares de Mello. Na mesma ocasião, solicitou a transferência do benefício de Berenice para pagamento nessa mesma conta corrente. Nessa esteira, retomou à instituição bancária aos 24/07/2012, oportunidade em que obteve empréstimo consignado, no valor de R$ 22.092,34 (vinte e dois mil, noventa e dois reais e trinta e quatro centavos), em nome de Berenice Tavares de Mello. No dia 07/08/2012, a denunciada recebeu, na conta corrente recém-aberta em nome de Berenice, parcela do benefício previdenciário de aposentadoria por invalidez, no valor de R$ 3.051,08 (três mil, cinquenta e um reais e oito centavos) (fl. 13). A fraude só foi desvendada porque a verdadeira Berenice Tavares de Mello, tomando conhecimento de que seu benefício previdenciário fora transferido para outra conta corrente, compareceu à agência da CEF em Guarulhos/SP, oportunidade em que relatou não ter requerido qualquer alteração de domicílio quanto a seu benefício previdenciário. De acordo com o oficio de fl. 308, o empréstimo consignado, obtido fraudulentamente em nome de Berenice Tavares de Mello, foi sacado parte em espécie e parte transferida via TED (Transferência Eletrônica Disponível), nos dias 27/07/2012 (valor de R$ 6.500,00) e 30/07/2012 (valor de R$ 5.000,00), sendo que ambas as remessas tinham como destinatária Cícera Alves Bispo dos Santos (CPF nº 045.641.438-08). Outrossim, o Laudo Pericial de fls. 105/10 atestou que os lançamentos de fls. 16 e 62 não partiram do punho subscritor da verdadeira Berenice Tavares de Mello. Do mesmo modo, consoante apurado em inquérito policial anexo (apenso I, volume I), no dia 31/05/2012, a denunciada compareceu à agência da CEF em São Carlos/SP, munida de documentos falsos (fl. 09), e abriu a conta corrente nº 0348 001 00046706-6 (cópia às fls. 05/6), em nome de Rossana Rossi Pantaleão. Na mesma ocasião, solicitou a transferência do benefício de Rossana para pagamento nessa mesma conta corrente. Nessa esteira, retomou à instituição bancária aos 21/06/2012, oportunidade em que obteve empréstimo consignado, no valor de R$ 22.620,00 (vinte e dois mil, seiscentos e vinte reais), em nome de Rossana Rossi Pantaleão (fls. 12/8 do apenso I, volume I). Já nos dias 06/07/2012, 07/08/2012 e 10/09/2012, a denunciada recebeu, na conta corrente recém-aberta em nome de Rossana Rossi Pantaleão, parcelas do benefício previdenciário de aposentadoria por invalidez de Rossana, no valor total de R$ 7.287,98 (sete mil, duzentos e oitenta e sete reais e noventa e oito centavos) (fl. 37 do apenso I, volume I). A fraude só foi desvendada porque a verdadeira Rossana Rossi Pantaleão, tomando conhecimento da fraude, informou a gerência da CEF acerca do ocorrido, oportunidade em que relatou não possuir nenhum conhecimento sobre a abertura de conta corrente ou transferência de seu benefício para São Carlos/SP, tampouco reconheceu o empréstimo consignado realizado em seu nome fls. 21/2 do apenso I, volume 1). De acordo com o oficio de fl. 303, o empréstimo consignado, obtido fraudulentamente em nome de Rossana Rossi Pantaleão, foi transferido em parte via TED (Transferência Eletrônica Disponível), no dia 26/06/2012 (valor de R$ 8.000,00), tendo como destinatária Jesuína Maria da Silva (CPF nº 984.527.208-82). Não obstante os Laudos Documentoscópicos de fls. 105/10, 289/93 e 343/61 terem sido inconclusivos, ou mesmo não terem precisado que os lançamentos inautênticos; partiram do punho subscritor da denunciada, tem-se que o Laudo de fls. 252/8, o qual apontou a semelhança havida entre as impressões digitais de Berenice Tavares de Mello e de Sueli Aparecida Grandin Regulin, soterrou de vez qualquer dúvida a respeito da autoria delitiva. Com efeito, conforme demonstra o documento de fl. 281, as supostas Berenice Tavares de Mello e Sueli Aparecida Grandin Regulin são, na verdade, ROSELI MIRIAM DE OLIVEIRA, a qual também se utilizava indevidamente, dos seguintes nomes para praticar crimes: Deise Borges, Márcia Janet Alves da Silva e Rossana Rossi Pantaleão. Ademais, a Cadeia Pública de Ribeirão Bonito/SP, após receber cópia da CIRG inautêntica em nome de Berenice Tavares de Mello (fl. 80), informou que a pessoa retratada é ROSELI MIRIAM DE OLIVEIRA, que lá esteve recolhida até 31/10/2013 quando foi solta por decisão oriunda do Juízo da 1ª' Vara Federal de São Carlos/SP. Não só. Como se nota a partir de fls. 329 e 332, Cícera Alves Bispo dos Santos (CPF nº 045.641.438-08) e Jesuína Maria da Silva (CPF nº 984.527.208-82), beneficiárias das transferências bancárias fraudulentas (TEDs) posteriores à efetivação dos empréstimos consignados em nome de Berenice e Rossana, são, também, nomes falsos utilizados por ROSELI MIRIAM DE OLIVEIRA para o cometimento de crimes Na fase inquisitorial, apesar de ter comparecido à Polícia Federal em Piracicaba/SP, ROSELI MIRIAM DE OLIVEMA preferiu permanecer em silêncio, recusando-se a fornecer material gráfico para a realização de perícia grafotécnica, bem como não se deixou fotografar (oitiva à fl. 269; certidão lavrada por escrivão de Polícia Federal à fl. 275). (...)
Sentença de improcedência da pretensão punitiva Estatal publicada em 02.08.2022 (ID 267686623), proferida pela Exma. Juíza Federal Caroline Scofield Amaral, da 2ª Vara Federal de São Carlos/SP, para absolver ROSELI MIRIAM DE OLIVEIRA da imputação da prática dos crimes do artigo 171, caput e §3º, do Código Penal, por seis vezes, e no artigo 304 c.c. o artigo 297, do Código Penal, por duas vezes, todos em concurso material, na forma do artigo 386, inciso VII, do Código Penal.
Apelação interposta pelo órgão ministerial (ID 267686625) requerendo a condenação da ré pelos delitos imputados na denúncia, eis que devidamente comprovada a autoria delitiva.
Contrarrazões de Apelação apresentadas pela defesa de ROSELI MIRIAM DE OLIVEIRA (ID 267686630).
Nesta instância, a Procuradoria Regional da República emitiu parecer (ID 267883153) pelo provimento do Apelo da acusação.
É o relatório.
À revisão.
PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região11ª Turma
APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0002785-39.2016.4.03.6115
RELATOR: Gab. 38 - DES. FED. FAUSTO DE SANCTIS
APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP
APELADO: ROSELI MIRIAM DE OLIVEIRA
Advogados do(a) APELADO: MAURICIO MACCHI - SP311138-A, VICENTE PENEZZI JUNIOR - SP57793-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O DESEMBARGADOR FEDERALFAUSTO DE SANCTIS:
À ré ROSELI MIRIAM DE OLIVEIRA foi imputada a prática dos crimes do artigo 171, caput e §3º, do Código Penal, por seis vezes, e artigo 304 c.c. o artigo 297, do Código Penal, por duas vezes, todos em concurso material.
De acordo com denúncia, a acusada, utilizando-se de CPF e Cédula de Identidade falsos, fez abertura de conta corrente em agências da Caixa Econômica Federal, em nome de Berenice Tavares de Mello e Rossana Rossi Pantaleão, recebendo parcelas de benefícios previdenciários a elas destinados, causando prejuízo ao INSS, bem como efetuou empréstimos consignados em nome de Berenice Tavares de Mello e Rossana Rossi Pantaleão, causando prejuízo a Caixa Econômica Federal (CEF).
BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE O DELITO DE ESTELIONATO
O art. 171, §3º, do Código Penal, assim dispõe:
Art. 171: Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento:
Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa.
(...)
§ 3º - A pena aumenta-se de um terço, se o crime é cometido em detrimento de entidade de direito público ou de instituto de economia popular, assistência social ou beneficência.
Trata-se de uma modalidade especial de estelionato, praticado contra entidades de direito público ou institutos de economia popular, assistência social ou beneficência (tais como a Caixa Econômica Federal e o INSS, por exemplo), de modo que é maior a reprovabilidade da conduta, já que tais entes prestam serviços fundamentais à sociedade, razão pela qual a lei prevê, para essa hipótese, uma causa especial de aumento de pena a ser considerada na terceira fase da dosimetria da pena.
Para a caracterização do crime de estelionato, devem estar presentes três requisitos fundamentais, quais sejam: I) o emprego de meio fraudulento, de que são exemplos o artifício (recurso engenhoso/artístico) e o ardil (astúcia, manha ou sutileza), ambos espécie do gênero fraude; II) o induzimento ou manutenção da vítima em erro; III) a obtenção, em prejuízo alheio, de vantagem ilícita (economicamente apreciável), sem o que não se há de falar em consumação deste delito.
A respeito do primeiro requisito (emprego de meio fraudulento), é relevante mencionar que, ontologicamente, não se há de falar em distinção entre fraude penal e fraude civil, já que não há diferenças estruturais entre estas. Com efeito, não existe diferença entre a fraude civil e a fraude penal. Só há uma fraude. Trata-se de uma questão de qualidade ou grau, determinado pelas circunstâncias da situação concreta. Elas é que determinam se o ato do agente não passou de apenas um mau negócio ou se neles estão presentes os requisitos do estelionato, caso em que o fato será punível penalmente (TJRS, AP. Crim. 70013151618, 7ª Câm. Crim., Rel Sylvio Baptista Neto, j. 22.12.2005).
É possível que haja um comportamento ilícito e, todavia, circunscrito à esfera civil. Assim, por força dos princípios da intervenção mínima e da fragmentariedade, é necessário, para a caracterização do crime de estelionato, que o agente tenha o dolo como fim especial de agir, sendo imprescindível a consciência, a vontade de enganar, ludibriar, com objetivo de obter vantagem ilícita em detrimento da vítima. É a presença do dolo que distinguirá uma conduta penalmente relevante daquela situação em que, por exemplo, o agente age com boa-fé, sem a intenção de enganar, mas, por motivos diversos, acaba por cometer um ilícito civil. Atente-se que se, por um lado, não se pode adentrar a consciência do indivíduo, por outro, é possível aferir a presença do elemento anímico a partir de fatores externos, ou seja, dos detalhes e circunstâncias que envolvem os fatos.
Ademais, ainda tratando da fraude como elemento central do delito de estelionato, é importante falar sobre a frequente hipótese em que a falsidade documental é o meio empregado para se obter êxito na empreitada criminosa. Neste caso, em observância ao princípio da consunção, deve prevalecer o entendimento de que o crime-meio (falsidade documental) deverá ser absorvido pelo crime-fim (estelionato), desde que, depois da utilização do documento falso para obtenção de vantagem ilícita, não reste qualquer potencialidade ofensiva, nos termos da súmula n.º 17 do Superior Tribunal de Justiça, in verbis:
Quando o falso se exaure no estelionato, sem mais potencialidade lesiva, é por este absorvido.
A respeito do segundo requisito (induzimento ou manutenção da vítima em erro), é relevante mencionar que o erro é a consequência provocada pela fraude e que, em se constatando que a fraude não foi suficientemente hábil para provocar ou manter em erro a vítima (fraude grosseira), deverá haver, em princípio, o reconhecimento da hipótese de crime impossível, por absoluta ineficácia do meio ou absoluta impropriedade do objeto (inteligência do art. 17 do CP).
Já a respeito do terceiro requisito (obtenção, em prejuízo alheio, de vantagem ilícita), cabe consignar que, em sendo o estelionato um crime material e de dano, sua consumação se dará com a efetiva obtenção da vantagem, isto é, a partir do momento em que a coisa passar da esfera de disponibilidade da vítima para a do infrator (ou de terceiro).
Além disso, não se deve perder de vista que a vantagem obtida pelo agente deve ser ilícita, ou seja, contrária ao ordenamento, uma vez que, se a vantagem for devida, ficará descaracterizado o delito de estelionato, podendo haver, por exemplo, a desclassificação para o delito de exercício arbitrário das próprias razões, nos termos do artigo 345 do CP.
Feitas essas breves considerações, passa-se à análise dos fatos descritos na presente ação penal.
MATERIALIDADE, AUTORIA E ELEMENTO SUBJETIVO
Conforme já disposto em sentença, e sem insurgência das partes, a materialidade restou devidamente comprovada nos autos:
A materialidade restou demonstrada pelos documentos falsos de abertura de contas, contratos de empréstimos e pelas informações prestadas pela Caixa Econômica Federal, constantes do IPL (Id 38900087).
Com efeito, em 20/06/2012, uma senhora se dirigiu à Caixa Econômica Federal em Pirassununga/SP, e mediante o uso da cédula de identidade falsa de Id. 38900087, fls. 20, abriu a conta corrente de Id. 38900087, fls. 18/19, solicitando que os benefícios previdenciários pagos a Berenice Tavares de Mello fossem transferidos para a conta recentemente aberta.
Já no dia 24/07/2012, a mesma senhora retornou ao banco e obteve empréstimo consignado no valor de R$ 22.092,34 (vinte e dois mil e noventa e dois reais e trinta e quatro centavos) em nome de Berenice Tavares de Mello.
No dia 07/08/2012, a pessoa recebeu uma parcela do benefício previdenciário de aposentadoria por invalidez de Berenice Tavares de Mello, no valor de R$ 3.051,08 (três mil, cinquenta e um reais e oito centavos), na conta corrente irregularmente aberta (cf. Id. 38900087, fls. 15).
Através do documento de Id. 38901820, fls. 66, a Caixa Econômica Federal informou que o empréstimo consignado, obtido fraudulentamente em nome de Berenice Tavares de Mello, foi sacado parte em espécie e parte transferido via TED para Cícera Alves Bispo dos Santos.
Em relação a Rossana Rossi Pantaleão, em 31/05/2012, uma mulher se dirigiu à Caixa Econômica Federal em São Carlos/SP, e mediante o uso da cédula de identidade e do CPF falsos de Id. 38889741, fls. 10, abriu a conta corrente de Id. 38889741, fls. 6/7, solicitando que os benefícios previdenciários pagos a Rossana fossem transferidos para a conta recentemente aberta.
No dia 21/06/2012, a mesma senhora retornou ao banco e obteve ilicitamente empréstimo consignado no valor de R$ 22.620,00 (vinte e dois mil, seiscentos e vinte reais) em nome de Rossana Rossi Pantaleão (Id. 38889741 – Pág. 13/19).
Já nos 06/07/2012, 07/08/2012 e 10/09/2012, uma senhora recebeu três parcelas do benefício previdenciário de aposentadoria por invalidez de Rossana Rossi Pantaleão, no valor total de R$ 7.287,98 (sete mil, duzentos e oitenta e sete reais e noventa e oito centavos), na conta corrente irregularmente aberta (cf. Id. 38889741 – Pág. 38).
Através do documento de 38901820 – Pág. 61, a Caixa Econômica Federal informou que o empréstimo consignado, obtido fraudulentamente em nome de Rossana Rossi Pantaleão, foi parcialmente transferido via TED para Jesuína Maria da Silva.
Com efeito, Rossana Rossi Pantaleão e Berenice Tavares de Mello foram ouvidas em juízo (Id 45465374 45465364) e confirmaram que não solicitaram a transferência de seus benefícios previdenciários ou contrataram qualquer espécie de crédito consignado.
No que concerne à autoria, contudo, a ré ROSELI MIRIAM DE OLIVEIRA foi absolvida ante a fundamentação de ausência de comprovação da prática dos delitos a ela atribuídos. Por sua vez, em razões de Apelação, o órgão ministerial aduz que há provas nos autos de que a acusada efetivamente praticou os crimes do artigo 171, caput e §3º, do Código Penal, e artigo 304 c.c. o artigo 297, do Código Penal, imputados na denúncia.
Nestes termos, passemos a explanar sobre a autoria delitiva:
O inquérito policial de n.º 347/2013 foi inicialmente instaurado para a apuração dos crimes de uso de documento falso e estelionato, praticados por pessoa desconhecida, que, se passando por Berenice Tavares de Mello (ID 267686375 – fl. 20), fez abertura de uma conta bancária na Agência da CEF em Pirassununga/SP, transferindo o local de recebimento do benefício previdenciário de Berenice, bem como efetuou contrato de empréstimo bancário, induzindo ou mantendo em erro o ente público e auferindo vantagem indevida, emitindo declaração falsa com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade.
Ao longo da instrução criminal apurou-se que pessoa desconhecida, utilizando-se da mesma fotografia e com a mesma digital, falsificou e/ou usou RGs e CPFs falsos também em nome de Sueli Aparecida Grandin Regulin (ID 267686376 – fl. 35), Márcia Janet Alves da Silva (ID 267686376 – fl. 65), Deise Borges (ID 267686377 – fl. 06), Ana Maria Benzatti Gonçalves (ID 267686378 – fl. 58), Jesuína Maria da Silva (ID 267686378 – fl. 88), Cícera Alves Bispo dos Santos (ID 267686378 – fl. 91) e Rossana Rossi Pantaleão (ID 267686534 – fl. 10), praticando crimes similares nas cidades de Pirassununga, Araraquara, Botucatu, Presidente Prudente e São Carlos, pressupondo, a autoridade policial, que os crimes tivessem sido cometidos pela mesma falsária.
Na tentativa de identificação de citada pessoa consta que, em resposta a ofício, o Delegado de Polícia Reinaldo Lopes Machado, da Cadeia Pública de Ribeirão Bonito/SP (ID 267686375 – fl. 93) informou que a pessoa que se encontra na foto da cédula de identidade encaminhada a esta Repartição Policial, deu entrada a esta cadeia em data de 26/06/2013, oriunda da congênere de Porto Ferreira, onde foi presa em flagrante delito, por infração aos arts. 299 e 304 do C.P.B., com o nome de ROSELI MIRIAM DE OLIVEIRA, conforme cópia de RDO 1901/2013, que segue em anexo, e permaneceu recolhida até 31/10/2013, quando foi colocada em liberdade mediante Alvará de Soltura (...).
Dos documentos anexados pelo Delegado de Polícia de Ribeirão Bonito/SP, consta: (1) Boletim de Ocorrência lavrado em 26.06.2013 (ID 267686375 – fls. 94/97), onde os policiais civis narraram que foram acionados até à Agência da Caixa Federal, tendo em vista terem sido acionados pelo gerente local, acima qualificado, o qual narrou que a indiciada abriu uma conta corrente n.º 001 00023405-4, em nome de EDNA GOMES DA SILVA, no mês de maio do corrente ano. Que, nesta data, a indiciada compareceu na agência onde quis fazer um empréstimo com os dados da mesma pessoa. O gerente narra que acabou desconfiando que seria uma fraude, através dos documentos apresentados pela indiciada RG e CPF, em nome de EDNA GOMES DA SILVA, uma vez que a agência possuía numeração de espelhos do IIRGD, através da segurança do banco, com informação que estavam bloqueados. Narram os Policiais que a indiciada ainda possui um benefício de aposentadoria junto à Previdência Social sob número 131937269-1 também em nome de EDNA GOMES DA SILVA. (...) A indiciada alega que comprou o RG e CPF no centro da cidade de Piracicaba de pessoa desconhecida (...).Os documentos RG, CPF em nome da parte EDNA, bem como o cartão bancário da Caixa Federal foram apreendidos em campo próprio; (2) Alvará de Soltura Clausulado em nome de ROSELI MIRIAM DE OLIVEIRA, expedido pelo juízo da 1ª Vara Federal de São Paulo, nos autos do processo de n.º 0001406-68.2013.403.6115 (ID 267686375 – fl. 98); Cópia de sentença penal condenatória, nos citados autos (ID 267686375 – fls. 99/102 e ID 267686376 – fls. 01/07).
Destaca-se que citados documentos (RG e CPF falsos em nome de Edna Gomes da Silva) não foram juntados aos autos.
Quanto à identificação de ROSELI MIRIAM DE OLIVEIRA, foram anexados ao inquérito policial cópia de ficha do Instituto de Identificação Ricardo Gumblenton Daunt – IIRGD (ID 267686377 – fls. 65/66) e Ficha de Identificação da acusada por ocasião de sua prisão na Cadeia Pública de Ribeirão Bonito/SP (ID 267686377 – fls. 76/78), esta última contendo apenas as digitais, sem fotografia.
Em interrogatório policial (ID 267686378 – fl. 22), ROSELI MIRIAM DE OLIVEIRA, acompanhada de advogado nomeado, optou pelo direito constitucional de permanecer em silêncio, bem como negou-se em ser fotografada e a fornecer material gráfico, apresentando, contudo, seu documento de identidade, cuja cópia foi anexada aos autos (ID 267686378 – fl. 24).
Dos laudos técnicos realizados nos autos podemos citar:
1) Exame de Confronto de Impressões Papilares em Documentos, realizado pelo Núcleo de Identificação da Polícia Federal em Araraquara (ID 267686378 – fls. 05/07) - concluindo que as impressões digitais dos documentos falsos em nome de Berenice Tavares de Mello e Sueli Aparecida Grandin Regulin foram feitas pela mesma pessoa.
2) Laudo de Perícia Criminal Federal (Documentoscopia) realizado pela Unidade Técnico-Científico da Polícia Federal em Ribeirão Preto (ID 267686378 – fls. 103/111 e ID 267686378 – 01/15) comparando a assinatura da ré ROSELI MIRIAM DE OLIVEIRA na Ficha de Identificação do IIRGD, bem como sua assinatura na procuração firmada ao seu advogado (ID 267686378 – fl. 29), com as cópias dos documentos bancários assinados pela falsária (ou falsárias), constatou-se que existem convergências e divergências morfológicas entre as assinaturas questionadas em nome de Berenice Tavares de Mello e as assinaturas padrão. As divergências ocorreram em aspectos como inclinação, alinhamento em relação à linha de pauta, predomínio de valores angulares e curvilíneos. A escassez de padrões, bem como as limitações já mencionadas em relação aos padrões apresentados, leva os Peritos a concluir como nível III (não conclusivo) da escala apresentada em IV.1.1 - Formulação da conclusão. Não é possível determinar se as assinaturas em nome de Berenice Tavares de Mello partiram ou não do punho de Roseli Miriam de Oliveira.(...) Com relação ao confronto entre questionados citados na aliada, "d", da subseção II.1, em nome de Rossana Rossi Pantaleão e padrões, observa-se no quadro 3 que existem convergências entre os questionados e o padrão, porém essas convergências não ocorrem em quantidade e qualidade suficientes para que se possa determinar a autoria dos lançamentos. A conclusão dos Peritos é a mesma adotada para as assinaturas até o momento - não conclusivo.
3) Exame de Confronto de Impressões Papilares em Documentos, realizado pelo Núcleo de Identificação da Polícia Federal em Araraquara (ID 267686536 – fls. 43/47), comparando a impressão digital da cédula de identidade de ROSELI MIRIAM DE OLIVEIRA (denominado como item II – impressão padrão), com as impressões digitais das cédulas de identidade falsas em nome de Berenice Tavares Mello e Rossana Rossi Pantaleão (denominado como item I) concluiu que no exame de confronto entre os datilogramas apostos nos documentos descritos no item I e o datilograma aposto no item II, o signatário constatou que eles NÃO APRESENTAM pontos característicos coincidentes quanto à forma, direção e sentido de suas estruturas formadoras de suas linhas papilares. Portanto, as impressões questionadas não foram produzidas pelo mesmo dedo que produziu a impressão padrão.
4) Laudo Prosopográfico - Exame de Comparação de Imagens Faciais realizado pelo Núcleo de Identificação da Polícia Federal em São Paulo (ID 267686533 – fls. 11) comparando imagens faciais extraídas do arquivo de vídeo (interrogatório judicial de ROSELI MIRIAM DE OLIVEIRA nos autos do processo de n.º n.º 0001406-68.2013.403.6115 – ID 267686539) e cópias das carteiras de identidades falsas de Berenice Tavares de Mello e Jesuína Maria da Silva concluindo que as imagens analisadas, conforme demonstrado, possuem relevantes compatibilidades nas suas características gerais e específicas (Exame Anatômico - Morfológico), sem deixar de considerar a possível diferença de expressão e do ângulo que que foram tiradas as imagens Padrão e Questionada. Considerando, sobretudo, a baixa qualidade de resolução nas imagens Padrão e Questionada, impossibilitando o exame de elementos individualizadores, conclui este signatário que as imagens analisadas possuem compatibilidade moderada, sugerindo a possibilidade de serem relativas a uma mesma pessoa.
Em juízo, colheu-se apenas os depoimentos de Berenice Tavares de Mello e Rossana Rossi Pantaleão que, a despeito de corroborarem as provas da materialidade delitiva, nada acrescentaram sobre a autoria.
Importante destacar que foram juntados aos autos do inquérito, relatório advindo de outro inquérito policial, de n.º 49/2013 (ID 267686378 – FL. 76/78), instaurado na Delegacia da Polícia Federal de Piracicaba/SP, para apurar a suposta prática do crime de estelionato em face da CEF, consistente na abertura de conta corrente junto a agência Prada, em Limeira/SP, mediante apresentação de documento falso em nome de GERALDO DE OLIVEIRA SILVA. O verdadeiro GERALDO DE OLIVEIRA SILVA (fls. 18), ao tomar conhecimento de que a sua aposentadoria havia sido transferida para outro banco, tomou a iniciativa de registrar um boletim de ocorrência e verificar junto ao banco CEF o que havia acontecido (fls. 19/20). As fls. 24 constam documentos relacionados a abertura de conta corrente junto a agência Prada, da CEF, em especial a cópia do documento de identidade falso em nome de GERALDO DE OLIVEIRA SILVA (reproduzido às fls. 11). O número do RG falso de fls. 11 pertence ao RG de FABIO AGRIPINO DE LIMA, o qual não se parece em nada com a fotografia aposta no documento falso (fls. 30 e 88). Foram realizadas diligências para tentar localizar e identificar a pessoa que se passou por GERALDO DE OLIVEIRA SILVA, porém ainda não foi possível chegar a algum resultado (ver fls. 81 e 87). Com base no extrato bancário da conta aberta em nome de GERALDO DE OLIVEIRA SILVA ( fls. 44159), foi possível identificar uma transferência entre contas para a pessoa de AROLDO GHERT (fis. 44). AROLDO GHERT, ouvido em sede policial (fls. 99), disse que foi vítima do mesmo golpe, ou seja, um indivíduo, se passando por ele, abriu uma conta bancária junto ao Banco do Brasil para que pudesse receber a sua aposentadoria. Às fls. 125/133 constam documentos relacionados a abertura da conta corrente em nome de AROLDO GHERT, onde verifica-se que ele foi vítima do mesmo indivíduo que aplicou o golpe em GERALDO DE OLIVEIRA SILVA (os RG de fls. 11 e12 contém a mesma fotografia). (...)
Analisando as informações coletadas tanto em sede policial quanto em juízo, pode-se concluir que diversos crimes foram praticados especificamente no interior de São Paulo, tendo o mesmo “modus operandi”, falsificação de documentos de identificação, abertura de conta corrente em agências da Caixa Econômica Federal e Banco do Brasil, transferência para respectiva conta de benefício previdenciário de terceiros e realização de empréstimos consignados.
Da documentação apresentada às agências da Caixa Econômica Federal, nota-se que os falsários, além dos documentos de identificação falsos, juntavam comprovante de residência e comprovante de recebimento de benefício previdenciário (Detalhamento Crédito Benefício Previdenciário).
Portanto, os crimes foram praticados de maneira muito bem estruturada e complexa, vislumbrando estar-se diante de uma possível associação criminosa.
Quanto à ré ROSELI MIRIAM DE OLIVEIRA, a despeito de ter sido presa em flagrante por delito bastante similar, apurado nos autos de n.º 0001406-68.2013.403.6115, não há qualquer comprovação de que tenha efetivamente participado dos delitos imputados nos autos.
Destaca-se que Laudo de Perícia Criminal Federal (ID 267686378 – fls. 103/111 e ID 267686378 – 01/15) concluiu pela impossibilidade de determinar se as assinaturas em nome de Berenice Tavares de Mello e Rossana Rossi Pantaleão partiram ou não do punho de ROSELI MIRIAM DE OLIVEIRA e o Exame de Confronto de Impressões Papilares em Documentos (ID 267686536 – fls. 43/47) concluiu que a impressão digital nas cédulas de identidade falsas em nome de Berenice Tavares de Mello e Rossana Rossi Pantaleão não foi produzida por ROSELI MIRIAM DE OLVEIRA.
Por fim, quanto à informação do Delegado de Polícia Reinaldo Lopes Machado, não se pode descartar a possibilidade de a cédula de identidade utilizada pela ré, ao se passar por Edna Gomes da Silva, seja a mesma cédula utilizada nos demais delitos, como no caso de Berenice Tavares de Mello e Rossana Rossi Pantaleão, contudo, citados documentos (RG e CPF falsos em nome de Edna Gomes da Silva) não foram juntados aos autos para melhor averiguação.
Nestes termos, apenas o laudo prosopográfico apontando compatibilidade moderada entre as imagens faciais extraídas do arquivo de vídeo da acusada, com as fotografias das carteiras de identidades falsas, sugerindo a possibilidade de serem relativas a uma mesma pessoa, não é suficiente para comprovar a autoria delitiva, pois, ainda que fosse constatado que a foto nos documentos falsificados é de ROSELI MIRIAM DE OLIVEIRA, não há qualquer comprovação de que citado documento falso tenha sido utilizado pela própria ré para a prática dos delitos imputados na denúncia.
A doutrina é firme a respeito da certeza na convicção do julgador ao emitir decreto condenatório. Confira-se sobre o assunto, os comentários de Guilherme de Souza Nucci ao artigo 386 do Código de Processo Penal (in Código de Processo Penal Comentado. Editora Forense, 16ª edição, maio 2017, p. 914): Com efeito, a prova para condenação criminal deve ser cabal, isenta de dúvidas. Mostrando-se incerta, torna-se imperiosa a absolvição.
Nesse sentido, é o entendimento sufragado nesta E. Corte:
PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. ESTELIONATO MAJORADO. AUTORIA NÃO COMPROVADA. ABSOLVIÇÃO MANTIDA. 1. Pelo princípio do livre convencimento, o juiz forma sua convicção em razão de todo o conjunto probatório, que deve ser robusto o suficiente para permitir a conclusão acerca da autoria do crime e do dolo. No caso, não é possível dizer, sem sombra de dúvidas, que as provas são suficientes para uma condenação. Assim, inexistindo nos autos elementos que permitam atestar, com segurança e além de qualquer dúvida razoável, a autoria do estelionato por parte da apelada, aplica-se ao caso o princípio in dubio pro reo, como feito na sentença, mantendo-se a sua absolvição. 2. Apelação não provida. (Proc. 0004245-65.2014.403.6104, relator Desembargador Federal Nino Toldo, 11ª Turma, julgado em 27.05.2022, publicado em 31.05.2022)
Vale frisar que, se durante a fase inquisitorial vige o princípio do in dubio pro societate, para a imposição de juízo condenatório, é imprescindível a certeza do preenchimento de todos os requisitos indispensáveis para a configuração do delito. Meros indícios ou conjecturas não bastam para um decreto condenatório, que deve se alicerçar em provas robustas. Aplicável, portanto, o princípio in dubio pro reo.
Por conseguinte, é o caso de manter a absolvição da acusada ROSELI MIRIAM DE OLIVEIRA da imputação da prática do delito previsto os crimes do artigo 171, caput e §3º, do Código Penal, e artigo 304 c.c. o artigo 297, do Código Penal, nos termos do artigo 386, inciso VII (não existir prova suficiente para a condenação), do Código de Processo Penal.
DISPOSITIVO
Diante do exposto, voto por NEGAR PROVIMENTO à Apelação do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, na forma da fundamentação.
É o voto.
E M E N T A
PENAL. PROCESSO PENAL. USO DE DOCUMENTO FALSO E ESTELIONATO MAJORADO. ABERTURA DE CONTA CORRENTE, TRANSFERÊNCIA DE PAGAMENTO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO EM NOME DE TERCEIROS E CONTRATAÇÃO DE EMPRÉSTIMOS CONSIGNADOS. AUTORIA NÃO COMPROVADA. ABSOLVIÇÃO MANTIDA.
- O inquérito policial foi inicialmente instaurado para a apuração dos crimes de uso de documento público falso e estelionato majorado praticados por pessoa desconhecida, que, se passando por uma segurada do INSS fez abertura de uma conta bancária na Agência da CEFem Pirassununga/SP, ransferindo o local de recebimento do benefício previdenciário da segurada, bem como efetuou contrato de empréstimo bancário, induzindo ou mantendo em erro o ente público e auferindo vantagem indevida, emitindo declaração falsa com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade. Ao longo da instrução criminal apurou-se que pessoas desconhecidas, utilizando-se da mesma fotografia e com a mesma digital, falsificaram e/ou usaram RGs e CPFs falsos também em nome de outras pessoas praticando crimes similares, com o mesmo “modus operandi” em cidades do interior do Estado de São Paulo.
- Da documentação apresentada às agências da Caixa Econômica Federal, nota-se que os falsários, além dos documentos de identificação falsos, juntavam comprovante de residência e comprovante de recebimento de benefício previdenciário (Detalhamento Crédito Benefício Previdenciário). Portanto, os crimes foram praticados de maneira muito bem estruturada e complexa, vislumbrando estar-se diante de uma possível associação criminosa.
- No que concerne à ré, a despeito de ter sido presa em flagrante por delito bastante similar, apurado nos autos de n.º 0001406-68.2013.403.6115, não há qualquer comprovação de que tenha efetivamente participado dos delitos imputados nos presentes autos.
- Vale frisar que, se durante a fase inquisitorial vige o princípio do in dubio pro societate, para a imposição de juízo condenatório, é imprescindível a certeza do preenchimento de todos os requisitos indispensáveis para a configuração do delito. Meros indícios ou conjecturas não bastam para um decreto condenatório, que deve se alicerçar em provas robustas. Aplicável, portanto, o princípio in dubio pro reo. Mantida a absolvição.
- Apelação do Ministério Público Federal a que se nega provimento.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Primeira Turma, por unanimidade, decidiu NEGAR PROVIMENTO à Apelação do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.