APELAÇÃO CRIMINAL. ART. 171, §3º DO CP C/C ART. 14, II DO CP. TENTATIVA DE ESTELIONATO PREVIDENCIÁRIO. REQUERIMENTO DE AUXÍLIO-DOENÇA. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO DEMONSTRADOS. RECURSO PROVIDO
Ementa:
APELAÇÃO CRIMINAL. ART. 171, §3º DO CP C/C ART. 14, II DO CP. TENTATIVA DE ESTELIONATO PREVIDENCIÁRIO. REQUERIMENTO DE AUXÍLIO-DOENÇA. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO DEMONSTRADOS. RECURSO PROVIDO.
O réu protocolou requerimento de auxílio-doença em 13/11/2012, sob nº 31/554.167.816-8, junto à agência do INSS em Porto Ferreira/SP. Na data agendada para a perícia, outra pessoa apresentou-se à médica do INSS, passando-se pelo réu. Na ocasião, esse indivíduo não identificado, agindo em conluio com o réu, apresentou uma carteira de identidade constando os dados qualificativos do denunciado, todavia com fotografia e número diversos. A médica perita atestou a incapacidade laborativa em razão de fratura do braço – CID S42, e o benefício foi concedido.
Em 11/12/2012, o réu compareceu à agência do Banco Bradesco, na cidade de Porto Ferreira/SP, com o intuito de sacar a parcela do benefício de auxílio-doença. No entanto, em razão da divergência do número do RG constante da carta de concessão e o documento apresentado pelo apelado, o pagamento não foi realizado.
O conluio entre o réu e a pessoa que se apresentou na perícia em seu lugar está bem demonstrado. O indivíduo que foi submetido ao exame pericial possuía uma lesão ortopédica capaz de configurar incapacidade laborativa. Assim, passando-se pelo réu, apresentou à médica perita do INSS cédula de identidade falsa em nome do apelado, obtendo, dessa forma, o deferimento do benefício previdenciário.
O dolo é evidente, uma vez que o denunciado pretendia receber as parcelas do auxílio-doença mediante fraude, uma vez que não foi examinado pelo médico perito do INSS em Porto Ferreira/SP e não apresentava a fratura no braço que acarretou o reconhecimento da incapacidade laborativa.
Recurso provido para condenar o réu pela prática do crime previsto no art. 171, §3º do CP na forma do art. 14, II do CP.
Pena definitivamente fixada em 10 meses e 20 dias de reclusão, em regime inicial aberto, além de 10 dias multa no valor unitário equivalente a 1/30 do salário mínimo vigente ao tempo do fato, substituída a pena privativa de liberdade por uma pena de prestação de serviços à comunidade.
Apelação do Ministério Público Federal provida.
(TRF 3ª Região, 11ª Turma, ApCrim - APELAÇÃO CRIMINAL - 0001086-13.2016.4.03.6115, Rel. JOSE MARCOS LUNARDELLI, julgado em 15/03/2024, Intimação via sistema DATA: 18/03/2024)
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PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região
11ª Turma
APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0001086-13.2016.4.03.6115
RELATOR: Gab. 39 - DES. FED. JOSÉ LUNARDELLI
APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL
APELADO: FRANCISCO GUTEMBERG DO NASCIMENTO DELMONDES
Advogados do(a) APELADO: ADEMARO MOREIRA ALVES - SP436728-A, CLEIDSON MOURA DE ALMEIDA - SP365400-N
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região11ª Turma
APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0001086-13.2016.4.03.6115
RELATOR: Gab. 39 - DES. FED. JOSÉ LUNARDELLI
APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL
APELADO: FRANCISCO GUTEMBERG DO NASCIMENTO DELMONDES
Advogado do(a) APELADO: ADEMARO MOREIRA ALVES - SP436728-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI
Trata-se de apelação criminal interposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL em face da sentença proferida pelo Juízo da 2ª Vara Federal de São Carlos/SP, que absolveu o réu da imputação do delito previsto no art. 171, §3º c/c art. 14, II do CP, com fundamento no art. 386, VII do CPP.
Narra a denúncia (ID 282983348 – pag. 3/7):
“Consta do incluso inquérito policial que, no dia 11/12/2012, nas dependências da agência do Banco Bradesco S/A situada na cidade de Porto Ferreira/SP, FRANCISCO GUTEMBERG DO NASCIMENTO DELMONDES, conluiado com pessoa não identificada, tentou obter, para si, vantagem ilícita, consistente no saque de parcela de auxílio-doença previdenciário, em prejuízo do INSS, induzindo em erro essa Autarquia Previdenciária, mediante fraude prévia caracterizada pelo ludibrio de médica perita, só não consumando o crime por circunstâncias alheias à sua vontade.
Conforme apurado, o denunciado efetuou requerimento de concessão de benefício previdenciário de auxílio-doença, protocolizado sob o nº 31/554.167.816-8, à agência do INSS situada em Porto Ferreira/SP. No dia da realização da perícia, ocorrida aos 22/11/2012, pessoa ainda não identificada, passando-se pelo increpado, apresentou-se à médica do INSS, Dra. Marta Fabiane Gouvea Barioni, portando a cédula de identidade RG nº 21.209.662-X. Outrossim, os dados qualificativos do documento eram idênticos aos do denunciado, embora a foto aposta no documento falsificado não pertencesse a FRANCISCO GUTEMBERG Do NASCIMENTO DELMONDES. A médica perita, desconhecendo examinar pessoa que se passava por FRANCISCO GUTEMBERG, entendeu pela existência de incapacidade laborativa, concedendo o benefício previdenciário pleiteado.
Aos 11/12/2012, FRANCISCO GUTEMBERG DO NASCIMENTO DELMONDES compareceu à agência do Banco Bradesco S/A com a finalidade de efetuar o saque da primeira parcela do benefício previdenciário concedido. Entretanto, referida agência bancária recusou o pagamento apontando a divergência entre o número do RG 21.209.662-X, constante da carta de concessão, e aquele apresentado pelo denunciado naquele momento (RG nº 55.236.749-7).
Incontinenti, FRANCISCO GUTEMBERG dirigiu-se à agência do INSS em Porto Ferreira/SP para informar que não conseguira sacar o benefício junto ao banco. Porém, servidores do órgão constataram que o RG nº 55.236.749-7, que o denunciado possuía em mãos, não correspondia àquele apresentado no momento da habilitação e no instante da perícia médica, não obstante todos os dados qualificativos de ambos serem iguais, excetuando-se a fotografia do segurado, o número do documento e a data de sua emissão.
Ante o ocorrido, a Autarquia Previdenciária formalizou termo de depoimento do denunciado (fls. 23/4), que não soube explicar o ocorrido. Contudo, chamou a atenção dos servidores do INSS o fato de o increpado ter dito que a perícia fora realizada por médico do sexo masculino - quando, na verdade, foi realizada por médica -e que seu afastamento seria motivado por complicações na coluna cervical e lombar, enquanto, na perícia, o afastamento fora motivado por fratura do ombro e do braço do periciando (fls. 26/7). O denunciado disse também em seu termo de depoimento que, apesar de residir em São Paulo, requereu o benefício em Porto Ferreira porque estaria visitando um primo. Disse, inclusive, que o atendimento havia sido agendado por sua esposa.
O Instituto de Identificação Ricardo Gumbleton Daunt - IIRGD informou que o RG nº 21.209.662-X não pertence ao denunciado, mas sim a Diógenes da Silva. De acordo com as informações de fls. 77 e 169, nenhuma parcela do benefício previdenciário foi efetivamente paga.
Ante o exposto, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL denuncia a Vossa Excelência FRANCISCO GUTEMBERG DO NASCIMENTO DELMONDES, como incurso nos art. 171 caput e 3º, c/c art. 14. II, e 29, todos do Código Penal”.
Denúncia recebida em 17/03/2016 (ID 282983348 – pag. 9/11).
Em 20/06/2017 foi determinada a suspensão condicional do processo, nos termos do art. 89 da Lei 9.099/95, pelo prazo de dois anos (ID 282983348 – pag. 57).
Decisão proferida em 21/02/2022 revogando o benefício da suspensão condicional do processo em razão do descumprimento das condições impostas (ID 282983445).
Após regular instrução, o Juízo da 2ª Vara Federal de São Carlos proferiu a sentença ID 282983614, publicada em 17/07/2023, por meio da qual absolveu FRANCISCO GUTEMBERG DO NASCIMENTO DELMONDES da imputação do crime previsto no art. 171, §3º do CP, com fundamento no art. 386, VII do CPP.
O Ministério Público Federal interpôs apelação objetivando a reforma da sentença para que o réu seja condenado pela prática do crime descrito na denúncia (ID 282983617).
Contrarrazões pelo desprovimento do recurso (ID 282983629).
Nesta Corte, a Procuradoria Regional da República opinou pelo provimento da apelação ministerial (ID 283631034).
É o relatório.
À revisão.
PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região11ª Turma
APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0001086-13.2016.4.03.6115
RELATOR: Gab. 39 - DES. FED. JOSÉ LUNARDELLI
APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL
APELADO: FRANCISCO GUTEMBERG DO NASCIMENTO DELMONDES
Advogado do(a) APELADO: ADEMARO MOREIRA ALVES - SP436728-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI
Presentes os requisitos de admissibilidade, conheço da apelação interposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL.
Dos fatos
De acordo com a denúncia, FRANCISCO GUTEMBERG DO NASCIMENTO DELMONDES tentou obter vantagem ilícita, consistente no recebimento do benefício previdenciário de auxílio-doença, em prejuízo do INSS. Extrai-se da denúncia que o benefício teria sido concedido indevidamente, mediante fraude, uma vez que indivíduo não identificado teria se passado pelo requerente FRANCISCO durante a perícia médica, utilizando-se de carteira de identidade falsa constando os dados qualificativos do réu, mas com fotografia e número diversos, ludibriando a médica perita, que atestou a incapacidade laborativa tendo em vista a condição de saúde do indivíduo examinado (fratura do braço – CID S-42).
O Ministério Público Federal imputou a FRANCISCO GUTEMBERG a prática do crime previsto no art. 171, §3º c/c art. 14, II e 29, todos do CP.
O Juízo da 2ª Vara Federal de São Carlos absolveu o denunciado pelos seguintes fundamentos:
“O crime de estelionato só pode ser praticado dolosamente, não havendo previsão legal para a modalidade culposa. No caso concreto, não se conclui dos autos prova da autoria e dolo do denunciado a ensejar a responsabilidade penal.
O dolo, em face da teoria finalista da ação, perfaz elemento indispensável para a existência de fato típico.
Para a teoria finalista da ação, o dolo que se está a perscrutar, em foro de análise de tipicidade, é o dolo natural, vale dizer, a vontade de realizar os elementos previstos no tipo, independente da análise dos elementos relacionados à exigibilidade de conduta diversa, cujo exame se refere à culpabilidade.
Para a configuração do tipo penal descrito no art. 171 do Código Penal, é necessário que esteja caracterizado o dolo, consistente na vontade livre e consciente de obter vantagem ilícita em prejuízo dos cofres previdenciários.
Assim, o conjunto probatório é insuficiente para demonstrar a autoria, bem como o dolo por parte da acusada.
Assim, o conjunto probatório é insuficiente para demonstrar a autoria por parte do acusado.
Se é certo que no momento do recebimento da denúncia prevalece o interesse da sociedade para apuração da infração penal, onde se apresenta suficiente a prova da materialidade e indícios da autoria, não é menos correto que, quando do julgamento, deve preponderar a certeza, não bastando indícios, por envolver um dos direitos fundamentais do indivíduo, a liberdade.
Em sede penal, a incerteza gera absolvição, pois o ônus da prova dos fatos descritos na inicial é do Ministério Público, à defesa basta que gere a incerteza, a dúvida sobre tais fatos. [...] Destarte, não há lastro probatório contundente demonstrando a participação de FRANCISCO GUTEMBERG DO NASCIMENTO DELMONDES nos fatos a ele imputados, razão pela qual de rigor a sua absolvição, na forma do art. 386, inciso VII do Código de Processo Penal”.
Em seu apelo, o Parquet Federal pugna pela condenação do réu nos termos da denúncia.
Do mérito
A materialidade delitiva está demonstrada pelo procedimento administrativo nº 31/554.167.816-8, do qual se extraem: i) requerimento de auxílio-doença (ID 282983292 – pag. 7), ii) carteira de identidade nº 21.209.662-X apresentada durante a perícia (ID 282983292 – pag. 8), iii) concessão do benefício (ID 282983292 – pag. 10), iv) ofício nº 1168/2013 do IIRGD atestando a falsidade da carteira de identidade nº 21.209.662-X em nome de Francisco Gutemberg do Nascimento Delmondes (ID 282983292 – pag. 61/62); histórico de requerimentos de benefícios (ID 282983604), laudo médico pericial (ID 282983604 – pag. 63), além da prova oral produzida em juízo (ID 282983540).
A autoria e o dolo também estão bem demonstrados.
FRANCISCO GUTEMBERG DO NASCIMENTO DELMONDES protocolou requerimento de auxílio-doença em 13/11/2012, sob nº 31/554.167.816-8, junto à agência do INSS em Porto Ferreira/SP (ID 282983292 – pag. 7). A perícia foi agendada para o dia 22/11/2012.
Ocorre que outra pessoa apresentou-se à médica perita do INSS, Dra. Marta Fabiane Gouvea Barioni, passando-se pelo réu FRANCISCO. Na ocasião, esse indivíduo não identificado, agindo em conluio com o réu, apresentou uma carteira de identidade constando os dados qualificativos do réu, todavia com fotografia e número diversos (RG nº 21.209.662-X). A médica perita atestou a incapacidade laborativa em razão de fratura do braço – CID S42, e o benefício foi concedido (ID 282983292 – pag. 8 e ID 282983604 – pag. 63).
Em 11/12/2012, o benefício de auxílio-doença foi liberado para pagamento. Nessa data o réu FRANCISCO GUTEMBERG compareceu à agência do Banco Bradesco, na cidade de Porto Ferreira/SP, com o intuito de sacar a parcela do benefício de auxílio-doença. No entanto, em razão da divergência do número do RG constante da carta de concessão (RG nº 21.209.662-X) e o documento apresentado por FRANCISCO GUTEMBERG DO NASCIMENTO DELMONDES (RG 55.236.749-7), o pagamento não foi realizado.
Na mesma data FRANCISCO dirigiu-se até a agência do INSS em Porto Ferreira/SP, onde foram verificadas irregularidades no procedimento de concessão. Em juízo, a testemunha José Eduardo Rochetti confirmou esse fato (ID 282983540).
Está comprovado que durante a realização da perícia agendada em nome FRANCISCO GUTEMBERG DO NASCIMENTO DELMONDES, em 22/11/2012, outra pessoa (ainda não identificada) apresentou uma carteira de identidade falsa, nº 21.209.662-X, constando o nome e a qualificação do réu, mas com número e fotografia diferentes. Através do ofício nº 1168/2013, o INSTITUTO DE IDENTIFICAÇAO RICARDO GUMBETON DAUNT atestou que o prontuário nº 21.209.662-X não pertence a FRANCISCO GUTEMBERG DO NASCIMENTO DELMONDES (ID 282983292 – pag. 62).
O indivíduo que se submeteu ao exame pericial, que se identificou falsamente como o requerente FRANCISCO, apresentava fratura no braço (CID S42). Assim, a médica perita atestou a incapacidade laborativa e o benefício de auxílio-doença foi concedido.
Perante o INSS, o apelado afirmou que, embora residisse em São Paulo/SP, apresentou o requerimento de auxílio-doença em Porto Ferreira/SP, pois estava visitando seu primo naquela cidade, em endereço que não sabia indicar. Afirmou que sua esposa fez o agendamento e o comunicou por telefone. Disse, ainda, que requereu auxílio-doença em razão de problemas na coluna cervical e compareceu à perícia agendada em Porto Ferreira, tendo sido atendido por um médico perito do sexo masculino (ID 282983292 – pag. 15).
Perante a autoridade policial, FRANCISCO declarou (ID 282983333 – pag. 76):
“atualmente possui uma pequena venda na garagem da residência; confirma na íntegra o conteúdo do depoimento que prestou no INSS em 11.12.2012, cuja cópia acompanha a presente carta precatória; não sabe informar quem requereu o benefício na APS em Porto Ferreira; não sabe informar como o RG utilizado na APS em Porto Ferreira não pertence ao declarante; não sabe informar porque a assinatura lançada às fls. 15 junto a APS em Porto Ferreira não é a do declarante; não sabe explicar as inconsistências relatadas pelo INSS; não sabe informar quem é a pessoa retratada no RG de fls. 16, cuja cópia acompanha esta carta precatória; não contratou qualquer pessoa para passar por si junto a APS e requerer benefício previdenciário; o declarante esclarece que nunca ingressou com o pedido de benefício em questão; desconhece quem o tenha requerido; o declarante passou por várias perícias no INSS para obter auxílio doença; algumas o pedido foi negado e outras deferido; há um ano, aproximadamente, recebe auxílio doença; nunca fraudou o INSS para obter qualquer benefício; desconhece o motivo pelo qual terceiro tenha utilizado seus dados para obter benefício previdenciário; na época em questão não precisaria que terceiro passasse por perícia medica em seu lugar uma vez que tinha problemas de saúde que permitiriam obter auxilio doença; inclusive e obteve o benefício na época ; este benefício foi inicialmente indeferi do, porém impetrou recurso e foi autorizado; autoriza a colheita de impressão digital do dedos; está ciente de eventual indiciamento indireto caso haja elementos para tanto”.
Interrogado em juízo, o réu afirmou que compareceu à perícia em Porto Ferreira, tendo sido atendido por um médico “meio alemão”, na sala 5 ou 6, não se recorda. Apresentou documentos originais. Depois da perícia, retornou para São Paulo. Recebeu a “cartinha” do INSS comunicando a concessão do benefício. Voltou a Porto Ferreira. Foi ao banco e soube que havia divergência em seu RG. Dirigiu-se ao INSS. Apresentou seu documento original. Naquela época morava em São Paulo, mas estava visitando seu primo em Porto Ferreira. Estava passeando. Enquanto estava lá [em Porto Ferreira], sua esposa, que estava em São Paulo, conseguiu agendar a perícia em Porto Ferreira. A perícia foi realizada dois dias depois. Havia “passado” em um médico e estava com um laudo na mão e decidiu ficar em Porto Ferreira. Depois da perícia, foi embora para São Paulo. Não conhece Diógenes. O servidor do INSS mostrou o RG que foi utilizado na perícia. Disse ao servidor que o documento não lhe pertencia. Não lembra a data da perícia. Em certa ocasião, perdeu seus documentos pessoais dentro do ônibus. A conta bancária em Porto Ferreira foi aberta pela INSS. Possui problemas na coluna cervical e recebe benefício por incapacidade.
O réu FRANCISCO não possuía a lesão identificada pela médica perita (fratura no braço), que ensejou a concessão do benefício, tampouco se submeteu a exame pericial a cargo do INSS em Porto Ferreira/SP (conforme histórico de requerimentos de benefícios), diferentemente do que alega. FRANCISCO foi submetido à perícia na APS em Porto Ferreira somente em 23/04/2013, no bojo do pedido de reconsideração da decisão que cancelou o benefício concedido indevidamente. No laudo pericial de 23/04/2013, constou que FRANCISCO não referiu fratura no braço, conforme havia constado no laudo anterior, e o pedido de auxílio-doença foi indeferido, uma vez que não foi verificada incapacidade para o trabalho (ID 282983604 – pag. 64/65).
Além disso, não há justificativa idônea para a apresentação de requerimento na cidade de Porto Ferreira/SP. O réu afirma que sua esposa fez o agendamento para a realização de perícia naquela cidade, e o comunicou por telefone, enquanto visitava seu primo em endereço que sequer soube declinar.
Merece destaque o fato de que, anteriormente ao requerimento de auxílio-doença junto à agência do INSS em Porto Ferreira/SP, o réu formulou vários outros requerimentos em agências do INSS em São Paulo/SP e Grande São Paulo/SP, os quais foram indeferidos. Cito, para exemplificar, os indeferimentos ocorridos em 02/06/2011, 29/07/2011, 12/09/2011 (INSS em Osasco), 08/11/2011, 20/12/2011 (INSS em São Paulo – Liberdade), 04/01/2012 (INSS em Ermelindo Matarazzo), 05/04/2012 (INSS em Santo André) – ID 282983604 – pag. 15/38.
O conluio entre o réu e a pessoa que se apresentou na perícia em seu lugar está bem demonstrado. O indivíduo que foi submetido ao exame pericial possuía uma lesão ortopédica capaz de configurar incapacidade laborativa. Assim, passando-se pelo réu, apresentou à médica perita do INSS cédula de identidade falsa em nome de FRANCISCO, obtendo, dessa forma, o deferimento do benefício previdenciário.
Evidentemente, apenas o réu seria beneficiado com a concessão indevida do benefício.
O dolo é evidente, uma vez que FRANCISCO pretendia receber as parcelas do auxílio-doença mediante fraude, uma vez que não foi examinado pelo médico perito do INSS em Porto Ferreira/SP e não apresentava a fratura no braço que acarretou o reconhecimento da incapacidade laborativa.
O acusado vinha tentando obter o auxílio-doença e, diante dos indeferimentos anteriores, agiu em conluio com um indivíduo que apresentava lesão ortopédica, a fim de obter indevidamente o benefício previdenciário, ludibriando a médica perita, em prejuízo do INSS.
O benefício não foi concedido em razão da diligente atuação do funcionário da agência bancária, que percebeu a divergência entre o número do RG constante da carta de concessão e o documento que lhe foi apresentado por FRANCISCO. Portanto, configurada a tentativa, nos termos do art. 14, II do CP.
Desse modo, acolho a apelação do Ministério Público Federal para condenar FRANCISCO GUTEMBERG DO NASCIMENTO DELMONDES pela prática do crime previsto no art. 171, §3º c/c art. 14, II do CP.
Da dosimetria
1ª fase
Analisando as circunstâncias judiciais do art. 59 do CP, verifico que a culpabilidade é normal à espécie delitiva. Os motivos, consequências e circunstâncias não escapam do ordinário. Não há elementos nos autos para valoração da conduta social e personalidade. O réu não ostenta antecedentes criminais. Nada a valorar sobre o comportamento da vítima.
Assim, fixo a pena-base no patamar mínimo legal, a saber, 1 ano de reclusão e 10 dias multa.
2ª fase
Não incidiram circunstâncias agravantes nem atenuantes.
3ª fase
Presente a causa de aumento prevista no parágrafo 3º do art. 171 do CP, na fração de 1/3, pois o crime foi praticado em prejuízo da autarquia previdenciária.
Presente, ainda, a causa de diminuição prevista no art. 14, II do CP, na fração de 1/3, considerando o iter criminis percorrido pelo apelado, que apresentou o requerimento de auxílio-doença, concorreu para que outra pessoa comparecesse à perícia em seu lugar e, após a concessão do pedido, tentou sacar a parcela do benefício na agência bancária. Não fossem o cuidado e a diligência do funcionário da agência bancária, o réu obteria a vantagem ilícita.
Assim, fixo a pena definitiva em 10 meses e 20 dias de reclusão, em regime inicial aberto, e 10 dias-multa no valor unitário equivalente a 1/30 do salário mínimo vigente ao tempo do fato, considerando a situação econômica do réu.
Preenchidos os requisitos do art. 44 do CP, substituto a pena privativa de liberdade por uma pena restritiva de direito, consistente em prestação de serviços à comunidade conforme critérios a serem estabelecidos pelo Juízo da execução.
Dispositivo
Pelo exposto, dou provimento à apelação do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL para condenar FRANCISCO GUTEMBERG DO NASCIMENTO DELMONDES pela prática do crime previsto no art. 171, §3º c/c art. 14, II do CP, à pena de 10 meses e 20 dias de reclusão, em regime inicial aberto, além de 10 dias multa no valor unitário equivalente a 1/30 do salário mínimo vigente ao tempo do fato, substituída a pena privativa de liberdade por uma pena de prestação de serviços à comunidade.
É o voto.
E M E N T A
APELAÇÃO CRIMINAL. ART. 171, §3º DO CP C/C ART. 14, II DO CP. TENTATIVA DE ESTELIONATO PREVIDENCIÁRIO. REQUERIMENTO DE AUXÍLIO-DOENÇA. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO DEMONSTRADOS. RECURSO PROVIDO.
O réu protocolou requerimento de auxílio-doença em 13/11/2012, sob nº 31/554.167.816-8, junto à agência do INSS em Porto Ferreira/SP. Na data agendada para a perícia, outra pessoa apresentou-se à médica do INSS, passando-se pelo réu. Na ocasião, esse indivíduo não identificado, agindo em conluio com o réu, apresentou uma carteira de identidade constando os dados qualificativos do denunciado, todavia com fotografia e número diversos. A médica perita atestou a incapacidade laborativa em razão de fratura do braço – CID S42, e o benefício foi concedido.
Em 11/12/2012, o réu compareceu à agência do Banco Bradesco, na cidade de Porto Ferreira/SP, com o intuito de sacar a parcela do benefício de auxílio-doença. No entanto, em razão da divergência do número do RG constante da carta de concessão e o documento apresentado pelo apelado, o pagamento não foi realizado.
O conluio entre o réu e a pessoa que se apresentou na perícia em seu lugar está bem demonstrado. O indivíduo que foi submetido ao exame pericial possuía uma lesão ortopédica capaz de configurar incapacidade laborativa. Assim, passando-se pelo réu, apresentou à médica perita do INSS cédula de identidade falsa em nome do apelado, obtendo, dessa forma, o deferimento do benefício previdenciário.
O dolo é evidente, uma vez que o denunciado pretendia receber as parcelas do auxílio-doença mediante fraude, uma vez que não foi examinado pelo médico perito do INSS em Porto Ferreira/SP e não apresentava a fratura no braço que acarretou o reconhecimento da incapacidade laborativa.
Recurso provido para condenar o réu pela prática do crime previsto no art. 171, §3º do CP na forma do art. 14, II do CP.
Pena definitivamente fixada em 10 meses e 20 dias de reclusão, em regime inicial aberto, além de 10 dias multa no valor unitário equivalente a 1/30 do salário mínimo vigente ao tempo do fato, substituída a pena privativa de liberdade por uma pena de prestação de serviços à comunidade.
Apelação do Ministério Público Federal provida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Primeira Turma, por unanimidade, decidiu DAR PROVIMENTO à apelação do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL para condenar FRANCISCO GUTEMBERG DO NASCIMENTO DELMONDES pela prática do crime previsto no art. 171, §3º c/c art. 14, II do CP, à pena de 10 meses e 20 dias de reclusão, em regime inicial aberto, além de 10 dias multa no valor unitário equivalente a 1/30 do salário mínimo vigente ao tempo do fato, substituída a pena privativa de liberdade por uma pena de prestação de serviços à comunidade, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.