APELAÇÃO CÍVEL. PREVIDENCIÁRIO. RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. VERBA ALIMENTAR. BOA-FÉ. TEMA 979, STJ. RECURSO NÃO PROVIDO
Ementa:
APELAÇÃO CÍVEL. PREVIDENCIÁRIO. RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. VERBA ALIMENTAR. BOA-FÉ. TEMA 979, STJ. RECURSO NÃO PROVIDO.
1. Tema 979, STL: “Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados decorrentes de erro administrativo (material ou operacional), não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela Administração, são repetíveis, sendo legítimo o desconto no percentual de até 30% (trinta por cento) de valor do benefício pago ao segurado/beneficiário, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido”. (Resp 1.381.734/RN).
2. No caso dos autos, a concessão do auxílio acidente decorreu de erro do INSS na aplicação da Lei, considerando que partiu de sua parte a formulação da proposta de acordo judicial, o que denota a boa fé da então autora.
3. Em observância ao princípio da irrepetibilidade dos alimentos, da boa-fé da parte autora e da natureza alimentar do benefício previdenciário, não há que se falar em devolução dos valores pagos indevidamente.
4. Apelação do INSS não provida
(TRF 3ª Região, 7ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5071496-28.2018.4.03.9999, Rel. MARCELO VIEIRA DE CAMPOS, julgado em 16/05/2024, DJEN DATA: 21/05/2024)
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PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5071496-28.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. MARCELO VIEIRA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: RODRIGO RIBEIRO D AQUI - SP239930-N
APELADO: OLINDA SILVIA MOREIRA
Advogados do(a) APELADO: CARLOS HUMBERTO CAVALHEIRO - SP263345-N, THIAGO ROCHA CONTRUCCI - SP261822-N
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5071496-28.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. MARCELO VIEIRA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: RODRIGO RIBEIRO D AQUI - SP239930-N
APELADO: OLINDA SILVIA MOREIRA
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R E L A T Ó R I O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO VIEIRA, RELATOR:
Trata-se de ação anulatória ajuizada pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando a anulação do acordo firmado entre as partes no Proc. 1000085-90.2016.8.26.0136, com a retomada do processamento daquela ação e a restituição das condições ao status quo ante. Requereu a antecipação da tutela.
A r. sentença, proferida em 19/01/2018, julgou procedente o pedido para anular a transação judicial entabulada entre as partes , homologada em 06/03/2017 na ação previdenciária para a concessão de auxílio-acidente (Proc. 1000085-90.2016.8.26.0136) e determinar o prosseguimento daquele feito. Condenou a ré ao pagamento dos honorários advocatícios, fixados em 15% sobre o valor atribuído à causa, atentando ao disposto no art. 98, §3º do CPC.
O INSS opôs embargos de declaração, os quais foram parcialmente acolhidos no sentido de deferir a tutela provisória de urgência para determinar a cessação do benefício, sem a restituição dos valores pagos.
Apela o INSS interpôs sustentando, em síntese, ser devida a restituição dos valores recebidos indevidamente. Aduz a vedação ao enriquecimento sem causa e a possibilidade da devolução, com fundamento no art. 115, II da Lei 8.213/91.
Sem contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5071496-28.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. MARCELO VIEIRA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: RODRIGO RIBEIRO D AQUI - SP239930-N
APELADO: OLINDA SILVIA MOREIRA
Advogados do(a) APELADO: CARLOS HUMBERTO CAVALHEIRO - SP263345-N, THIAGO ROCHA CONTRUCCI - SP261822-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO VIEIRA, RELATOR: O Superior Tribunal de Justiça decidiu a questão em discussão, em regime de repetitividade, nos seguintes termos:
“PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. TEMA 979. ARTIGO 1.036 DO CPC/2015. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. ARTIGOS 884 E 885 DO CÓDIGO CIVIL/2002. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211 DO STJ. ART. 115, II, DA LEI N. 8.213/1991. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS POR FORÇA DE INTERPRETAÇÃO ERRÔNEA E MÁ APLICAÇÃO DA LEI. NÃO DEVOLUÇÃO. ERRO MATERIAL DA ADMINISTRAÇÃO. POSSIBILIDADE DE DEVOLUÇÃO SOMENTE NA HIPÓTESE DE ERRO EM QUE OS ELEMENTOS DO CASO CONCRETO NÃO PERMITAM CONCLUIR PELA INEQUÍVOCA PRESENÇA DA BOA-FÉ OBJETIVA.
1. Da admissão do recurso especial: Não se conhece do recurso especial quanto à alegada ofensa aos artigos 884 e 885 do Código Civil, pois não foram prequestionados. Aplica-se à hipótese o disposto no enunciado da Súmula 211 do STJ. O apelo especial que trata do dissídio também não comporta conhecimento, pois não indicou as circunstâncias que identifiquem ou assemelhem os precedentes colacionados e também por ausência de cotejo analítico e similitude entre as hipóteses apresentadas. Contudo, merece conhecimento o recurso quanto à suposta ofensa ao art. 115, II, da lei n. 8.213/1991.
2. Da limitação da tese proposta: A afetação do recurso em abstrato diz respeito à seguinte tese: Devolução ou não de valores recebidos de boa-fé, a título de benefício previdenciário, por força de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da Administração da Previdência Social.
3. Irrepetibilidade de valores pagos pelo INSS em razão da errônea interpretação e/ou má aplicação da lei: O beneficiário não pode ser penalizado pela interpretação errônea ou má aplicação da lei previdenciária ao receber valor além do devido. Diz-se desse modo porque também é dever-poder da Administração bem interpretar a legislação que deve por ela ser aplicada no pagamento dos benefícios. Dentro dessa perspectiva, esta Corte Superior evoluiu a sua jurisprudência passando a adotar o entendimento no sentido de que, para a não devolução dos valores recebidos indevidamente pelo beneficiário da Previdência Social, é imprescindível que, além do caráter alimentar da verba e do princípio da irrepetibilidade do benefício, a presença da boa-fé objetiva daquele que recebe parcelas tidas por indevidas pela administração. Essas situações não refletem qualquer condição para que o cidadão comum compreenda de forma inequívoca que recebeu a maior o que não lhe era devido.
4. Repetição de valores pagos pelo INSS em razão de erro material da Administração previdenciária: No erro material, é necessário que se averigue em cada caso se os elementos objetivos levam à conclusão de que houve boa-fé do segurado no recebimento da verba. Vale dizer que em situações em que o homem médio consegue constatar a existência de erro, necessário se faz a devolução dos valores ao erário.
5. Do limite mensal para desconto a ser efetuado no benefício: O artigo 154, § 3º, do Decreto n. 3.048/1999 autoriza a Administração Previdenciária a proceder o desconto daquilo que pagou indevidamente; todavia, a dedução no benefício só deverá ocorrer quando se estiver diante de erro da administração. Nesse caso, caberá à Administração Previdenciária, ao instaurar o devido processo administrativo, observar as peculiaridades de cada caso concreto, com desconto no benefício no percentual de até 30% (trinta por cento).
6. Tese a ser submetida ao Colegiado: Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados decorrentes de erro administrativo (material ou operacional), não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela Administração, são repetíveis os valores, sendo legítimo o seu desconto no percentual de até 30% (trinta por cento) do valor do benefício mensal, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido.
7. Modulação dos efeitos: Tem-se de rigor a modulação dos efeitos definidos neste representativo da controvérsia, em respeito à segurança jurídica e considerando o inafastável interesse social que permeia a questão sub examine, e a repercussão do tema que se amolda a centenas de processos sobrestados no Judiciário. Desse modo somente deve atingir os processos que tenham sido distribuídos, na primeira instância, a partir da publicação deste acórdão.
8. No caso concreto: Há previsão expressa quanto ao momento em que deverá ocorrer a cessação do benefício, não havendo margem para ilações quanto à impossibilidade de se estender o benefício para além da maioridade da beneficiária. Tratou-se, em verdade, de simples erro da administração na continuidade do pagamento da pensão, o que resulta na exigibilidade de tais valores, sob forma de ressarcimento ao erário, com descontos nos benefícios, tendo em vista o princípio da indisponibilidade do patrimônio público e em razão da vedação ao princípio do enriquecimento sem causa. Entretanto, em razão da modulação dos efeitos aqui definidos, deixa-se de efetuar o descontos dos valores recebidos indevidamente pelo segurado.
9. Dispositivo: Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, não provido. Acórdão sujeito ao regime previsto no artigo 1.036 e seguintes do CPC/2015.
(1ª Seção, REsp 1381734/RN, j. 10/03/2021, DJe 23/04/2021, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES – grifei).”
Nesse quadro, tenho que a r. sentença deve ser mantida.
A questão controversa, posto no presente recurso, cinge-se à devolução de valores recebidos pela parte autora a título de auxílio-acidente, cuja concessão se deu em razão de transação judicial.
Da análise dos autos, que a ré ajuizou ação de concessão de auxílio-acidente (Proc. 1000085-90.2016.8.26.0136), sendo que naquele feito foi produzida perícia médica a qual reconheceu a existência de sequela redutora da capacidade laboral. Com a citação, o INSS ofereceu contestação e, ato contínuo, formalizou proposta de acordo para a concessão do benefício com DIB em 01/10/2015 e DIP em 01/02/2017, com o pagamento do percentual de 80% do valor provável da condenação nas seguintes condições:
“Juros e correção monetária nos termos do artigo 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação que lhe deu a Lei 11.960/09.
Ressalte-se que a parte autora, ao aceitar a presente proposta de acordo, ratifica expressamente e em caráter irretratável as seguintes cláusulas:
a) renúncia, pela parte autora, quanto a eventuais direitos decorrentes do mesmo fato ou fundamento jurídico que deu origem à ação;
b) possibilidade de correção de eventuais erros materiais, bem como desconto administrativo de valores eventualmente recebidos em duplicidade, a qualquer tempo;
c) possibilidade de, nos valores em atraso, serem descontadas eventuais importâncias recebidas pela parte autora, decorrente de benefício inacumulável recebido em período concomitante;”(ID 8256155, p 148)
Diante da proposta, a parte ré, então autora, consignou expressamente sua concordância com os termos do acordo, que foi homologado pelo Juízo, extinguindo a ação previdenciária, tendo sido oficiado ao INSS para implantação do benefício.
Contudo, comparece o INSS no presente feito aduzindo que, naquele feito, comprovou-se que a autora laborava como empregada doméstica, sendo que os empregados domésticos somente passaram a ter direito aos benefícios acidentários em função de acidente ocorridos a partir de 01/06/2015, de acordo com a LC 150/2015.
Ocorre que o acidente da então autora ocorreu 19/08/2014, o que afasta a hipótese de concessão, motivo pelo qual requer seja anulado o acordo firmado pelas partes. Acatando os argumentos do INSS, a sentença foi julgada procedente, sem que houvesse apelação da parte ré.
Neste contexto, ante a tese firmada no Tema 979, a concessão do auxílio acidente decorreu de erro do INSS na aplicação da Lei, considerando que partiu de sua parte a formulação da proposta de acordo naqueles autos, o que denota a boa fé da então autora, ora ré, na concessão do benefício.
Assim, em observância ao princípio da irrepetibilidade dos alimentos, da boa-fé da parte autora e da natureza alimentar do benefício previdenciário, não há que se falar em devolução dos valores pagos indevidamente. Nesse sentido:
“PROCESSO CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. CONCESSÃO JUDICIAL. RECEBIMENTO DE BENEFÍCIOS INACUMULÁVEIS NO PERÍODO ABRANGIDO PELA CONDENAÇÃO. ERRO EXCLUSIVO DO INSS. MÁ APLICAÇÃO DA LEI CONFIGURADA. INDEFERIMENTO INDEVIDO DO MELHOR BENEFÍCIO. BOA-FÉ OBJETIVA DEMONSTRADA. PERCEPÇÃO DA IRREGULARIDADE PELO HOMEM COMUM. IMPOSSIBILIDADE. NECESSIDADE DE CONHECIMENTO TÉCNICO ESPECIALIZADO PARA COMPREENSÃO DO FATO. INEXIGIBILIDADE DO DÉBITO PREVIDENCIÁRIO RECONHECIDA. APELAÇÃO DO IMPETRANTE PROVIDA. SENTENÇA REFORMADA. SEGURANÇA CONCEDIDA.
1 - O princípio da vedação ao enriquecimento sem causa, fundado na eqüidade, constitui alicerce do sistema jurídico desde a época do direito romano e encontra-se atualmente disciplinado pelo artigo 884 do Código Civil de 2002. Desse modo,
todo acréscimo patrimonial obtido por um sujeito de direito que acarrete necessariamente o empobrecimento de outro, deve possuir um motivo juridicamente legítimo, sob pena de ser considerado inválido e seus valores serem restituídos ao anterior proprietário. Em caso de resistência à satisfação de tal pretensão, o ordenamento jurídico disponibiliza à parte lesada os instrumentos processuais denominados ações in rem verso, a fim de assegurar o respectivo ressarcimento, das quais é exemplo a ação de repetição de indébito.
2 - A propositura de demanda judicial, contudo, não constitui a única via de que dispõe a Administração Pública para corrigir o enriquecimento sem causa. Os Entes Públicos, por ostentarem o poder-dever de autotutela, podem anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornem ilegais, ressalvando-se ao particular o direito de contestar tal medida no Poder Judiciário, conforme as Súmulas 346 e 473 do Supremo Tribunal Federal.
3 - Ademais, na seara do direito previdenciário, a possibilidade de cobrança imediata dos valores pagos indevidamente, mediante descontos no valor do benefício, está prevista no artigo 115, II, da Lei 8.213/91, regulamentado pelo artigo 154 do Decreto n. 3.048/99.
4 - Assim, ao estabelecer hipóteses de desconto sobre o valor do benefício, o próprio Legislador reconheceu que as prestações previdenciárias, embora tenham a natureza de verbas alimentares, não são irrepetíveis em quaisquer circunstâncias.
5 - Deve-se ponderar que a Previdência Social é financiada por toda a coletividade e o enriquecimento sem causa de algum segurado, em virtude de pagamento indevido de benefício ou vantagem, sem qualquer causa juridicamente reconhecida, compromete o equilíbrio financeiro e atuarial de todo o Sistema, importando em inequívoco prejuízo a todos os demais segurados e em risco à continuidade dessa rede de proteção.
6 – In casu, verifica-se que o impetrante obteve a concessão dos benefícios de auxílio-acidente por infortúnio laboral em 14/12/1995 (NB 102.188.519-0) e, concomitantemente, a partir de 01/07/2010, da aposentadoria por tempo de contribuição (NB 153.713.983-2).
7 - No entanto, o segurado propôs ação judicial em 23/05/2012 (Processo n. 0002814-95.2012.4.03.6126), visando converter a aposentadoria por tempo de contribuição em aposentadoria especial. O pleito veio a ser acolhido em sede recursal por esta Corte, tendo o INSS sido condenado em proceder à conversão postulada, pagando as prestações atrasadas do benefício, a partir da data da citação (15/08/2012), acrescidas de correção monetária, juros de mora e honorários advocatícios (ID 874152).
8 - Ao cumprir a obrigação de fazer em 28/11/2016, o INSS cessou o benefício de auxílio-acidente, em razão da vedação à cumulação do referido beneplácito com a aposentadoria especial. Não se verifica qualquer ilegalidade no procedimento adotado pela Autarquia Previdenciária quanto a este aspecto.
9 - O risco relativo aos infortúnios laborais passou a ser objeto de proteção previdenciária com o advento da Lei n. 5.316/67, que assegurava uma renda mensal
compensatória ao acidentado que viesse a comprometer permanentemente mais de 25% (vinte e cinco por cento) de sua capacidade laboral e não preenchesse os requisitos para usufruir de outras prestações previdenciárias por incapacidade. Na época, a renda mensal do referido auxílio equivalia a 25% (vinte e cinco por cento) do salário de contribuição devido ao empregado no dia do acidente, consoante o disposto nos artigos 7º, caput, e 6º, II, da Lei 5.316/67.
10 - Posteriormente, além de atribuir a qualidade de renda vitalícia ao auxílio-acidente, a Lei 6.367/76 majorou sua renda mensal, ao alterar o coeficiente de 25% (vinte e cinco) para 40% (quarenta por cento) do salário de contribuição devido pelo empregado no dia do acidente.
11 - Embora tenha mantido o caráter vitalício do benefício, a Lei 8.213/91, em sua redação original, alterou a forma de cálculo da renda mensal do benefício, para conformá-la com a gravidade das sequelas produzidas pelo infortúnio laboral, em atenção ao princípio da seletividade, previsto no artigo 194, III, da Constituição Federal. Assim, o valor do auxílio-acidente passou a ser de 30% (trinta por cento), 40% (quarenta por cento) ou 60% (sessenta por cento) do valor do salário-de-contribuição do segurado vigente na data do sinistro, conforme a intensidade da redução permanente da capacidade laboral do segurado.
12 - A referida gradação do coeficiente segundo a gravidade das sequelas, todavia, foi suprimida com o advento da Lei 9.032/95, que alterou o parágrafo 1º do artigo 86 da Lei 8.213/91, a fim de estabelecer a renda mensal do auxílio-acidente em 50% (cinquenta por cento) do salário-de-benefício do segurado.
13 - O próprio caráter vitalício dessa prestação indenizatória veio a ser posteriormente revogado com a modificação do artigo 86, §2º, da Lei 8.213/91 pela Lei 9.528/97, estabelecendo a vedação da cumulação do auxílio-acidente com qualquer outra aposentadoria.
14 - A fim de resolver o dissenso jurisprudencial acerca da continuidade da percepção do auxílio-acidente por aqueles que já houvessem preenchido os requisitos para a aposentadoria por ocasião da entrada em vigor da Lei 9.528/97, o C. Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula 507: "A acumulação de auxílio-acidente com aposentadoria pressupõe que a lesão incapacitante e a aposentadoria sejam anteriores a 11/11/1997, observado o critério do art. 23 da Lei n. 8.213/1991 para definição do momento da lesão nos casos de doença profissional ou do trabalho".
15 - Desse modo, como o termo inicial da aposentadoria especial, consignada no título judicial formado no bojo do Processo n. 0002814-95.2012.4.03.6126, foi fixado na data da citação (15/08/2012), ou seja, após a entrada em vigor da Lei 9.528/97, a cessação do auxílio-acidente era de rigor.
16 - Por outro lado, o débito consignado no benefício recebido pelo impetrante decorre exclusivamente da impossibilidade de cumulação da aposentadoria especial com os benefícios de auxílio-acidente e de aposentadoria por tempo de contribuição, no período entre as datas da citação (15/08/2012) e de sua cessação (31/10/2016).
17 - Nas hipóteses de erros administrativos oriundos de interpretação errônea ou má aplicação da lei, o entendimento jurisprudencial amplamente dominante sempre entendeu pela impossibilidade de repetição dos valores recebidos indevidamente. Precedentes.
18 - No que se refere ao pagamento de valores indevidos em razão de erros materiais e operacionais imputáveis exclusivamente ao INSS, a jurisprudência vinha dando o mesmo tratamento jurídico dispensado às outras duas categorias - interpretação errônea e má aplicação da lei.
19 - Entretanto, por ocasião do julgamento do recurso especial nº 1.381.734/RN, submetido ao rito dos recursos repetitivos, o C. Superior Tribunal de Justiça modificou o seu entendimento, exigindo nos casos de erros operacionais ou materiais do INSS a demonstração da boa-fé objetiva na conduta do segurado para reconhecer a inexigibilidade do débito previdenciário. Eis a tese firmada pelo Tribunal da Cidadania sobre esta questão: “Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados decorrentes de erro administrativo (material ou operacional), não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela Administração, são repetíveis, sendo legítimo o desconto no percentual de até 30% (trinta por cento) de valor do benefício pago ao segurado/beneficiário, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido.” (Tema nº 979)
20 - Os efeitos definidos no mencionado representativo da controvérsia foram modulados com base na segurança jurídica e no interesse social envolvido, de modo a atingir somente os processos distribuídos, na primeira instância, a partir da publicação do v. acórdão (23/04/2021).
21 - Assim, o pagamento indevido de valores em razão de falha imputável exclusivamente ao INSS não seriam passíveis de restituição até 23/04/2021 e, a partir da referida data, em razão da modulação de efeitos, seria exigido, como condição para o reconhecimento da inexigibilidade do débito previdenciário, a demonstração da boa-fé objetiva do segurado ou pensionista nas hipóteses de erro operacional ou material.
22 - In casu, o débito previdenciário decorre de erro exclusivo do INSS, consubstanciado em má aplicação da lei. Realmente, a Autarquia Previdenciária negligenciou seu dever de orientar e esclarecer o impetrante sobre seus direitos sociais e o modo de exercê-los, conforme preconiza o artigo 88 da Lei n. 8.213/91, bem como a garantia do benefício mais vantajoso, ao não deferir a aposentadoria especial a que ele fazia jus.
23 - Tal equívoco só veio a ser retificado posteriormente, mediante a propositura de ação judicial que reconheceu os períodos de labor sob condições especiais prestado pelo impetrante e,. consequentemente, deferiu a prestação vindicada.
24 - Em tais circunstâncias fáticas, a boa-fé objetiva do segurado perante o INSS decorre da própria situação objetiva. Não se pode exigir da população que ela tenha conhecimento técnico especializado a ponto de compreender a ilegalidade do ato administrativo que indeferi prestação previdenciária a que faz jus.
25 - Aliás, o pagamento do auxílio-acidente e da aposentadoria por tempo de contribuição só ocorreu porque o INSS se equivocou quanto à natureza do benefício que deveria ter sido deferida, já que não reconheceu, em toda a sua extensão, os períodos trabalhados sob condições especiais, não tendo o impetrante concorrido para tal equívoco administrativo.
26 - Em decorrência, configurado o erro exclusivo da Administração Pública, consubstanciado em má aplicação da lei, o reconhecimento da inexigibilidade do débito previdenciário é medida que se impõe, mormente em razão da comprovada boa-fé objetiva do impetrante e dos caráter alimentar dos benefícios previdenciários, razão pela qual merece reforma a sentença de 1º grau de jurisdição.
27 - Sem condenação do INSS no pagamento de honorários advocatícios, nos termos do artigo 25 da Lei n. 12.016 de 2009.
28 - Isentado o INSS das custas processuais.
29 - Apelação do impetrante provida. Sentença reformada. Segurança concedida.
(TRF-3, 7ª Turma, ApCiv 5000139-98.2017.4.03.6126, j. 24/06/2021, Intimação via sistema DATA: 02/07/2021, Rel. Des. Fed. CARLOS EDUARDO DELGADO).”
Portanto, diante da ausência de comprovação de boa-fé da parte rá no recebimento do benefício, incabível a restituição pretendida na espécie.
Ante o exposto, nego provimento à apelação do INSS, nos termos da fundamentação.
É como voto.
E M E N T A
APELAÇÃO CÍVEL. PREVIDENCIÁRIO. RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. VERBA ALIMENTAR. BOA-FÉ. TEMA 979, STJ. RECURSO NÃO PROVIDO.
1. Tema 979, STL: “Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados decorrentes de erro administrativo (material ou operacional), não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela Administração, são repetíveis, sendo legítimo o desconto no percentual de até 30% (trinta por cento) de valor do benefício pago ao segurado/beneficiário, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido”. (Resp 1.381.734/RN).
2. No caso dos autos, a concessão do auxílio acidente decorreu de erro do INSS na aplicação da Lei, considerando que partiu de sua parte a formulação da proposta de acordo judicial, o que denota a boa fé da então autora.
3. Em observância ao princípio da irrepetibilidade dos alimentos, da boa-fé da parte autora e da natureza alimentar do benefício previdenciário, não há que se falar em devolução dos valores pagos indevidamente.
4. Apelação do INSS não provida
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu negar provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.