TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. LEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM. CORONAVÍRUS. EMPREGADAS GESTANTES AFASTADAS POR FORÇA DA LEI Nº 14.151/21, ALTERADA PELA LEI Nº 14.311/22. OMISSÃO LEGISLATIVA. RESPONSABILIDADE PELO PAGAMENTO DO SALÁRIO. PROTEÇÃO DA MATERNIDADE PELA SEGURIDADE SOCIAL. ENQUADRAMENTO ...
Ementa:
TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. LEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM. CORONAVÍRUS. EMPREGADAS GESTANTES AFASTADAS POR FORÇA DA LEI Nº 14.151/21, ALTERADA PELA LEI Nº 14.311/22. OMISSÃO LEGISLATIVA. RESPONSABILIDADE PELO PAGAMENTO DO SALÁRIO. PROTEÇÃO DA MATERNIDADE PELA SEGURIDADE SOCIAL. ENQUADRAMENTO COMO SALÁRIO-MATERNIDADE. COMPENSAÇÃO DOS VALORES PAGOS. POSSIBILIDADE. SUCUMBÊNCIA RECURSAL.
1. O objeto principal discutido na lide envolve o tratamento tributário de verbas pagas pelo empregador às empregadas gestantes impossibilitadas de exercer seu trabalho na forma remota, de forma que sejam tais verbas enquadradas como salário-maternidade, não implicando a efetiva implantação do benefício previdenciário, o que justificaria a presença do INSS na lide. Diante do caráter tributário do pleito, é reconhecida a legitimidade da União - Fazenda Nacional para integrar o polo passivo da demanda, e a ilegitimidade passiva ad causam do INSS.
2. A Lei nº 14.151/21, alterada pela Lei nº 14.311/22, é omissa quanto à responsabilidade pelo pagamento da remuneração da gestante que, afastada de suas atividades presenciais, esteja impossibilitada de exercer suas tarefas de forma remota. De outro lado, a ordem constitucional estabelece expressamente a proteção da maternidade pela Seguridade Social (artigo 201, inciso II, da CF/88), razão pela qual os ônus financeiros decorrentes do afastamento em questão devem ser suportados pela coletividade, e não pelo empregador. Procedência do pedido.
3. É compatível com o ordenamento jurídico o enquadramento como salário-maternidade dos valores pagos às trabalhadoras afastadas durante o período de emergência, sendo possível que as respectivas remunerações sejam compensadas, na forma do artigo 72, § 1º, da Lei nº 8.213/91, atualizadas pela taxa SELIC.
4. Desprovido o apelo da União, devem ser majorados os honorários advocatícios a que esta foi condenada, na forma do artigo 85, § 11º, do CPC.
(TRF4, AC 5036113-75.2022.4.04.7200, PRIMEIRA TURMA, Relatora LUCIANE AMARAL CORRÊA MÜNCH, juntado aos autos em 27/09/2023)
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Apelação Cível Nº 5036113-75.2022.4.04.7200/SC
RELATORA: Desembargadora Federal LUCIANE AMARAL CORRÊA MÜNCH
APELANTE: UNIÃO - FAZENDA NACIONAL (RÉU)
APELADO: COELHO MARQUES SERVICOS LTDA (AUTOR)
RELATÓRIO
Trata-se de ação de procedimento comum proposta por COELHO MARQUES SERVIÇOS LTDA em face da UNIÃO FEDERAL – FAZENDA NACIONAL, pretendendo seja declarado o direito de enquadrar os afastamentos de gestantes de que trata a Lei nº 14.151/21 como salário-maternidade, permitindo a compensação de tais pagamentos (efetuados ou a efetuar), nos termos do que dispõe o artigo 72 da Lei nº 8.213/91, no período de vigência da Lei nº 14.151/2021, e a restituição dos valores já pagos, enquanto perdurar a emergência de saúde pública decorrente do Covid/19; e declarar a não incidência de contribuições destinadas à Previdência Social ou a terceiros (Sistema S), enquanto perdurar o afastamento sem contraprestação de serviço pelas empregadas gestantes (evento 1, INIC1).
A parte autora alega, em síntese, que a Lei nº 14.151/2021 não foi clara quanto à responsabilidade sobre o ônus financeiro decorrente do afastamento remunerado da gestante, não prevendo claramente os efeitos decorrentes do afastamento e, por isso, busca a requerente ver resguardado seu direito de tratar o tema de forma que preserve sua saúde financeira, não lhe cause prejuízos econômicos nem impacte numa forma discriminatória de participação do custeio de benefícios sociais ou mesmo de tratamento das mulheres gestantes. Aduz que a Constituição Federal estabelece nos seus artigos 194 e 195 que a Seguridade Social é financiada por toda a sociedade de forma equânime, ou seja, o ônus decorrente de determinado benefício social é repartido entre toda a sociedade e entre todos os contribuintes sem distinção. Aponta que a proteção à maternidade decorre de interesse da coletividade e, por isso, deve ser suportada pela coletividade, sob pena de haver tratamento não isonômico (artigo 5º, caput, CF/88) entre os empregadores.
A sentença julgou procedente o pedido, nos seguintes termos:
"Ante o exposto:
a) JULGO PROCEDENTE o pedido, com fundamento no art. 487, I, do CPC, a fim de declarar:
a.1) que as verbas remuneratórias pagas às empregadas gestantes da parte autora (AMANDA PATRÍCIA FURTADO, GIOVANA SILVA DE SOUZA, GISLAINE COSTA FARIAS, ROBERTA FRANÇA DA SILVA e WENY NAYARA RODRIGUES DA SILVA) têm natureza de salário maternidade, durante o período em que perdurou o afastamento estipulado pela Lei n. 14.151/21 e;
a.2) indevida a incidência de contribuição previdenciária a cargo do empregador durante o período em que perdurar o salário maternidade ora deferido;
Condeno a ré a restituir à parte autora aa contribuição previdenciária indevidamente retida, nos termos da fundamentação, cuja apuração postergo para a fase executiva, a ser atualizado monetariamente na forma da lei. A questão referente à forma da restituição (se através de compensação) também será tratada na fase de cumprimento da sentença.
Condeno a parte ré ao pagamento dos honorários sucumbenciais, os quais fixo em 10% sobre o valor da causa, nos moldes do art. 85, §2º e §3º, do CPC, devidamente atualizados (IPCA-E).
Custas na forma da lei." (evento 18, SENT1).
Apela a União Federal (evento 23, APELAÇÃO1), requerendo a reforma da sentença, a fim de que seja julgada improcedente a ação.
De início, ressalta que a UNIÃO (FAZENDA NACIONAL) não possui legitimidade passiva ad causam com relação ao pedido referente ao pagamento de salário-maternidade em favor da empregada gestante, sendo tal pretensão precipuamente voltada à Autarquia Previdenciária (INSS).
No mérito, sustenta a impossibilidade de concessão de salário-maternidade fora das hipóteses legais, a necessidade de observância do artigo 37, caput, c/c os artigos 195, § 5º, e 201, caput, todos da CF/88, a ofensa ao artigo 20 da LINDB. Diz que o pleito autoral ofende o princípio da legalidade, que rege a Administração Pública (CF, art. 37), e os princípios constitucionais da precedência da fonte de custeio (CF, art. 195, § 5º) e o do equilíbrio financeiro e atuarial (CF, art. 201, caput). Destaca que não é possível criar ou estender, nem mesmo por lei, benefício previdenciário sem que tenha havido previsão da fonte de custeio total (art. 195, § 5º, da CF) e em prejuízo do equilíbrio atual da previdência (art. 201 da CF). No mesmo sentido, há determinação da Lei Complementar nº 101/200 quanto à impossibilidade de concessão de benefício relativo à seguridade social, sem a devida indicação da fonte de custeio total, nos termos do que dispõe o art. 24. Assim, é inadmissível que seja aplicada interpretação contra legem, para o fim de deferir o benefício do salário-maternidade às gestantes com base na Lei nº 14.151/2021.
Defende que a Lei nº 14.151/2021 apenas estabeleceu que, durante a emergência de saúde pública decorrente do novo coronavírus, a empregada gestante deverá permanecer afastada das atividades de trabalho presencial, sem prejuízo de sua remuneração, ficando à disposição para exercer as atividades em seu domicílio. Não tratou, em momento algum, de salário-maternidade. Em nada prevendo sobre percepção de salário-maternidade, é inviável cogitar-se do acolhimento da pretensão autoral, descabendo ao Poder Judiciário estender o benefício para além das hipóteses legais e aquém do atendimento dos seus requisitos.
Aponta ainda a inadmissibilidade de compensação de valores pagos a título de benefício previdenciário estendido sem previsão legal. Registra que, nos termos do artigo 72, § 1º, da Lei nº 8.213/91, cabendo à empresa pagar o salário-maternidade devido à respectiva empregada gestante, fica-lhe possibilitada a compensação, observado o disposto no artigo 248 da Constituição Federal, quando do recolhimento das contribuições incidentes sobre a folha de salários e demais rendimentos pagos ou creditados, à pessoa física que lhe preste serviço. Reitera que a hipótese de incidência da norma que permite a compensação aludida é o regular pagamento do salário-maternidade, o qual, no caso, não se configura, porquanto o que pede a autora é a indevida ampliação do benefício por analogia, sem autorização legislativa, para alcançar a situação prevista na Lei nº 14.151/2021, e, assim, por analogia, também obter o reconhecimento do direito à referida compensação.
Apresentadas contrarrazões pela autora (evento 27, CONTRAZAP1).
Vieram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
1. Legitimidade passiva
Alega a apelante, em preliminar, sua ilegitimidade passiva ad causam, pois é legítima, segundo defende, a autarquia previdenciária para responder à pretensão relativa ao reconhecimento da natureza do salário-maternidade.
Sem razão.
No caso dos autos, a parte autora visa à declaração do reconhecimento dos salários pagos às suas empregadas gestantes, afastadas em decorrência da Lei nº 14.151/21, como salário-maternidade, além da compensação dos valores, nos termos do artigo 72, § 1º, da Lei nº 8.213/91.
O objeto principal discutido na lide, portanto, envolve o tratamento tributário de verbas pagas pelo empregador às empregadas gestantes impossibilitadas de exercer seu trabalho na forma remota, de forma que sejam tais verbas enquadradas como salário-maternidade. A matéria já foi julgada por esta Corte:
PROCESSUAL CIVIL. CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. LEI Nº 14.151/2021. ENQUADRAMENTO DA REMUNERAÇÃO PAGA ÀS GESTANTES COMO SALÁRIO MATERNIDADE. PRETENSÃO DE DEDUÇÃO DOS VALORES PAGOS DAS CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS DEVIDAS. NATUREZA TRIBUTÁRIA. 1. A definição da competência há de levar em consideração, prioritariamente, o pedido principal. 2. Pretendendo a litigante, como pedido principal, deduzir da base de cálculo das contribuições sociais devidas sobre os valores pagos às empregadas gestantes por força da Lei n.º 14.151/2021, o qual depende do exame da possibilidade de enquadramento da remuneração a que alude a mencionada legislação como salário maternidade, tem-se como prevalente a índole tributária da causa. 3. A questão está inserida globalmente na competência tributária, já que relacionada ao pagamento de contribuições sociais previdenciárias. Precedentes da Corte Especial. (grifos) (TRF 4ºR., CC nº 5046295-26.2021.4.04.0000, CORTE ESPECIAL, Relator Des. Federal JOÃO PEDRO GEBRAN NETO, juntado aos autos em 25/02/2022)
Assim, diante do caráter tributário do pleito, resta reconhecida a legitimidade da União - Fazenda Nacional para integrar o polo passivo da demanda, e a ilegitimidade do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, cabendo a representação, nestes casos, à Procuradoria da Fazenda Nacional, nos termos do art. 2º da Lei nº 11.457/2007, que dispõe sobre a Administração Tributária Federal.
Isto porque a solução dada aos casos como o dos autos, no sentido de enquadrar os pagamentos realizados pelas empresas como salário-maternidade, não implica a efetiva implantação do referido benefício previdenciário, o que justificaria a necessidade da presença do INSS na lide, mas a possibilidade de compensação dos valores pagos pelo empregador e a redução da contribuição previdenciária patronal.
Neste sentido, esta Turma já decidiu:
"2. Ilegitimidade passiva do INSS. O INSS não tem legitimidade passiva para ações que versem sobre o recolhimento de contribuições previdenciárias, cabendo a representação, nestes casos, à Procuradoria da Fazenda Nacional, forte nos arts. 2º e 16 da Lei 11.457/2007.
Assim, correta a sentença que declara a ilegitimidade passiva da autarquia, extinguindo-se o feito em relação a ela sem resolução de mérito, nos termos do artigo 485, VI, do CPC. A solução dada, de enquadrar os pagamentos realizados pelas empresas como salário-maternidade, implica apenas em redução da contribuição previdenciária patronal, sem necessidade de implantação de benefício previdenciário que justificaria a presença do INSS na lide."
(AC nº 5000241-84.2022.4.04.7107/RS, Relator Desembargador Federal LEANDRO PAULSEN, por unanimidade, j. 19/10/2022)
E o julgado deste órgão colegiado:
TRIBUTÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. EMPREGADA GESTANTE, AFASTAMENTO COMPULSÓRIO. PANDEMIA, COVID-19. LEI 14.151/2021. RESPONSABILIDADE PELA REMUNERAÇÃO. ENQUADRAMENTO COMO SALÁRIO MATERNIDADE. POSSIBILIDADE DE COMPENSAÇÃO. NATUREZA TRIBUTÁRIA. ILEGITIMIDADE PASSIVA DO INSS. 1. A Corte Especial deste Tribunal Regional Federal da Quarta Região já identificou natureza tributária em demandas semelhantes à presente. 2. Não há legitimidade do INSS para ações que versem sobre o recolhimento de contribuições previdenciárias, situação que induz legitimidade da União, cabendo a representação, nestes casos, à Procuradoria da Fazenda Nacional, forte nos arts. 2º e 16 da Lei 11.457/2007. (grifos) (AI nº 5049782-04.2021.4.04.0000/RS, 1ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, Relator Juiz Federal MARCELO DE NARDI por unanimidade, j. 26/10/2022)
Assim, reconheço a legitimidade passiva ad causam da União Federal e a ilegitimidade passiva do Instituto Nacional do Seguro Social.
Apelo desprovido no ponto.
2. Mérito
Busca a parte autora, na presente ação, seja a União - Fazenda Nacional responsabilizada pela remuneração devida às empregadas gestantes afastadas por força das disposições contidas na Lei nº 14.151, de 12 de maio de 2021, que previa o afastamento da empregada gestante das atividades de trabalho presencial durante a emergência de saúde pública decorrente do novo coronavírus (Covid), nos seguintes termos, em sua redação original:
Art. 1º Durante a emergência de saúde pública de importância nacional decorrente do novo coronavírus, a empregada gestante deverá permanecer afastada das atividades de trabalho presencial, sem prejuízo de sua remuneração.
Parágrafo único. A empregada afastada nos termos do caput deste artigo ficará à disposição para exercer as atividades em seu domicílio, por meio de teletrabalho, trabalho remoto ou outra forma de trabalho a distância.
Com o advento da Lei nº 14.311, de 09 de março de 2022, assim ficou a redação do dispositivo:
Art. 1º Durante a emergência de saúde pública de importância nacional decorrente do coronavírus SARS-CoV-2, a empregada gestante que ainda não tenha sido totalmente imunizada contra o referido agente infeccioso, de acordo com os critérios definidos pelo Ministério da Saúde e pelo Plano Nacional de Imunizações (PNI), deverá permanecer afastada das atividades de trabalho presencial. (Redação dada pela Lei nº 14.311, de 2022)
§ 1º A empregada gestante afastada nos termos do caput deste artigo ficará à disposição do empregador para exercer as atividades em seu domicílio, por meio de teletrabalho, trabalho remoto ou outra forma de trabalho a distância, sem prejuízo de sua remuneração. (Incluído pela Lei nº 14.311, de 2022)
§ 2º Para o fim de compatibilizar as atividades desenvolvidas pela empregada gestante na forma do § 1º deste artigo, o empregador poderá, respeitadas as competências para o desempenho do trabalho e as condições pessoais da gestante para o seu exercício, alterar as funções por ela exercidas, sem prejuízo de sua remuneração integral e assegurada a retomada da função anteriormente exercida, quando retornar ao trabalho presencial. (Incluído pela Lei nº 14.311, de 2022)
§ 3º Salvo se o empregador optar por manter o exercício das suas atividades nos termos do § 1º deste artigo, a empregada gestante deverá retornar à atividade presencial nas seguintes hipóteses: (Incluído pela Lei nº 14.311, de 2022)
I - após o encerramento do estado de emergência de saúde pública de importância nacional decorrente do coronavírus SARS-CoV-2; (Incluído pela Lei nº 14.311, de 2022)
II - após sua vacinação contra o coronavírus SARS-CoV-2, a partir do dia em que o Ministério da Saúde considerar completa a imunização; (Incluído pela Lei nº 14.311, de 2022)
(...)
A controvérsia trazida ao julgamento diz com a omissão legislativa acerca da responsabilidade pelo pagamento da remuneração da gestante que, afastada das atividades presenciais em face da emergência de saúde pública de importância nacional decorrente do coronavírus SARS-CoV-2, esteja impossibilitada de exercer suas tarefas de forma remota - ponto acerca do qual a lei silenciou.
Pois bem.
O texto constitucional estabelece expressamente a proteção da maternidade pela Seguridade Social (artigo 201, inciso II, da CF/88). Sendo assim, eventuais ônus financeiros decorrentes do afastamento da gestante devem ser suportados pela coletividade, e não pelo empregador.
Ainda, o ordenamento jurídico já tratou de hipóteses semelhantes, mostrando-se legítima a utilização da analogia, no caso, porquanto é instrumento de integração normativa, nos termos do artigo 4º da LINDB (Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro): "Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito".
De outro lado, estabelece o artigo 394-A, § 3º, da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT):
Art. 394-A. Sem prejuízo de sua remuneração, nesta incluído o valor do adicional de insalubridade, a empregada deverá ser afastada de: (Redação dada pela Lei nº 13.467, de 2017)
I - atividades consideradas insalubres em grau máximo, enquanto durar a gestação; (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)
II - atividades consideradas insalubres em grau médio ou mínimo,quando apresentar atestado de saúde, emitido por médico de confiança da mulher,que recomende o afastamentodurante a gestação; (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017) (Vide ADIN 5938)
III - atividades consideradas insalubres em qualquer grau,quando apresentar atestado de saúde, emitido por médico de confiança da mulher,que recomende o afastamentodurante a lactação. (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017) (Vide ADIN 5938)
§ 1º (VETADO)
§ 2º Cabe à empresa pagar o adicional de insalubridade à gestante ou à lactante, efetivando-se a compensação, observado o disposto no art. 248 da Constituição Federal, por ocasião do recolhimento das contribuições incidentes sobre a folha de salários e demais rendimentos pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço. (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)
§ 3º Quando não for possível que a gestante ou a lactante afastada nos termos do caput deste artigo exerça suas atividades em local salubre na empresa, a hipótese será considerada como gravidez de risco e ensejará a percepção de salário-maternidade, nos termos da Lei no 8.213, de 24 de julho de 1991, durante todo o período de afastamento.
Portanto, entendo que a solução para o caso diz com o pagamento de salário-maternidade para as gestantes durante o período de afastamento.
Consequentemente, há que permitir que as respectivas remunerações sejam compensadas, na forma do artigo 72, § 1º, da Lei nº 8.213/91, in verbis:
Art. 72. O salário-maternidade para a segurada empregada ou trabalhadora avulsa consistirá numa renda mensal igual a sua remuneração integral.
§ 1º Cabe à empresa pagar o salário-maternidade devido à respectiva empregada gestante, efetivando-se a compensação, observado o disposto no art. 248 da Constituição Federal, quando do recolhimento das contribuições incidentes sobre a folha de salários e demais rendimentos pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço.
Assim, é compatível com o ordenamento jurídico o enquadramento como salário-maternidade dos valores pagos às trabalhadoras afastadas durante o período de emergência, sendo possível que as respectivas remunerações sejam compensadas, conforme o referido artigo 72, § 1º, da Lei nº 8.213/91.
Este TRF já julgou a matéria: TRF 4ª R., AI nº 5043457-13.2021.4.04.0000, 3ª T., Relatora Desembargadora Federal MARGA INGE BARTH TESSLER, juntado aos autos em 15/12/2021. E, ainda, o seguinte julgado:
TRIBUTÁRIO. CORONAVÍRUS. EMPREGADAS GESTANTES LEI 11.451/21. AFASTAMENTO. RESPONSABILIDADE PELO SALÁRIO. PROTEÇÃO DA MATERNIDADE PELA SEGURIDADE SOCIAL. ENQUADRAMENTO COMO SALÁRIO-MATERNIDADE. POSSIBILIDADE DE COMPENSAÇÃO. 1. A Lei 11.451/21 é omissa quanto à responsabilidade pelo pagamento da remuneração da gestante que, afastada de suas atividades presenciais, esteja impossibilitada de exercer suas tarefas de forma remota. 2. A ordem constitucional estabelece expressamente a proteção da maternidade pela seguridade social (art. 201, II), razão pela qual os ônus financeiros decorrentes do afastamento em questão devem ser suportados pela coletividade, e não pelo empregador. 3. É compatível com o ordenamento jurídico o enquadramento como salário-maternidade dos valores pagos às trabalhadoras afastadas durante o período de emergência, sendo possível que as respectivas remunerações sejam compensadas, forte no art. 72, § 1º, da Lei 8.213/91. (AI nº 5050375-33.2021.4.04.0000/PR, Relator Desembargador Federal LEANDRO PAULSEN, 1ª T., por maioria, julgado em 20/04/2022)
Portanto, o enquadramento como salário-maternidade dos valores pagos às colaboradoras gestantes, afastadas por força legal e pelos efeitos da pandemia da Covid-19, enquanto durar o afastamento, está em consonância com a especial proteção à maternidade conferida pela Constituição Federal, em seus artigos 7º, inciso XVIII e 201, inciso II, e com a Convenção 103 da Organização Internacional do Trabalho, devendo o custo da proteção social preconizada pela Lei nº 14.151/2021 ser suportado pela coletividade, e não pelo empregador.
Ainda que as Leis nº 14.151/2021 e nº 14.311/2022 sejam normas temporárias, isto é, criadas para que sejam aplicadas durante este excepcional período de saúde pública decorrente da pandemia da COVID-19, há que se reconhecer a omissão normativa no que se refere à hipótese em que o trabalho remoto não se mostre possível, devido às atividades desenvolvidas pela empregada.
Dessa realidade, decorre, evidentemente, prejuízo ao empregador, que paga o salário sem a devida contaprestação, de forma que possível a integração normativa mediante aplicação do artigo 394-A, § 3º, da CLT porquanto, na realidade vivenciada em função da pandemia, o local de trabalho constitui ambiente insalubre para as gestantes, sendo devido o recebimento de salário-maternidade durante todo o perído de afastamento, com a correspondente compensação prevista no artigo 72 da Lei nº 8.213/91. Nesta direção, o julgado de minha relatoria: AI nº 5039945-22.2021.4.04.0000/SC, Relatora Desembargadora Federal LUCIANE AMARAL CORRÊA MÜNCH, 1ª Turma, por maioria, j. 18 de maio de 2022.
No que se refere à compensação, a atualização monetária incide a partir do mês seguinte à data do pagamento indevido do tributo, até a sua efetiva restituição/compensação, na forma do artigo 73 da Lei nº 9.532/97.
Para os respectivos cálculos, devem ser utilizados, unicamente, os indexadores instituídos por lei para corrigir débitos e/ou créditos de natureza tributária, no caso, a taxa SELIC, instituída pelo artigo 39, § 4º, da Lei nº 9.250/95.
3. Conclusão
Em decorrência, nego provimento ao apelo e mantenho a sentença apelada, julgando procedente o pedido, na forma pleiteada, para determinar que a ré (Fazenda Nacional) observe o direito da autora de enquadrar como salário-maternidade os valores pagos às trabalhadoras gestantes afastadas por força da Lei nº 14.151/21, enquanto durar o afastamento; declarar a não incidência de contribuições destinadas à Previdência Social ou a terceiros (Sistema S), enquanto perdurar o afastamento sem contraprestação de serviço pelas empregadas gestantes; e determinar a compensação dos valores correspondentes ao salário-maternidade pagos pela empresa autora às empregadas gestantes afastadas de suas atividades presenciais, em razão da atual pandemia de Covid-19, a teor do artigo 72, § 1º, da Lei nº 8.213/91, nos termos da fundamentação.
4. Prequestionamento
O enfrentamento das questões apontadas em grau de recurso, bem como a análise da legislação aplicável, são suficientes para prequestionar junto às instâncias Superiores os dispositivos que as embasam. Deixo de aplicar os dispositivos legais tidos como aptos a obter pronunciamento jurisdicional diverso do que até aqui foi declinado. Dessa forma, evita-se a necessidade de oposição de embargos de declaração tão somente para este fim, o que evidenciaria finalidade procrastinatória do recurso, passível de cominação de multa (artigo 538 do CPC).
5. Ônus sucumbenciais
A sentença, no caso, assim decidiu no tocante:
"Condeno a parte ré ao pagamento dos honorários sucumbenciais, os quais fixo em 10% sobre o valor da causa, nos moldes do art. 85, §2º e §3º, do CPC, devidamente atualizados (IPCA-E).
Custas na forma da lei." (evento 18, SENT1)
Nesta Corte, o apelo da União foi desprovido.
Considerando-se o desprovimento do apelo da União, majoro os honorários advocatícios a que esta foi condenada em 10% do valor fixado pela sentença, na forma do artigo 85, §§ 2º e 11, do CPC.
No que se refere às custas, a União é isenta do pagamento de custas processuais no âmbito da Justiça Federal, devendo restituir, no entanto, os valores adiantados pela parte contrária a esse título, atualizados pelo IPCA-E (Lei nº 9.289/1996, artigo 4º, inciso I, e parágrafo único).
6. Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.
Documento eletrônico assinado por LUCIANE AMARAL CORRÊA MÜNCH, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004112744v31 e do código CRC ea862dc5.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): LUCIANE AMARAL CORRÊA MÜNCHData e Hora: 27/9/2023, às 17:20:25
Conferência de autenticidade emitida em 02/10/2023 00:11:30.
Documento:40004112746 Poder Judiciário TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃORua Otávio Francisco Caruso da Rocha, 300, Gab. Desembargadora Federal Luciane Amaral Corrêa Münch - 5º andar - Bairro: Praia de Belas - CEP: 90010-395 - Fone: (51)3213-3222
Apelação Cível Nº 5036113-75.2022.4.04.7200/SC
RELATORA: Desembargadora Federal LUCIANE AMARAL CORRÊA MÜNCH
APELANTE: UNIÃO - FAZENDA NACIONAL (RÉU)
APELADO: COELHO MARQUES SERVICOS LTDA (AUTOR)
EMENTA
TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. LEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM. CORONAVÍRUS. EMPREGADAS GESTANTES AFASTADAS POR FORÇA DA LEI Nº 14.151/21, ALTERADA PELA LEI Nº 14.311/22. OMISSÃO LEGISLATIVA. RESPONSABILIDADE PELO PAGAMENTO DO SALÁRIO. PROTEÇÃO DA MATERNIDADE PELA SEGURIDADE SOCIAL. ENQUADRAMENTO COMO SALÁRIO-MATERNIDADE. COMPENSAÇÃO DOS VALORES PAGOS. POSSIBILIDADE. SUCUMBÊNCIA RECURSAL.
1. O objeto principal discutido na lide envolve o tratamento tributário de verbas pagas pelo empregador às empregadas gestantes impossibilitadas de exercer seu trabalho na forma remota, de forma que sejam tais verbas enquadradas como salário-maternidade, não implicando a efetiva implantação do benefício previdenciário, o que justificaria a presença do INSS na lide. Diante do caráter tributário do pleito, é reconhecida a legitimidade da União - Fazenda Nacional para integrar o polo passivo da demanda, e a ilegitimidade passiva ad causam do INSS.
2. A Lei nº 14.151/21, alterada pela Lei nº 14.311/22, é omissa quanto à responsabilidade pelo pagamento da remuneração da gestante que, afastada de suas atividades presenciais, esteja impossibilitada de exercer suas tarefas de forma remota. De outro lado, a ordem constitucional estabelece expressamente a proteção da maternidade pela Seguridade Social (artigo 201, inciso II, da CF/88), razão pela qual os ônus financeiros decorrentes do afastamento em questão devem ser suportados pela coletividade, e não pelo empregador. Procedência do pedido.
3. É compatível com o ordenamento jurídico o enquadramento como salário-maternidade dos valores pagos às trabalhadoras afastadas durante o período de emergência, sendo possível que as respectivas remunerações sejam compensadas, na forma do artigo 72, § 1º, da Lei nº 8.213/91, atualizadas pela taxa SELIC.
4. Desprovido o apelo da União, devem ser majorados os honorários advocatícios a que esta foi condenada, na forma do artigo 85, § 11º, do CPC.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 1ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 27 de setembro de 2023.
Documento eletrônico assinado por LUCIANE AMARAL CORRÊA MÜNCH, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004112746v3 e do código CRC 5a63bfe4.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): LUCIANE AMARAL CORRÊA MÜNCHData e Hora: 27/9/2023, às 17:20:25
Conferência de autenticidade emitida em 02/10/2023 00:11:30.
Extrato de Ata Poder Judiciário Tribunal Regional Federal da 4ª RegiãoEXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 19/09/2023 A 27/09/2023
Apelação Cível Nº 5036113-75.2022.4.04.7200/SC
RELATORA: Desembargadora Federal LUCIANE AMARAL CORRÊA MÜNCH
PRESIDENTE: Desembargadora Federal LUCIANE AMARAL CORRÊA MÜNCH
PROCURADOR(A): CARMEM ELISA HESSEL
APELANTE: UNIÃO - FAZENDA NACIONAL (RÉU)
APELADO: COELHO MARQUES SERVICOS LTDA (AUTOR)
ADVOGADO(A): ANDRÉ GOLIN (OAB SC018747)
ADVOGADO(A): ALEXANDRE ROMAO SEVERINO (OAB SC031197)
ADVOGADO(A): MARCOS VINICIUS FERREIRA CORREA (OAB SC066303)
ADVOGADO(A): TATIANA SUELI DA CUNHA (OAB SC023766)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 19/09/2023, às 00:00, a 27/09/2023, às 16:00, na sequência 302, disponibilizada no DE de 08/09/2023.
Certifico que a 1ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 1ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal LUCIANE AMARAL CORRÊA MÜNCH
Votante: Desembargadora Federal LUCIANE AMARAL CORRÊA MÜNCH
Votante: Juiz Federal ALEXANDRE ROSSATO DA SILVA ÁVILA
Votante: Juiz Federal GIOVANI BIGOLIN
MARIA CECÍLIA DRESCH DA SILVEIRA
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 02/10/2023 00:11:30.