PREVIDENCIÁRIO E PROCESSO CIVIL. ILEGITIMIDADE DO MUNICÍPIO DE IRAPURU/SP. EXTINÇÃO DO REGIME PRÓPRIO DE PREVIDÊNCIA SOCIAL. SERVIDOR PÚBLICO SEGURADO DO REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. NATUREZA ESPECIAL DAS ATIVIDADES LABORADAS COMPROVADA. AGENTES BIO...
Ementa:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSO CIVIL. ILEGITIMIDADE DO MUNICÍPIO DE IRAPURU/SP. EXTINÇÃO DO REGIME PRÓPRIO DE PREVIDÊNCIA SOCIAL. SERVIDOR PÚBLICO SEGURADO DO REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. NATUREZA ESPECIAL DAS ATIVIDADES LABORADAS COMPROVADA. AGENTES BIOLÓGICOS. POSSIBILIDADE DE CONVERSÃO DO TEMPO ESPECIAL EM COMUM MEDIANTE APLICAÇÃO DO FATOR PREVISTO NA LEGISLAÇÃO. TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO, CARÊNCIA E QUALIDADE DE SEGURADO COMPROVADOS. BENEFÍCIO DEVIDO.
1. Inicialmente, verifica-se que o município de Irapuru/SP não deve figurar no polo passivo da presente demanda. No presente caso, o demandante iniciou sua atividade em 02.05.1990, para o referido ente municipal, inscrito e filiado ao Regime Geral de Previdência Social – RGPS. Posteriormente, com a instituição no município de Regime Próprio de Previdência Social – RPPS, passou a verter contribuições previdenciárias para a autarquia municipal no período de 01.05.1993 a 30.06.1999. Entretanto, sendo extinto o RPPS do município, voltou a integrar o RGPS.
2. Dessa forma, não tendo a parte autora, à época da extinção do RPPS, cumprido os requisitos necessários à concessão de qualquer benefício nele previsto, caberá ao INSS arcar com o ônus financeiro das prestações previdenciárias, uma vez se tratar de segurado do RGPS. Assim, sendo direito do demandante a contagem recíproca do tempo de contribuição exercido em atividades privadas, rural e urbana, e no serviço público, caberá aos diferentes regimes previdenciários se compensarem financeiramente (art. 94 da Lei nº 8.213/91, com redação dada pela Lei nº 9.711/98). Na hipótese dos autos, uma vez que caberá ao INSS conceder eventual benefício previdenciário ao segurado, atualmente filiado e inscrito no RGPS, não compete ao município de Irapuru/SP, cujo RPPS foi extinto, o reconhecimento de atividades especiais no intervalo de 01.05.1993 a 30.06.1999. O fato de o autor ter laborado para o mesmo município, sem interrupção, ora em RPPS já extinto, ora em RGPS, não afasta a legitimidade do INSS para reconhecimento da especialidade do labor exercido em todo o período. Dessa maneira, de rigor a extinção do processo, sem resolução do mérito, quanto ao Município de Irapuru/SP, nos termos do art, 485, VI, do CPC.
3. No tocante ao pedido realizado em face do ente municipal, arcará a parte autora com o pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) do valor da causa, nos termos do artigo 85, § 2º, do CPC, observando-se, na execução, o disposto no artigo 98, § 3º, do CPC.
4. A aposentadoria especial é devida ao segurado que tenha trabalhado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme o caso, sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física (art. 64 do Decreto nº 3.048/99). E a aposentadoria por tempo de contribuição, conforme art. 201, § 7º, da constituição Federal, com a redação dada pela EC nº 20/98, é assegurada após 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem, e 30 (trinta) anos de contribuição, se mulher. Nos dois casos, necessária, ainda, a comprovação da carência e da qualidade de segurado.
5. A legislação aplicável para caracterização da natureza especial é a vigente no período em que a atividade a ser avaliada foi efetivamente exercida, devendo, portanto, ser levada em consideração a disciplina estabelecida pelos Decretos nº 53.831/64 e nº 83.080/79, até 05.03.1997 e, após, pelos Decretos nº 2.172/97 e nº 3.049/99.
6. Os Decretos nº 53.831/64 e nº 83.080/79 vigeram de forma simultânea, não havendo revogação daquela legislação por esta, de forma que, verificando-se divergência entre as duas normas, deverá prevalecer aquela mais favorável ao segurado.
7. A atividade desenvolvida até 10.12.1997, mesmo sem a apresentação de laudo técnico, pode ser considerada especial, pois, em razão da legislação de regência a ser considerada até então, era suficiente para a caracterização da denominada atividade especial a apresentação dos informativos SB-40 e DSS-8030, exceto para o agente nocivo ruído por depender de prova técnica.
8. É de considerar prejudicial até 05.03.1997 a exposição a ruídos superiores a 80 decibéis, de 06.03.1997 a 18.11.2003, a exposição a ruídos de 90 decibéis e, a partir de então, a exposição a ruídos de 85 decibéis.
9. Efetivo exercício de atividades especiais comprovado por meio de formulários de insalubridade e laudos técnicos que atestam a exposição a agentes agressores à saúde, em níveis superiores aos permitidos em lei.
10. Em relação aos períodos de 02.05.1990 a 31.03.1999 e 01.04.1999 a 12.11.2019, observa-se que o autor esteve exposto, de forma habitual e permanente, a agentes biológicos prejudiciais à saúde, tais como vírus, bactérias e protozoários, em função de suas atividades exercidas no “setor de obras e serviços municipais/água e esgoto”, conforme PPP, razão por que devem ser reconhecidos como especiais, na forma do código 1.3.2 do Decreto nº 53.831/64, código 1.3.5 do Decreto nº 83.080/79, código 3.0.1 do Decreto nº 2.172/97 e código 3.0.1 do Decreto nº 3.048/99.
11. Destaca-se, ainda, a descrição das atividades executadas pelo autor, contidas em laudo pericial, as quais não deixam dúvidas acerca da exposição a agentes biológicos nocivos à saúde: “Nas atividades realizadas pelo Autor, incluem serviços e construção e reforma de caixas de inspeção de esgotamento sanitário ou de águas pluviais, assentamento de tubulações de rede pública de esgotamento sanitário e ramais prediais, incluindo execução de poço de visitas e manutenção em redes existentes, como substituição de tubulações e conserto de vazamentos, bem como execução de desobstrução de redes. Ainda, constatamos que o Autor labora na lagoa de tratamento de esgotos, realizando manutenções em tubulações de chegada e saída dos efluentes, para manutenção do fluxo adequado ao tratamento. Também realizava atividades no cemitério, reformas de túmulos ou ampliações do mesmo, porém, de forma eventual.” (ID 277447205 – pág. 9).
12. Somados todos os períodos comuns e especiais, estes devidamente convertidos, totaliza a parte autora 43 (quarenta e três) anos, 01 (um) mês e 05 (cinco) dias de tempo de contribuição até a data do requerimento administrativo (DER 03.02.2021), perfazendo, até 13.11.2019, da início da vigência da EC nº 103/2018, o total de 41 (quarenta e um) anos, 10 (dez) meses e 15 (quinze) dias de tempo de contribuição, observado o conjunto probatório produzido nos autos e os fundamentos jurídicos explicitados na presente decisão.
13. O benefício é devido a partir da data do requerimento administrativo (DER 03.02.2021).
14. A correção monetária deverá incidir sobre as prestações em atraso desde as respectivas competências e os juros de mora desde a citação, observada eventual prescrição quinquenal, nos termos do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, aprovado pela Resolução nº 784/2022 (que já contempla a aplicação da Selic, nos termos do artigo 3º da Emenda Constitucional nº 113/2021), do Conselho da Justiça Federal (ou aquele que estiver em vigor na fase de liquidação de sentença). Os juros de mora deverão incidir até a data da expedição do PRECATÓRIO/RPV, conforme entendimento consolidado pela colenda 3ª Seção desta Corte. Após a devida expedição, deverá ser observada a Súmula Vinculante 17.
15. Com relação aos honorários advocatícios, tratando-se de sentença ilíquida, o percentual da verba honorária deverá ser fixado somente na liquidação do julgado, na forma do disposto no art. 85, § 3º, § 4º, II, e § 11, e no art. 86, todos do CPC/2015, e incidirá sobre as parcelas vencidas até a data da decisão que reconheceu o direito ao benefício (Súmula 111 do STJ).
16. Reconhecido o direito da parte autora à aposentadoria por tempo de contribuição, a partir do requerimento administrativo (DER 03.02.2021), ante a comprovação de todos os requisitos legais.
17. Processo extinto, sem resolução do mérito, em relação ao município de Irapuru/SP. Apelação parcialmente provida. Fixados, de ofício, os consectários legais.
(TRF 3ª Região, 10ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5068386-45.2023.4.03.9999, Rel. NELSON DE FREITAS PORFIRIO JUNIOR, julgado em 13/03/2024, DJEN DATA: 18/03/2024)
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PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5068386-45.2023.4.03.9999
RELATOR: Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
APELANTE: JOSE LUCIO CORREIA
Advogado do(a) APELANTE: JOSE FRANCISCO PERRONE COSTA - SP110707-N
APELADO: MUNICIPIO DE IRAPURU, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5068386-45.2023.4.03.9999
RELATOR: Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
APELANTE: JOSE LUCIO CORREIA
Advogado do(a) APELANTE: JOSE FRANCISCO PERRONE COSTA - SP110707-N
APELADO: MUNICIPIO DE IRAPURU, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Trata-se de ação proposta por Jose Lucio Correia em face do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e do Município de Irapuru/SP, pelo qual almeja a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição.
Concedido o direito à gratuidade da justiça.
Contestações do INSS e do Município de Irapuru/SP;
Réplicas da parte autora.
Acolhida a impugnação de gratuidade da justiça, esta foi revogada.
Inconformada, a parte autora interpôs agravo de instrumento, o qual foi acolhido pela Décima Turma deste E. Tribunal, para restabelecer a gratuidade da justiça.
Laudo pericial anexado aos autos.
Sentença pela improcedência dos pedidos.
Apelação interposta pela parte autora, buscando, em sede preliminar, a nulidade da sentença, tendo em vista o cerceamento ao seu direito de produzir adequada prova pericial, necessária à comprovação do direito alegado. No mérito, pugna pelo reconhecimento da especialidade dos períodos de 02.05.1990 a 31.03.1999 e 01.04.1999 a 12.12.2019, convertendo-os em tempo comum, a fim de que lhe seja concedido o benefício de “[...] Aposentadoria por Tempo de Contribuição pela Regra de Pontos, nos termos do art. 15 da EC 103/19, a contar da Data de Entrada do Requerimento (DER), isto é, 03/02/2021, sendo que o cálculo da Renda Mensal Inicial deverá ser realizado com base no art. 15, § 4º c/c art. 26, § 2º, I, da EC 103/2019 (60% do salário-de-benefício, pela média integral, acrescido de 2% para cada ano que exceder 20 anos de contribuição) [...]” (ID 277447247 – pág. 27).
Sem contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5068386-45.2023.4.03.9999
RELATOR: Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
APELANTE: JOSE LUCIO CORREIA
Advogado do(a) APELANTE: JOSE FRANCISCO PERRONE COSTA - SP110707-N
APELADO: MUNICIPIO DE IRAPURU, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Pretende a parte autora, nascida em 27.02.1965, o reconhecimento do exercício de atividades especiais nos períodos de 02.05.1990 a 31.03.1999 e 01.04.1999 a 12.11.2019, e a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, a partir da data do requerimento administrativo (DER 03.02.2021).
Da ilegitimidade passiva do município de Irapuru/SP.
Inicialmente, verifico que o município de Irapuru/SP não deve figurar no polo passivo da presente demanda.
No presente caso, o demandante iniciou sua atividade em 02.05.1990, para o referido ente municipal, inscrito e filiado ao Regime Geral de Previdência Social – RGPS (ID 277447105 – págs. 21 e 74). Posteriormente, com a instituição no município de Regime Próprio de Previdência Social – RPPS, passou a verter contribuições previdenciárias para a autarquia municipal no período de 01.05.1993 a 30.06.1999 (ID 277447097 – págs. 37/39). Entretanto, sendo extinto o RPPS do município, voltou a integrar o RGPS.
Dessa forma, não tendo a parte autora, à época da extinção do RPPS, cumprido os requisitos necessários à concessão de qualquer benefício nele previsto, caberá ao INSS arcar com o ônus financeiro das prestações previdenciárias, uma vez se tratar de segurado do RGPS.
Acerca da extinção de RPPS, prevê o art. 10 da Lei nº 9.717/1998:
“No caso de extinção de regime próprio de previdência social, a União, o Estado, o Distrito Federal e os Municípios assumirão integralmente a responsabilidade pelo pagamento dos benefícios concedidos durante a sua vigência, bem como daqueles benefícios cujos requisitos necessários a sua concessão foram implementados anteriormente à extinção do regime próprio de previdência social.”.
Assim, sendo direito do demandante a contagem recíproca do tempo de contribuição exercido em atividades privadas, rural e urbana, e no serviço público, caberá aos diferentes regimes previdenciários se compensarem financeiramente (art. 94 da Lei nº 8.213/91, com redação dada pela Lei nº 9.711/98).
Na hipótese dos autos, uma vez que caberá ao INSS conceder eventual benefício previdenciário ao segurado, atualmente filiado e inscrito no RGPS, não compete ao município de Irapuru/SP, cujo RPPS foi extinto, o reconhecimento de atividades especiais no intervalo de 01.05.1993 a 30.06.1999.
O fato de o autor ter laborado para o mesmo município, sem interrupção, ora em RPPS já extinto, ora em RGPS, não afasta a legitimidade do INSS para reconhecimento da especialidade do labor exercido em todo o período. Nessa direção já decidiu o E TRF 4:
“PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL. RPPS TEMPORÁRIO. LEGIMITADE PASSIVA DO INSS. EXPOSIÇÃO A AGENTES BIOLÓGICOS. ATENDENTE DE ENFERMAGEM. EPI IRRELEVANTE. HONORÁRIOS. TUTELA ESPECÍFICA.
1. Há legitimidade passiva do INSS para o reconhecimento do caráter especial do trabalho exercido sob regime próprio de previdência, se houve a extinção do regime próprio com transformação do cargo público em emprego público vinculado ao regime geral, sem solução de continuidade.
2. Nos termos do IRDR (Tema 15), esta Corte fixou o entendimento de que a utilização de EPI não afasta a especialidade do labor, pois é presumida a sua ineficácia em relação aos agentes biológicos.
3. A condenação em honorários advocatícios contra a Fazenda Pública pode ser fixada dentro das margens percentuais previstas nos incisos do artigo 85, § 3º do CPC. Fixada no percentual máximo, não há que se falar em fixação de honorários de sucumbência recursal, ficando sem efeitos o parágrafo 11 do mesmo artigo.
4. Determinado o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício concedido ou revisado.
(TRF-4 - APL: 50228144420204049999, Relator: CLÁUDIA CRISTINA CRISTOFANI, Data de Julgamento: 26/04/2022, DÉCIMA TURMA)
PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO REGIONAL INTERPOSTO PELA PARTE AUTORA. PREVIDENCIÁRIO. SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL. TEMPO ESPECIAL. RPPS EXTINTO. LEGITIMIDADE PASSIVA DO INSS. MATÉRIA UNIFORMIZADA NA TRU4. INCIDENTE PROVIDO.
1. A Turma Regional de Uniformização de Jurisprudência da 4a.região firmou o entendimento de que: "é possível o reconhecimento, em face do INSS, da especialidade das atividades exercidas por servidor público municipal estatutário que era vinculado a regime próprio de previdência que não mais subsiste."(5003282- 08.2012.4.04.7205, TURMA REGIONAL DE UNIFORMIZAÇÃO DA 4ª REGIÃO, Relator DANIEL MACHADO DA ROCHA, juntado aos autos em 19/04/2017).
2. Jurisprudência que se reafirma.
3. Incidente provido.
(TRF-4 - Pedido de Uniformização de Interpretação de Lei (TRU): 50007675520174047130 RS 5000767- 55.2017.4.04.7130, Relator: SUSANA SBROGIO GALIA, Data de Julgamento: 31/05 /2019, TURMA REGIONAL DE UNIFORMIZAÇÃO DA 4ª REGIÃO)
Dessa maneira, de rigor a extinção do processo, sem resolução do mérito, quanto ao Município de Irapuru/SP, nos termos do art. 485, VI, do CPC.
Por fim, arcará a parte autora com o pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) do valor da causa, nos termos do artigo 85, § 2º, do CPC, observando-se, na execução, o disposto no artigo 98, § 3º, do CPC.
Da nulidade da sentença.
Afasto a preliminar de apelação interposta pela parte autora, uma vez que consta dos autos Perfil Profissiográfico Previdenciário PPP referente aos períodos em que a parte autora pretende ver reconhecidos como atividades especiais (ID 277447097 – págs. 40/41).
A ausência de aspectos formais constantes no PPP, quando a descrição detalhada das funções exercidas pelo segurado for congruente com a indicação dos agentes nocivos aos quais esteve exposto, não impede o reconhecimento da especialidade do trabalho, desde que no documento conste a assinatura do representante legal da empresa.
De acordo com o Anexo XVII da Instrução Normativa PRES/INSS Nº 128, de 28 de março de 2022, os representantes legais da empresa, ao subscreverem as informações constantes no PPP do segurado, responsabilizam-se nos seguintes termos:
“Declaramos, para todos os fins de direito, que as informações prestadas neste documento são verídicas e foram transcritas fielmente dos registros administrativos, das demonstrações ambientais e dos programas médicos de responsabilidade da empresa. É de nosso conhecimento que a prestação de informações falsas neste documento constitui crime de falsificação de documento público, nos termos do art. 297 do Código Penal e, também, que tais informações são de caráter privativo do trabalhador, constituindo crime, nos termos da Lei nº 9.029, de 13 de abril de 1995, práticas discriminatórias decorrentes de sua exigibilidade por outrem, bem como de sua divulgação para terceiros, ressalvado quando exigida pelos órgãos públicos competentes.” (destaquei).
Assim, as informações lançadas no PPP, acompanhada de assinatura do representante legal da empresa, presumem-se terem sido retiradas de laudo técnico de condições do trabalho produzido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho, nos termos da legislação trabalhista (art. 58, §1º da Lei nº 8.2313/91, com redação dada pela Lei nº 9.732/98).
Ademais, o C. STJ firmou jurisprudência no sentido de que a apresentação do PPP, em regra, dispensa a juntada do Laudo Técnico de Condições Ambientais de Trabalho (LTCAT), sendo suficiente para a comprovação do labor especial:
“PREVIDENCIÁRIO. COMPROVAÇÃO DE TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. RUÍDO. PERFIL PROFISSIOGRÁFICO PREVIDENCIÁRIO (PPP). APRESENTAÇÃO SIMULTÂNEA DO RESPECTIVO LAUDO TÉCNICO DE CONDIÇÕES AMBIENTAIS DE TRABALHO (LTCAT). DESNECESSIDADE QUANDO AUSENTE IDÔNEA IMPUGNAÇÃO AO CONTEÚDO DO PPP.
1. Em regra, trazido aos autos o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), dispensável se faz, para o reconhecimento e contagem do tempo de serviço especial do segurado, a juntada do respectivo Laudo Técnico de Condições Ambientais de Trabalho (LTCAT), na medida que o PPP já é elaborado com base nos dados existentes no LTCAT, ressalvando-se, entretanto, a necessidade da também apresentação desse laudo quando idoneamente impugnado o conteúdo do PPP. No mesmo sentido: Pet 10.262/RS, Rel. Ministro Sérgio Kukina, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 08/02/2017, DJe 16/02/2017
2. No caso concreto, não foi suscitada pelo órgão previdenciário nenhuma objeção específica às informações técnicas constantes do PPP anexado aos autos, não se podendo, por isso, recusar-lhe validade como meio de prova apto à comprovação da exposição do trabalhador ao agente nocivo "ruído".
3. Agravo interno a que se nega provimento.”
(AgInt no AREsp n. 434.635/SP, relator Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 27/4/2017, DJe de 9/5/2017.)
Finalmente, não poderá o segurado ser penalizado por eventuais erros na confecção do PPP, uma vez que tal responsabilidade não foi a ele atribuída legalmente, mas sim à empresa, cabendo ao Poder Público fiscalizar pelo cumprimento da legislação (art. 58, §§3 e 4º, da Lei nº 8.213/91, com redações dadas pela Lei nº 9.528/97). Nesse sentido, inclusive, já se pronunciou esta E. Décima Turma: “[...] de acordo com o artigo 58, § 1º, da Lei n. 8.213/1991, existe a presunção de veracidade das informações constantes do documento, não se afigurando proporcional ou razoável prejudicar o segurado por eventual inconsistência quanto à formalidade no preenchimento de aludido formulário, a cargo do empregador, sendo incumbência do Poder Público fiscalizar a elaboração do PPP e do respectivo laudo técnico de condições ambientais do trabalho que serviu de embasamento para a emissão do documento.” (TRF 3ª Região, 10ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5001380-81.2020.4.03.6133, Rel. Desembargador Federal LEILA PAIVA MORRISON, julgado em 25/05/2023, DJEN DATA: 30/05/2023)
Dessa maneira, considerando a suficiência de elementos para a análise do mérito da demanda, reputo superado o questionamento acerca do procedimento para a produção da prova pericial.
Do mérito.
Para elucidação da controvérsia, cumpre distinguir a aposentadoria especial, prevista no art. 57 da Lei nº 8.213/91, da aposentadoria por tempo de contribuição, prevista no art. 52 do mesmo diploma legal, pois a primeira pressupõe o exercício de atividade laboral considerada especial, pelo tempo de 15, 20 ou 25 anos, sendo que, cumprido esse requisito, o segurado tem direito à aposentadoria com valor equivalente a 100% do salário-de-benefício (§ 1º do art. 57), não estando submetido à inovação legislativa da EC 20/98, ou seja, inexiste pedágio ou exigência de idade mínima, nem submissão ao fator previdenciário, conforme art. 29, II, da Lei nº 8.213/91. Diferentemente, na aposentadoria por tempo de contribuição pode haver tanto o exercício de atividades especiais como o exercício de atividades comuns, sendo que os períodos de atividade especial sofrem conversão em atividade comum, aumentando assim o tempo de serviço do trabalhador, e, conforme a data em que o segurado preenche os requisitos, deverá se submeter às regras da EC 20/98.
Da atividade especial.
No que se refere à atividade especial, a jurisprudência pacificou-se no sentido de que a legislação aplicável para sua caracterização é a vigente no período em que a atividade a ser avaliada foi efetivamente exercida, devendo, portanto, no caso em tela, ser levada em consideração a disciplina estabelecida pelos Decretos nº 53.831/64 e nº 83.080/79, até 05.03.1997 e, após, pelo Decreto nº 2.172/97, sendo irrelevante que o segurado não tenha completado o tempo mínimo de contribuição para se aposentar à época em que foi editada a Lei nº 9.032/95, como a seguir se verifica.
O art. 58 da Lei nº 8.213/91 dispunha, em sua redação original que "(...) A relação de atividades profissionais prejudiciais à saúde ou à integridade física será objeto de lei específica (...)". Com a edição da Medida Provisória nº 1.523/96, tal dispositivo legal teve sua redação alterada, com a inclusão dos parágrafos 1º, 2º, 3º e 4º, na forma que segue:
"Art. 58. A relação dos agentes nocivos químicos, físicos e biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física considerados para fins de concessão da aposentadoria especial de que trata o artigo anterior será definida pelo Poder Executivo.
§ 1º a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos será feita mediante formulário, na forma estabelecida pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, emitido pela empresa ou seu preposto, com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho.
§ 2º Deverão constar do laudo técnico referido no parágrafo anterior informação sobre a existência de tecnologia de proteção coletiva que diminua a intensidade do agente agressivo a limites de tolerância e recomendação sobre a sua adoção pelo estabelecimento respectivo.
§ 3º A empresa que não mantiver laudo técnico atualizado com referência aos agentes nocivos existentes no ambiente de trabalho de seus trabalhadores ou que emitir documento de comprovação de efetiva exposição em desacordo com o respectivo laudo estará sujeita à penalidade prevista no art. 133 desta Lei.
§ 4º A empresa deverá elaborar e manter atualizado perfil profissiográfico abrangendo as atividades desenvolvidas pelo trabalhador, e fornecer a este, quando da rescisão do contrato de trabalho, cópia autêntica deste documento (...)".
Verifica-se, pois, que tanto na redação original do art. 58 da Lei nº 8.213/91 como na estabelecida pela Medida Provisória nº 1.523/96 (reeditada até a MP nº 1.523-13 de 23.10.97 - republicado na MP nº 1.596-14, de 10.11.97 e convertida na Lei nº 9.528, de 10.12.97), não foram relacionados os agentes prejudiciais à saúde, sendo que tal relação foi definida apenas com a edição do Decreto nº 2.172, de 05.03.1997 (art. 66 e Anexo IV). Ocorre que, em se tratando de matéria reservada à lei, tal disposição somente teve eficácia a partir da edição da Lei nº 9.528, de 10.12.1997, razão pela qual a apresentação de laudo técnico só pode ser exigida a partir dessa ultima data. Nesse sentido é o entendimento majoritário do E. STJ:
"PREVIDENCIÁRIO - RECURSO ESPECIAL - APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO - CONVERSÃO DE TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL EM COMUM - POSSIBILIDADE - LEI 8.213/91 - LEI 9.032/95 - LAUDO PERICIAL INEXIGÍVEL - LEI 9.528/97.
(...)
- A Lei nº 9.032/95 que deu nova redação ao art. 57 da Lei 8.213/91 acrescentando seu § 5º, permitiu a conversão do tempo de serviço especial em comum para efeito de aposentadoria especial. Em se tratando de atividade que expõe o obreiro a agentes agressivos, o tempo de serviço trabalhado pode ser convertido em tempo especial, para fins previdenciários.
- A necessidade de comprovação da atividade insalubre através de laudo pericial, foi exigida após o advento da Lei 9.528, de 10.12.97, que convalidando os atos praticados com base na Medida Provisória nº 1.523, de 11.10.96, alterou o § 1º, do art. 58, da Lei 8.213/91, passando a exigir a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, mediante formulário, na forma estabelecida pelo INSS, emitido pela empresa ou seu preposto, com base em laudo técnico das condições ambientais do trabalho, expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho. Tendo a mencionada lei caráter restritivo ao exercício do direito, não pode ser aplicada à situações pretéritas, portanto no caso em exame, como a atividade especial foi exercida anteriormente, ou seja, de 17.11.75 a 19.11.82, não está sujeita à restrição legal.
- Precedentes desta Corte.
- Recurso conhecido, mas desprovido" (STJ; Resp 436661/SC; 5ª Turma; Rel. Min. Jorge Scartezzini; julg. 28.04.2004; DJ 02.08.2004, pág. 482).
Assim, em tese, pode ser considerada especial a atividade desenvolvida até 10.12.1997, mesmo sem a apresentação de laudo técnico, pois, em razão da legislação de regência a ser considerada até então, era suficiente para a caracterização da denominada atividade especial a apresentação dos informativos SB-40 e DSS-8030 (exceto para o agente nocivo ruído, por depender de prova técnica).
Ressalto que os Decretos nº 53.831/64 e nº 83.080/79 vigeram de forma simultânea, não havendo revogação daquela legislação por esta, de forma que, verificando-se divergência entre as duas normas, deverá prevalecer aquela mais favorável ao segurado.
Saliento que não se encontra vedada a conversão de tempo especial em comum, exercida em período posterior a 28.05.1998, uma vez que ao ser editada a Lei nº 9.711/98, não foi mantida a redação do art. 28 da Medida Provisória nº 1.663-10, de 28.05.98, que revogava expressamente o parágrafo 5º, do art. 57, da Lei nº 8.213/91, devendo, portanto, prevalecer este último dispositivo legal, nos termos do art. 62 da Constituição da República.
Quanto ao agente nocivo ruído, o Decreto nº 2.172, de 05.03.1997, passou a considerar o nível de ruídos superior a 90 decibéis como prejudicial à saúde. Por tais razões, até ser editado o referido decreto, considerava-se a exposição a ruído superior a 80 decibéis como agente nocivo à saúde. Com o advento do Decreto nº 4.882, de 18.11.2003, houve nova redução do nível máximo de ruídos tolerável, uma vez que por tal decreto esse nível passou a ser de 85 decibéis (art. 2º, que deu nova redação aos itens 2.01, 3.01 e 4.00 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto nº 3.048/99).
Tendo em vista o dissenso jurisprudencial sobre a possibilidade de se aplicar retroativamente o disposto no Decreto nº 4.882/2003, para se considerar prejudicial, desde 05.03.1997, a exposição a ruídos de 85 decibéis, a questão foi levada ao C. Superior Tribunal de Justiça que, no julgamento do Recurso Especial 1398260/PR, em 14.05.2014, submetido ao rito do art.543-C do Código de Processo Civil (Recurso Especial Repetitivo), fixou entendimento pela impossibilidade de se aplicar de forma retroativa o Decreto nº 4.882/2003, que reduziu o patamar de ruído para 85 decibéis, na forma que segue:
"ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. DESAFETAÇÃO DO PRESENTE CASO. PREVIDENCIÁRIO. REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL. TEMPO ESPECIAL. RUÍDO. LIMITE DE 90DB NO PERÍODO DE 6.3.1997 A 18.11.2003. DECRETO 4.882/2003. LIMITE DE 85 DB. RETROAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. APLICAÇÃO DA LEI VIGENTE À ÉPOCA DA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO.
1. Considerando que o Recurso especial 1.398.260/PR apresenta fundamentos suficientes para figurar como representativo da presente controvérsia, este recurso deixa de se submeter ao rito do art.543-C do CPC e da Resolução STJ 8/2008.
2. Está pacificado no STJ o entendimento de que a lei que rege o tempo de serviço é aquela vigente no momento da prestação do labor. Nessa mesma linha: REsp 1.151.363/MG, Rel. Ministro Jorge Mussi, Terceira Seção, DJe 5.4.2011; REsp 1.310.034/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, DJe 19.12.2012, ambos julgados sob o regime do art. 543-C do CPC.
3. O limite de tolerância para configuração da especial idade do tempo de serviço para o agente ruído deve ser de 90 dB no período de 6.3.1997 a 18.11.2003, conforme Anexo IV do Decreto 2.172/1997 e Anexo IV do Decreto 3.048/1999, não sendo possível aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB (ex-LICC). Precedentes do STJ.
4. Na hipótese dos autos, a redução do tempo de serviço especial implica indeferimento do pedido de aposentadoria especial por falta de tempo de serviço.
5. Recurso especial provido" (REsp 1401619/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 14/05/2014, DJe 05/12/2014).
Dessa forma, deve-se considerar prejudicial até 05.03.1997 a exposição a nível de ruído superior a 80 decibéis, de 06.03.1997 a 18.11.2003, superior a 90 decibéis e, a partir de então, superior a 85 decibéis. Em relação ao trabalho exposto a ruídos nos exatos limites previstos regularmente para a caracterização da atividade especial, já decidiu esta E. Décima Turma:
“PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. AGRAVO INTERNO. ATIVIDADE ESPECIAL. EXPOSIÇÃO A AGENTES NOCIVOS. RUÍDO. IRRELEVANTE RUÍDO IGUAL A 80 DECIBÉIS - METODOLOGIA PREVISTA PELA FUNDACENTRO. PPP. FORMULÁRIO PADRÃO.
I - Mantido o termo da decisão agravada que reconheceu a especialidade do período de 21/01/1987 a 07/02/1994 laborado na empresa VALLOUREC TUBOS DO BRASIL S/A, em razão da exposição ao agente ruído de 80 decibéis, previsto no código 1.1.6, Decreto nº 53.831/1964.
II - Irrelevante o empregado estar exposto a ruído igual a 80 decibéis ou acima de 80 decibéis, ante a impossibilidade técnica de se verificar que aquele seria menos prejudicial do que este último.
III - Restou consignado no decisum agravado, que o PPP não traz campo específico para preenchimento da metodologia adotada para fins de aferição do ruído, motivo pelo qual a ausência de indicação de histograma ou memória de cálculo não elide as conclusões vertidas no formulário previdenciário. Nesse sentido: AC n. 0031607-94.2014.4.03.9999/SP, TRF3, Oitava Turma, Rel. Des. Fed. Luiz Stefanini, DJ 24.04.2019, DJ-e 17.06.2019.
IV - Agravo interno (art. 1.021, CPC) interposto pelo INSS improvido.”
(TRF – 3 - ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL/SP 5003408-71.2017.4.03.6183, Relator Desembargador Federal SERGIO DO NASCIMENTO, 10ª Turma, Data do Julgamento: 01/02/20222, Data da Publicação/Fonte: Intimação via sistema em 04/02/2022)
De outra parte, o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, instituído pelo art. 58, §4º, da Lei nº 8.213/91 (incluído pela Lei n. 9.528/97), é documento que retrata as características do trabalho do segurado, e traz a identificação do engenheiro ou perito responsável pela avaliação das condições de trabalho, sendo apto para comprovar o exercício de atividades em condições especiais, fazendo às vezes do laudo técnico.
E não afasta a validade de suas conclusões o fato de ter sido o PPP ou laudo elaborado posteriormente à prestação do serviço, vez que tal requisito não está previsto em lei, mormente porque a responsabilidade por sua expedição é do empregador, não podendo o empregado arcar com o ônus de eventual desídia daquele e, ademais, a evolução tecnológica tende a propiciar condições ambientais menos agressivas à saúde do obreiro do que aquelas vivenciadas à época da execução dos serviços.
No julgamento do Recurso Extraordinário em Agravo (ARE) 664335, em 04.12.2014, com repercussão geral reconhecida, o E. STF fixou duas teses para a hipótese de reconhecimento de atividade especial com uso de Equipamento de Proteção Individual, sendo que a primeira refere-se à regra geral que deverá nortear a análise de atividade especial, e a segunda refere-se ao caso concreto em discussão no recurso extraordinário em que o segurado esteve exposto a ruído, que podem ser assim sintetizadas: "i) tese 1 - regra geral: o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo a sua saúde, de modo que se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo à concessão constitucional de aposentadoria especial; e ii) tese 2 - agente nocivo ruído: na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para a aposentadoria especial, tendo em vista que no cenário atual não existe equipamento individual capaz de neutralizar os malefícios do ruído, pois que atinge não só a parte auditiva, mas também óssea e outros órgãos".
NO CASO DOS AUTOS, após decisão de primeiro grau, impugnada por recurso de apelação do autor, a controvérsia se limita à natureza dos trabalhos por ele exercidos nos períodos de 02.05.1990 a 31.03.1999 e 01.04.1999 a 12.11.2019.
Pois bem.
Em relação aos períodos controversos, observo que o autor esteve exposto, de forma habitual e permanente, a agentes biológicos prejudiciais à saúde, tais como vírus, bactérias e protozoários, em função de suas atividades exercidas no “setor de obras e serviços municipais/água e esgoto” (ID 277447097 – págs. 40/41), conforme PPP, razão por que devem ser reconhecidos como especiais, na forma do código 1.3.2 do Decreto nº 53.831/64, código 1.3.5 do Decreto nº 83.080/79, código 3.0.1 do Decreto nº 2.172/97 e código 3.0.1 do Decreto nº 3.048/99.
Destaca-se, ainda, a descrição das atividades executadas pelo autor, contidas em laudo pericial, as quais não deixam dúvidas acerca da sua exposição a agentes biológicos nocivos à saúde:
“Nas atividades realizadas pelo Autor, incluem serviços e construção e reforma de caixas de inspeção de esgotamento sanitário ou de águas pluviais, assentamento de tubulações de rede pública de esgotamento sanitário e ramais prediais, incluindo execução de poço de visitas e manutenção em redes existentes, como substituição de tubulações e conserto de vazamentos, bem como execução de desobstrução de redes. Ainda, constatamos que o Autor labora na lagoa de tratamento de esgotos, realizando manutenções em tubulações de chegada e saída dos efluentes, para manutenção do fluxo adequado ao tratamento. Também realizava atividades no cemitério, reformas de túmulos ou ampliações do mesmo, porém, de forma eventual.” (ID 277447205 – pág. 9).
Sendo assim, somados todos os períodos comuns e especiais, estes devidamente convertidos, totaliza a parte autora 43 (quarenta e três) anos, 01 (um) mês e 05 (cinco) dias de tempo de contribuição até a data do requerimento administrativo (DER 03.02.2021), perfazendo, até 13.11.2019, da início da vigência da EC nº 103/2018, o total de 41 (quarenta e um) anos, 10 (dez) meses e 15 (quinze) dias de tempo de contribuição, observado o conjunto probatório produzido nos autos e os fundamentos jurídicos explicitados na presente decisão.
Restaram cumpridos pela parte autora, ainda, os requisitos da qualidade de segurado (art. 15 e seguintes da Lei nº 8.213/91) e a carência para a concessão do benefício almejado (art. 24 e seguintes da Lei nº 8.213/91).
Destaca-se que a Medida Provisória n. 676, de 17.06.2015 (D.O.U. de 18.06.2015), convertida na Lei n. 13.183, de 04.11.2015 (D.O.U. de 05.11.2015), inseriu o artigo 29-C na Lei n. 8.213/91 e criou hipótese de opção pela não incidência do fator previdenciário, denominada "regra 85/95", quando, preenchidos os requisitos para a aposentadoria por tempo de contribuição, a soma da idade do segurado e de seu tempo de contribuição, incluídas as frações, for: a) igual ou superior a 95 (noventa e cinco pontos), se homem, observando o tempo mínimo de contribuição de trinta e cinco anos; b) igual ou superior a 85 (oitenta e cinco pontos), se mulher, observando o tempo mínimo de contribuição de trinta anos.
Desta forma, uma vez que o valor da aposentadoria por tempo de contribuição na modalidade denominada "regra 85/95" será mais vantajoso, e tendo em vista o preenchimento dos requisitos, deve esta ser implantada nos termos do artigo 29-C da Lei n. 8.213/91.
Ademais, no caso de a parte autora fazer jus a benefício previdenciário mais vantajoso, nos termos das regras de transição previstas pela EC nº 103/2019, deverá o INSS implantá-lo.
A correção monetária deverá incidir sobre as prestações em atraso desde as respectivas competências e os juros de mora desde a citação, observada eventual prescrição quinquenal, nos termos do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, aprovado pela Resolução nº 784/2022 (que já contempla a aplicação da Selic, nos termos do artigo 3º da Emenda Constitucional nº 113/2021), do Conselho da Justiça Federal (ou aquele que estiver em vigor na fase de liquidação de sentença). Os juros de mora deverão incidir até a data da expedição do PRECATÓRIO/RPV, conforme entendimento consolidado pela colenda 3ª Seção desta Corte. Após a devida expedição, deverá ser observada a Súmula Vinculante 17.
Com relação aos honorários advocatícios, a serem custeados pelo INSS, tratando-se de sentença ilíquida, o percentual da verba honorária deverá ser fixado somente na liquidação do julgado, na forma do disposto no art. 85, § 3º, § 4º, II, e § 11, e no art. 86, todos do CPC/2015, e incidirá sobre as parcelas vencidas até a data da decisão
Embora o INSS seja isento do pagamento de custas processuais, deverá reembolsar as despesas judiciais feitas pela parte vencedora e que estejam devidamente comprovadas nos autos (Lei nº 9.289/96, artigo 4º, inciso I e parágrafo único).
Caso a parte autora já esteja recebendo benefício previdenciário concedido administrativamente, deverá optar, à época da liquidação de sentença, pelo benefício que entenda ser mais vantajoso. Se a opção recair no benefício judicial, deverão ser compensadas as parcelas já recebidas em sede administrativa, face à vedação da cumulação de benefícios.
As verbas acessórias e as prestações em atraso também deverão ser calculadas na forma acima estabelecida, em fase de liquidação de sentença.
Diante do exposto, de ofício, julgo o processo extinto, sem resolução do mérito, relativamente ao município de Irapuru/SP, edou parcial provimento à apelação, para julgar parcialmente procedente o pedido do autor e condenar o INSS a conceder-lhe o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, a partir do requerimento administrativo (DER 03.02.2021), fixando, também de ofício, os consectários legais, tudo na forma acima explicitada.
Determino que, independentemente do trânsito em julgado, comunique-se ao INSS (Gerência Executiva/Unidade Administrativa), instruído com os devidos documentos da parte autora JOSE LUCIO CORREIA, a fim de serem adotadas as providências cabíveis para que seja implantado de imediato o benefício de APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO, com D.I.B. em 03.02.2021 e R.M.I. a ser calculada pelo INSS, nos termos da presente decisão, tendo em vista o art. 497 do novo Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/15).
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSO CIVIL. ILEGITIMIDADE DO MUNICÍPIO DE IRAPURU/SP. EXTINÇÃO DO REGIME PRÓPRIO DE PREVIDÊNCIA SOCIAL. SERVIDOR PÚBLICO SEGURADO DO REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. NATUREZA ESPECIAL DAS ATIVIDADES LABORADAS COMPROVADA. AGENTES BIOLÓGICOS. POSSIBILIDADE DE CONVERSÃO DO TEMPO ESPECIAL EM COMUM MEDIANTE APLICAÇÃO DO FATOR PREVISTO NA LEGISLAÇÃO. TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO, CARÊNCIA E QUALIDADE DE SEGURADO COMPROVADOS. BENEFÍCIO DEVIDO.
1. Inicialmente, verifica-se que o município de Irapuru/SP não deve figurar no polo passivo da presente demanda. No presente caso, o demandante iniciou sua atividade em 02.05.1990, para o referido ente municipal, inscrito e filiado ao Regime Geral de Previdência Social – RGPS. Posteriormente, com a instituição no município de Regime Próprio de Previdência Social – RPPS, passou a verter contribuições previdenciárias para a autarquia municipal no período de 01.05.1993 a 30.06.1999. Entretanto, sendo extinto o RPPS do município, voltou a integrar o RGPS.
2. Dessa forma, não tendo a parte autora, à época da extinção do RPPS, cumprido os requisitos necessários à concessão de qualquer benefício nele previsto, caberá ao INSS arcar com o ônus financeiro das prestações previdenciárias, uma vez se tratar de segurado do RGPS. Assim, sendo direito do demandante a contagem recíproca do tempo de contribuição exercido em atividades privadas, rural e urbana, e no serviço público, caberá aos diferentes regimes previdenciários se compensarem financeiramente (art. 94 da Lei nº 8.213/91, com redação dada pela Lei nº 9.711/98). Na hipótese dos autos, uma vez que caberá ao INSS conceder eventual benefício previdenciário ao segurado, atualmente filiado e inscrito no RGPS, não compete ao município de Irapuru/SP, cujo RPPS foi extinto, o reconhecimento de atividades especiais no intervalo de 01.05.1993 a 30.06.1999. O fato de o autor ter laborado para o mesmo município, sem interrupção, ora em RPPS já extinto, ora em RGPS, não afasta a legitimidade do INSS para reconhecimento da especialidade do labor exercido em todo o período. Dessa maneira, de rigor a extinção do processo, sem resolução do mérito, quanto ao Município de Irapuru/SP, nos termos do art, 485, VI, do CPC.
3. No tocante ao pedido realizado em face do ente municipal, arcará a parte autora com o pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) do valor da causa, nos termos do artigo 85, § 2º, do CPC, observando-se, na execução, o disposto no artigo 98, § 3º, do CPC.
4. A aposentadoria especial é devida ao segurado que tenha trabalhado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme o caso, sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física (art. 64 do Decreto nº 3.048/99). E a aposentadoria por tempo de contribuição, conforme art. 201, § 7º, da constituição Federal, com a redação dada pela EC nº 20/98, é assegurada após 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem, e 30 (trinta) anos de contribuição, se mulher. Nos dois casos, necessária, ainda, a comprovação da carência e da qualidade de segurado.
5. A legislação aplicável para caracterização da natureza especial é a vigente no período em que a atividade a ser avaliada foi efetivamente exercida, devendo, portanto, ser levada em consideração a disciplina estabelecida pelos Decretos nº 53.831/64 e nº 83.080/79, até 05.03.1997 e, após, pelos Decretos nº 2.172/97 e nº 3.049/99.
6. Os Decretos nº 53.831/64 e nº 83.080/79 vigeram de forma simultânea, não havendo revogação daquela legislação por esta, de forma que, verificando-se divergência entre as duas normas, deverá prevalecer aquela mais favorável ao segurado.
7. A atividade desenvolvida até 10.12.1997, mesmo sem a apresentação de laudo técnico, pode ser considerada especial, pois, em razão da legislação de regência a ser considerada até então, era suficiente para a caracterização da denominada atividade especial a apresentação dos informativos SB-40 e DSS-8030, exceto para o agente nocivo ruído por depender de prova técnica.
8. É de considerar prejudicial até 05.03.1997 a exposição a ruídos superiores a 80 decibéis, de 06.03.1997 a 18.11.2003, a exposição a ruídos de 90 decibéis e, a partir de então, a exposição a ruídos de 85 decibéis.
9. Efetivo exercício de atividades especiais comprovado por meio de formulários de insalubridade e laudos técnicos que atestam a exposição a agentes agressores à saúde, em níveis superiores aos permitidos em lei.
10. Em relação aos períodos de 02.05.1990 a 31.03.1999 e 01.04.1999 a 12.11.2019, observa-se que o autor esteve exposto, de forma habitual e permanente, a agentes biológicos prejudiciais à saúde, tais como vírus, bactérias e protozoários, em função de suas atividades exercidas no “setor de obras e serviços municipais/água e esgoto”, conforme PPP, razão por que devem ser reconhecidos como especiais, na forma do código 1.3.2 do Decreto nº 53.831/64, código 1.3.5 do Decreto nº 83.080/79, código 3.0.1 do Decreto nº 2.172/97 e código 3.0.1 do Decreto nº 3.048/99.
11. Destaca-se, ainda, a descrição das atividades executadas pelo autor, contidas em laudo pericial, as quais não deixam dúvidas acerca da exposição a agentes biológicos nocivos à saúde: “Nas atividades realizadas pelo Autor, incluem serviços e construção e reforma de caixas de inspeção de esgotamento sanitário ou de águas pluviais, assentamento de tubulações de rede pública de esgotamento sanitário e ramais prediais, incluindo execução de poço de visitas e manutenção em redes existentes, como substituição de tubulações e conserto de vazamentos, bem como execução de desobstrução de redes. Ainda, constatamos que o Autor labora na lagoa de tratamento de esgotos, realizando manutenções em tubulações de chegada e saída dos efluentes, para manutenção do fluxo adequado ao tratamento. Também realizava atividades no cemitério, reformas de túmulos ou ampliações do mesmo, porém, de forma eventual.” (ID 277447205 – pág. 9).
12. Somados todos os períodos comuns e especiais, estes devidamente convertidos, totaliza a parte autora 43 (quarenta e três) anos, 01 (um) mês e 05 (cinco) dias de tempo de contribuição até a data do requerimento administrativo (DER 03.02.2021), perfazendo, até 13.11.2019, da início da vigência da EC nº 103/2018, o total de 41 (quarenta e um) anos, 10 (dez) meses e 15 (quinze) dias de tempo de contribuição, observado o conjunto probatório produzido nos autos e os fundamentos jurídicos explicitados na presente decisão.
13. O benefício é devido a partir da data do requerimento administrativo (DER 03.02.2021).
14. A correção monetária deverá incidir sobre as prestações em atraso desde as respectivas competências e os juros de mora desde a citação, observada eventual prescrição quinquenal, nos termos do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, aprovado pela Resolução nº 784/2022 (que já contempla a aplicação da Selic, nos termos do artigo 3º da Emenda Constitucional nº 113/2021), do Conselho da Justiça Federal (ou aquele que estiver em vigor na fase de liquidação de sentença). Os juros de mora deverão incidir até a data da expedição do PRECATÓRIO/RPV, conforme entendimento consolidado pela colenda 3ª Seção desta Corte. Após a devida expedição, deverá ser observada a Súmula Vinculante 17.
15. Com relação aos honorários advocatícios, tratando-se de sentença ilíquida, o percentual da verba honorária deverá ser fixado somente na liquidação do julgado, na forma do disposto no art. 85, § 3º, § 4º, II, e § 11, e no art. 86, todos do CPC/2015, e incidirá sobre as parcelas vencidas até a data da decisão que reconheceu o direito ao benefício (Súmula 111 do STJ).
16. Reconhecido o direito da parte autora à aposentadoria por tempo de contribuição, a partir do requerimento administrativo (DER 03.02.2021), ante a comprovação de todos os requisitos legais.
17. Processo extinto, sem resolução do mérito, em relação ao município de Irapuru/SP. Apelação parcialmente provida. Fixados, de ofício, os consectários legais. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Turma, por unanimidade, decidiu, de ofício, extinguir o processo, sem resolução do mérito, relativamente ao município de Irapuru/SP, e dar parcial provimento à apelação, fixando, também de ofício, os consectários legais, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.