Como identificar se um trabalhador rural é segurado especial - uma análise à luz da IN 128/2022 do INSS
03 de Janeiro de 2024
Você sabia que, de acordo com o Censo Agro 2017, 15 milhões de pessoas estão ocupadas com atividades agropecuárias no Brasil?
Dentre essas pessoas, a Previdência Social concede um tratamento diferenciado apenas àquelas que se qualificam como “segurados especiais”.
Por conta disso, é de extrema importância que saibamos identificar quem são esses trabalhadores que se enquadram nessa categoria!
É este o objetivo deste artigo.
Vamos lá?
Como a IN 128/2022 define o segurado especial?
De acordo com o art. 109 da IN 128/22 do INSS, segurado especial é o produtor rural que exerce a atividade rural individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros.
Mas não é tão simples quanto parece.
Vamos esmiuçar cada um dos requisitos.
Quem é o produtor rural?
Como previsto no art. 110 da IN 128/2022 do INSS, há vários contextos que podem caracterizar o labor como sendo de produtor rural, sendo eles:
I - condômino é aquele que explora imóvel rural que é de propriedade de bem comum, ou seja, pertence a várias pessoas;
II - usufrutuário é aquele que, não sendo proprietário de imóvel rural, tem direito à posse, ao uso, à administração ou à percepção dos frutos;
III - posseiro/possuidor é aquele que exerce, sobre o imóvel rural, algum dos poderes inerentes à propriedade, utilizando e usufruindo da terra como se proprietário fosse;
IV - assentado é aquele que, como beneficiário das ações de reforma agrária, desenvolve atividades agrícolas, pastoris ou hortifrutigranjeiras nas áreas de assentamento;
V - parceiro é aquele que tem acordo de parceria com o proprietário da terra ou detentor da posse. Neste caso, há um contrato (escrito ou não) em que contratante e contratado (produtor rural) partilham lucros ou prejuízos;
VI - meeiro é o parceiro com acordo de meação, isto é, 50% dos rendimentos do trabalho ficam para o proprietário, 50% ficam para o produtor rural;
VII - comodatário é aquele que explora a terra pertencente a outra pessoa, por empréstimo gratuito;
VIII - arrendatário é aquele que aluga a terra para explorá-la economicamente;
IX - quilombola é o afrodescendente remanescente dos quilombos que integra grupos étnicos compostos de descendentes de escravos;
X - seringueiro ou extrativista vegetal é aquele que explora atividade de coleta e extração de recursos naturais renováveis, de modo sustentável, e faz dessas atividades o principal meio de vida; e
XI - foreiro é aquele que adquire direitos sobre um terreno por meio de um contrato, porém não é o proprietário.
Note que o porcenteiro, figura muito comum entre os trabalhadores rurais, não está no rol acima. Apesar disso, tanto o INSS quanto o Poder Judiciário têm admitido essa figura de trabalhador rural, incorporando-o na figura do parceiro.
Mas não basta exercer uma das atividades arroladas acima.
É preciso:
- Desempenhá-la em regime de economia familiar ou individualmente;
- Não possuir outras atividades ou outras fontes de renda a não ser aquelas expressamente admitidas; e
- Exercer atividade rural em imóvel com área de até quatro módulos fiscais (aqui, já adiantamos que este requisito foi amenizado pelo STJ, como veremos mais adiante!).
Vamos analisar cada caso.
Atividade rural em regime de economia familiar
Por disposição no art. 109, § 1º, da IN 128/2022, a atividade rural será considerada como sendo exercida em regime de economia familiar quando o trabalho do grupo familiar for de mútua dependência, ou seja, quando é necessário que todos da família exerçam alguma função indispensável à subsistência do grupo, e sem a utilização de empregados permanentes.
De acordo com a IN 128/2022, o grupo familiar pode ter como integrantes o cônjuge/companheiro e o filho solteiro com mais de 16 anos de idade e que participem ativamente das atividades rurais da família (IN 128/2022, art. 109, §1º, I). Ainda, no que tange ao grupo familiar, deixa de integrá-lo o membro que passou a ter outro grupo familiar, a partir do casamento, por exemplo (IN 128/2022, art. 109, §1º, IV). Por fim, os pais podem integrar o grupo familiar dos filhos solteiros (IN 128/2022, art. 109, §1º, V).
Na prática, todavia, notamos que o Poder Judiciário costuma considerar como grupo familiar todos aqueles que membros da família que exercem a atividade campesina em conjunto, e não apenas aqueles mencionados pela IN.
Atividade rural exercida individualmente
Trata-se dos trabalhadores rurais que exercem as atividades campesinas que foram citadas no art. 110 da IN 128/2022 já mencionado anteriormente (posseiro, parceiro, meeiro, arrendatário, etc.) mas o fazem sozinhos, sem o auxílio da família.
Neste ponto, é importante ressaltar que muitos juízes e tribunais acabam utilizando esta previsão para enquadrar o trabalhador rural boia-fria (também conhecido como volante) na categoria de segurado especial. Esse enquadramento, todavia, não é unânime. Há entendimentos de que o trabalhador boia-fria se enquadraria, na realidade, na categoria de contribuinte individual (conforme art. 90, inciso XXVI, da IN 128/2022).
Atividades e rendimentos "não rurais" permitidos aos segurados especiais
O art. 112 da IN 128/2022 relaciona diversas situações que não prejudicam a condição de segurado especial, isto é, atividades que são permitidas aos trabalhadores rurais e que não acarretam a perda da condição de segurados especiais.
Por exemplo:
- a utilização da propriedade rural para atividade turística, podendo haver a hospedagem, por no máximo cento e vinte dias ao ano;
- a concessão de parceria, meação, comodato de até 50% do imóvel rural;
- o recebimento, por algum membro do grupo familiar, de benefício de programa assistencial do governo;
- o recebimento de benefício de pensão por morte, auxílio-acidente ou auxílio-reclusão, desde que não seja superior ao salário-mínimo;
- o exercício de atividade remunerada, ainda que urbana, em período não superior a 120 (cento e vinte) dias, corridos ou intercalados, no ano civil.
Outro item que merece destaque especial é o contido no inciso VII do mesmo art. 112, que permite “a contratação de trabalhadores, por prazo determinado, à razão de, no máximo, 120 (cento e vinte) pessoas/dia dentro do ano civil”. Isso significa que o produtor rural pode fazer as seguintes contratações:
Quantidade de trabalhadores contratados | Quantidade máxima de dias de contratação num ano |
1 | 120 |
2 | 60 |
3 | 40 |
4 | 30 |
5 | 24 |
6 | 20 |
8 | 15 |
10 | 12 |
12 | 10 |
15 | 8 |
20 | 6 |
24 | 5 |
30 | 4 |
40 | 3 |
60 | 2 |
120 | 1 |
Conseguiu perceber o padrão?
A multiplicação entre o valor contido nas duas colunas não pode ultrapassar 120.
Por exemplo: se o produtor rural contratava 15 pessoas para ajudá-lo na colheita por 10 dias no ano, a quantidade máxima admitida foi ultrapassada, porque 15 x 10 = 150, que é um valor superior a 120.
Atividades e rendimentos "não rurais" proibidos aos segurados especiais
Agora, o art. 113 da IN 128/2022 relaciona atividades e situações que, se praticadas pelos trabalhadores rurais, fazem com que eles percam a condição de segurados especiais. Dentre elas, destacamos:
- Deixar de exercer o trabalho rural;
- Outorgar para terceiros, por meio de contrato de parceria, meação ou comodato, mais de 50% da área do imóvel rural onde exerce atividade rural;
- Exceder o limite de utilização de trabalhadores rurais mencionada no tópico anterior;
- Tornar-se segurado obrigatório de outro regime previdenciário;
- Exercer atividade remunerada urbana por período superior a 120 dias num ano;
- Receber benefício de pensão por morte, auxílio-acidente ou auxílio-reclusão de valor superior ao salário-mínimo.
Sendo assim, se o seu cliente é Produtor Rural e ainda não é aposentado, é importante orientá-lo a não praticar os atos relacionados no art. 113 da IN 128/2022, para não perder a condição de segurado especial.
Além disso, se o seu cliente é beneficiário de pensão por morte, auxílio-acidente ou auxílio-reclusão de valor superior ao salário-mínimo, saiba que ele não será considerado segurado especial e que, portanto, é importante que ele recolha contribuições para obter a proteção securitária da Previdência Social.
Sobre o tamanho do imóvel rural onde o produtor trabalha
De acordo com o parágrafo 2º do art. 110 da IN 128/22 do INSS, só pode ser enquadrado na condição de segurado especial o trabalhador rural cuja área total da propriedade que explora seja de até 4 módulos fiscais. Havendo mais de uma propriedade rural, a soma da área dos imóveis rurais é que deverá ser limitada ao tamanho máximo de 4 módulos fiscais.
Aqui, é importante esclarecer que módulo fiscal é uma unidade de medida em hectares que é utilizada na classificação de imóveis rurais. A medida de 1 módulo fiscal varia para cada região.
Na cidade de Maringá, PR, por exemplo, 1 módulo fiscal equivale a 14 hectares; já na cidade de Dourados, MS, 1 módulo fiscal equivale a 30 hectares!
A consulta sobre o tamanho do módulo fiscal em cada município do Brasil pode ser feita na Plataforma de Governança Territorial, disponível neste link:
https://pro-pgt-incra.estaleiro.serpro.gov.br/pgt/indices-basicos
Mas o que acontece se o produtor rural exerce atividade numa área que supera o limite de 4 módulos fiscais? De acordo com a literalidade da IN 128/2022 (art. 110, §8º), há de se fazer uma separação:
- Trabalho rural exercido até 22/06/2008: os períodos de atividade do segurado especial devem ser analisados independentemente do tamanho da propriedade. Então, mesmo que o produtor rural exerça sua atividade num imóvel com área superior a 4 módulos fiscais, isso não acarreta, automaticamente, a descaracterização da sua condição de segurado especial;
- Trabalho rural exercido a partir de 23/06/2008 (data da vigência da Lei 11.718/08): se o produtor rural trabalha numa área superior a 4 módulos fiscais, sua condição de segurado especial seria descaracterizada automaticamente, de acordo com a IN 128/2022. No entanto, sobre o assunto, no dia 24/11/2022, foi julgado o Tema 1115 do Superior Tribunal de Justiça, que definiu o seguinte posicionamento:
“O tamanho da propriedade não descaracteriza, por si só, o regime de economia familiar, caso estejam comprovados os demais requisitos legais para a concessão da aposentadoria por idade rural.”
Nessas condições, de acordo com o entendimento do STJ, se o tamanho da propriedade rural ultrapassa o limite de 4 módulos fiscais, isso não descaracteriza, por si só, o regime de economia familiar, desde que estejam comprovados os demais requisitos para a concessão da aposentadoria por idade rural.
Antes de finalizar
Por fim, é importante registrar que, no § 4º do art. 109 da IN 128/2022, está prevista uma situação bem específica que também caracteriza o segurado especial:
“Enquadra-se como segurado especial o indígena cujo(s) período(s) de exercício de atividade rural tenha(m) sido objeto de certificação pela Fundação Nacional do Índio - FUNAI, inclusive o artesão que utilize matéria-prima proveniente de extrativismo vegetal, independentemente do local onde resida ou exerça suas atividades, sendo irrelevante a definição de indígena aldeado, não-aldeado, em vias de integração, isolado ou integrado, desde que exerça a atividade rural individualmente ou em regime de economia familiar, observado os requisitos contidos nos arts. 112 e 113.”
Ressalte-se que, caso não haja a certificação mencionada no dispositivo acima, o indígena se submete aos mesmos moldes de comprovação da atividade rural dos demais segurados especiais.
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